domingo, janeiro 27, 2013

“Nos programas do FMI de 1978 e 1983 percebia-se a lógica. Eu, neste programa, não percebo a lógica”

João Ferreira do Amaral é hoje entrevistado pelo Público. Eis um extracto:
    - O que acha do debate sobre a reforma do Estado que o Governo está a querer lançar?
    - Fazer o debate, sim, é importante. Mas não desta maneira. O começar com o corte de 4000 milhões de euros foi um mau começo. Por várias razões: primeiro, porque é um corte que macroeconomicamente não faz sentido. Se tivermos um corte de 4000 milhões e ainda para mais tudo concentrado em 2014, isso significa um impacto recessivo no PIB que eu avalio em cerca 3% do PIB e provavelmente uma taxa de desemprego que vai até aos 20%. A não ser que fosse compensado com uma descida de impostos imediata, mas aparentemente não é essa a ideia. Isto cria uma dúvida total sobre se isto é exequível ou não. Depois, do ponto de vista da própria acção do Estado, não é boa política, porque, se o corte de 4000 milhões for para levar a sério, vai-se cortar de uma forma que acaba por não ter racionalidade, porque a pressão para cortar é tão grande. Teria sido preferível olhar para aqueles aspectos onde há realmente ineficiências do Estado e discutir a forma de as ultrapassar, só depois retirando as poupanças que daí adviriam.

    - Mas não será necessário para reduzir o défice?
    - Objectivos demasiado intensos na austeridade do Estado têm resultados contraproducentes. Isto é, obteríamos melhores resultados no défice e na dívida com menos austeridade. Houve duas subavaliações tecnicamente imperdoáveis na análise feita pela troika à situação do país: uma é que subavaliaram os feitos do endividamento das famílias. Em famílias muito endividadas, o efeito da austeridade amplifica-se, porque estas cortam ainda mais no consumo quando os seus rendimentos são afectados. O segundo efeito que subavaliaram foi o desemprego. Eles próprios reconheceram, mas a meu ver foi imperdoável. Sabe-se que o emprego, na sua enorme maioria, está ligado à procura interna, e a queda desta, tão drástica como foi, iria certamente ter consequências no desemprego muito graves. Ora o desemprego é gravoso para quem cai nessa situação, mas também o é para as contas do Estado. Tudo isto junto levou a uma subavaliação dos efeitos sobre as finanças públicas e a uma austeridade excessiva. É ridículo descer o défice real o que se desceu, pouco mais de um ponto percentual de 2011 para 2012, com uma austeridade tão brutal. Infelizmente, a troika continua a reincidir nos mesmos erros e a exigir este corte de 4000 milhões.

    - Por que é que acha que isso acontece?
    - A troika fez uma avaliação péssima da situação portuguesa. Eu acompanhei as intervenções do FMI em 1978 e 1983, e nessa altura, podia concordar-se ou não, mas percebia-se a lógica. Sabe-se sempre que o FMI vai além daquilo que é necessário. Por exemplo, em 1984, reequilibrámos a balança de pagamentos mais depressa do que o previsto. Mesmo em 1977, o programa era excessivo, acabou foi por não ser cumprido e ainda assim acabou por atingir os resultados. Mas percebia-se a lógica. Eu, neste programa, não percebo a lógica.

    - O que está a acontecer agora em Portugal e na Grécia, dentro de uma união monetária, também é inédito...
    - Mas nem se preocuparam. O problema é esse. A concepção que o FMI tinha da forma de equilibrar a balança de pagamentos resultou de uma doutrina que eles formaram e que funcionava. Com excessos e envolvendo questões de carácter político, mas que ia funcionando. Para os actuais programas, não há doutrina. Eles não estão habituados a fazer programas para países que não têm moeda própria e muitos dos instrumentos que estavam habituados a usar não estão a funcionar. Deviam ter criado e discutido uma doutrina sobre como intervir em países sem moeda própria. A única solução com que apareceram foi com a descida de salários, que tem limites próprios.

    - E qual o papel das autoridades europeias?
    - Sim, a culpa é principalmente delas, porque não era preciso vir o FMI. E em particular, culpo a Comissão Europeia, que se transformou no seu contrário. Sempre foi um órgão que apoiava as economias mais débeis. E por uma razão óbvia: porque dentro de um espaço de integração económica e monetária, há tendência para a periferia ficar para trás. Mas agora tudo mudou, a Comissão perdeu a sua independência, o que, aliás, é contra os tratados, passou a ser uma correia de transmissão do conselho e ainda por cima dos interesses alemães.

2 comentários :

Anónimo disse...

Podemos , então , concluir que Durão Barroso é um verbo de encher!?

Anónimo disse...

Essa não é uma conclusão mas sim uma constatação!

Durão apenas está onde está como pagamento da comissão da foto dos Açores acompanhado pelo trio das armas de destruição massiva.

Durão é hoje reconhecido como o chefe da mais incompetente Comissão Europeia de sempre!

A crise da Europa e do Euro teve origem nos EUA mas apenas atingiu estes níveis graças à incompetência da comissão.

As culpas da Merkel são outra história porque se a Comissão Europeia fosse competente ....

RS