segunda-feira, setembro 30, 2013

Pare, escute e olhe: um comboio pode esconder outro


O PS venceu as eleições autárquicas, tendo conseguido a presidência de 149 câmaras municipais, fasquia que nenhum outro partido atingiu até agora. O PSD, cuja organização assenta no caciquismo local, sofreu uma derrota avassaladora.

Apesar deste vendaval (como lhe chama hoje o Público), uma leitura mais atenta dos resultados globais sugere que se tenha alguma contenção nos festejos. Perante a violenta ofensiva da direita para destruir o Estado social e eliminar os direitos laborais, o PS não consegue superar os resultados que obteve em 2009, quando o país estava a ser varrido pela maior crise internacional dos últimos 80 anos. Veja-se:
    • Em número de votos, o PS desce em relação a 2009 (menos 270 mil), valor só parcialmente explicável pela abstenção, que tenderá a manifestar-se mais entre os eleitores da direita, desmotivados com a política do actual governo;
    • Em percentagem de votos, o PS alcança um resultado inferior para as câmaras municipais (36,25% contra 37,67% em 2009), para as assembleias municipais (34,94% contra 36,67% em 2009) e para as assembleias de freguesia (34,69% contra 36,28% em 2009);
    • Embora tenha obtido mais presidências de câmara (132 em 2009), o número de câmaras em que o PS obteve maioria absoluta é igual em 2009 e 2013 (119);
    • Quanto a mandatos, o PS atinge o mesmo número que alcançara para as câmaras em 2009 (921), mas obtém menos mandatos para as assembleias municipais (2.657 contra 2.855 em 2009).

Mas o aspecto mais relevante destas eleições é a circunstância de a enorme erosão do PSD no eleitorado urbano não ter sido cabalmente capitalizada pelo PS. As importantes vitórias obtidas em Gaia, Sintra, Coimbra e Vila Real são ofuscadas pelas perdas infligidas pelo PSD em Braga e na Guarda e pela CDU em Beja, Évora e Loures. A ideia que fica é que os êxitos conseguidos pelo PS nos concelhos rurais (ou com menos população) não tiveram correspondência nos grandes centros urbanos.

Associada a isto, há uma desilusão não negligenciável com o sistema político, de que são sinais o aumento da abstenção (de 41% para 47%), a subida dos votos brancos e nulos (de 3% para 6,8%) e, num certo sentido, a própria votação de protesto na CDU (11,06% contra 9,75% em 2009).

Neste contexto, muito embora as eleições revelem que a coligação de direita já não tem condições para governar, mostrou também que os eleitores ainda hesitam em relação à capacidade do PS para ser alternativa, em resultado de uma oposição feita com falta de fervor.

NOTA — Retirei as referências às juntas e assembleias de freguesia, uma vez que, como refere o leitor ignatz, houve uma redução de freguesias, não fazendo sentido a comparação nestes termos entre os resultados de 2009 e 2013.

22 comentários :

Anónimo disse...

"Falta de fervor" é exactamente o maior defeito de Seguro. Ontem , por exemplo, não só não foi ter com o grande vencedor da noite, António Costa, o socialista que conseguiu a maior vitória em eleições autárquicas, como, a partir do Rato, fez um discurso insípido, sem alma, sem "fervor.Um triste! Acordai!

Anónimo disse...

Partilho a mesma posição. Assino por baixo

Anónimo disse...

http://www.tsf.pt/Programas/programa.aspx?content_id=903681&audio_id=3449890

jose neves disse...

"Falta de fervor"!
Bem, ferver o homem ferve não produz é vapor que aqueça o ambiente.
Penso que não é falta de fervor mas sim falta de uma ideia definidora de uma linha clara e metê-la nos carris sem sair dela um milímetro de modo que se torne entendível quer pelo povo como pela Europa.
Uma ideia que seja um pau erecto e não uma cobra às sinusoidais.

Anónimo disse...

O que o Seguro vale vocês vão ver nas Europeias.

Eu, por exemplo, ontem votei no PS como voto protesto mas nas Europeias vou castigar novamente a direita mas também o PS do (in)Seguro.

Nem que tenha de ser branco ou nulo, mas o PS vai ter de perceber que tem de mudar...

ignatz disse...

o numero de freguesias este ano era menor, passou de 4000 para 3000, portanto não houve perda.

james disse...



Enfim, a montanha pariu uma ninhada de ratos chamados António José Seguro, João Ribeiro, Miguel Laranjeiro, Eurico Dias e Cia.

Mário Santos disse...

Não acha que faça sentido esta leitura puramente nacional dos dados. Por exemplo, em Loures, em não votei PS porque não gostei nem do presidente anterior nem da atitude do novo candidato. Tenho a certeza que hoje muita gente por esse país fora que votou não contra a direita no governo, mas a pensar na sua área de residência.

Anónimo disse...

Deve-se pensar nestes números e ter muito cuidado com a análise dos mesmos. Não há nada pior do que escamotear e enevoar a análise. Para alternativa e com um efeito mobilizador...tudo isto...sabe a pouco.

É claro que o número de camaras é importante, mas qualquer leitura nacional não deve perder de vista os números totais de votos.

Estes números devem ainda considerar a erosão do Bloco de Esquerda, tereno onde ficará mais difícil ir buscar votos.

Estes números também poderão ter uma análise incluindo o efeito Lisboa, mas também descontando o efeito Lisboa. aqui fica uma sugestão!



RFC disse...

Uma nota, apenas. Não sei se uma análise, a vol d'oiseau, sobre o todo nacional é a melhor forma de explicar o comportamento dos partidos (e esta opção do CC reconheço que é ousada).

Este é um post sobre o PS, sugiro que exista um outro *doutrinário* sobre o PSD/CDS e o pós-Pedro que me interessa comentar. Aliás, há um periodo final que precisa de condimentos...

«muito embora as eleições revelem que a coligação de direita já não tem condições para governar»

Anónimo disse...

Miguel,
Basta olhar a péssima prestação no distrito do Porto de Sr Seguro e do Sr José Luís Carneiro.
Na cidade do Porto não ganham a Camâra, Rui Moreira chegou ao terreno depois de Luis Pizarro e varre Luis Filipe Menezes, entrando com força no eleitorado PS.
Em Matosinhos temos uma derrota histórica. O protegido deles essa figura para a histórica politica portuguesa António Parada, diz que Guilherme ganha com os votos PSD!? Vejamos a contabilidade em relação 2009: PS menos 17,05%, CDU mais 4,9%, Bloco Esquerda mais 1%, PSD menos 7,8%, mas temos o CDS com 1,9% sózinho que não tinha concorrido em 2009. Abrimos a caixa de Pandora, outros candidatos ou partidos podem tomar este eleitorado e este concelho fulcral.
Perdemos a Trofa, como??? E em Gondomar salvos no ultimo minuto, quando o Major V. Loureiro não pode concorrer. Bom resultado, candidato bem preparado e que trabalhou para a vitória o Eduardo Rodrigues em Gaia!
Será que o Sr Parada e o Sr José Luis Carneiro se demitem e dão de novo a palavra aos militantes, ou eternizam o assalto ao poder no Porto com o beneplácito de António José Seguro - os resultados junto do eleitorado falam por si.

Anónimo disse...

É curioso observar como alguns blogs se transformaram no muro das lamentações das viúvas do Sócrates e agora do Costa.
O PS ganhou. A direita perdeu. É a vida.

Anónimo disse...

Claro que o "PS ganhou e a direita perdeu" e ninguém ( falo por mim , em particular) se lamenta por tal. Lamentável, e não tem nada a ver com Sócrates ou Costa, é que o PS ainda não tenha convencido uma enorme parte do eleitorado e, isso,parece ser óbvio!E ainda há muito quem pense e diga que "o Seguro é como o Passos". Por alguma razão não ouvimos essa mesma observação em relação a Costa ou outros membros do PS .Não tem a ver com 'viuvez'. Tem a ver com 'falta de homem/mulher'que nos valha .

Fernando Romano disse...

Tópicos de um cenário futuro para reflexão, num exercício de análise à moda dos nossos afamados analistas políticos. Posso...?

Obviamente, é de saudar a estrondosa vitória de António Costa, muito embora acabe por criar um grande sarilho ao PS e à oposição a este governo, cujas consequências se vão refletir nas próximas legislativas, antecipadas ou não; pior ainda se forem antecipadas para 2014, num golpe de mestria de Cavaco Silva, para apanhar o PS com as calças na mão - com uma liderança frágil, não credível aos olhos do eleitorado. Tenho para mim que PCoelho não vai a votos nas próximas legislativas; o PSD tem na calha um candidato a primeiro-ministro, Rui Rio, que, num confronto com AJSeguro , o arrasará. Alguém tem dúvidas? Com ele (RR) o PSD (um "novo PSD"...) aparecerá como o grande partido de oposição a este governo e não me custa acreditar que canalize para si a esperança de arredar do poder os bandos que estão a desgraçar a nossa pátria.

Acresce ainda o facto de, no caso de ser AJSeguro a disputar o lugar de primeiro-ministro, o PCP poder abalançar-se para um resultado acima dos 14%, roubando muitos votos ao PS. Iríamos, então, assistir a uma coligação governamental PSD/PS/CDS (a que chamarão governo de salvação nacional), liderada pelo PSD. Quero com isto dizer que o PS está com uma batata quente nas unhas - a derrota à vista, por paradoxal que possa parecer. E António Costa não deixa de ter culpas no cartório por um cenário destes devido às hesitações que teve meses atrás.. A partir do passado domingo A.Costa não é já mais o futuro líder do PS. O seu caminho é o da luta pela presidência da República. Mais ainda se C.Silva optar por eleições antecipadas. E sendo o PSD um partido de bandos, e sabendo Passos Coelho que não ganhará as próximas eleições, pode ser este mesmo a provocar eleições antecipadas em 2014.

Cavaco Silva vai fazer tudo para manietar AJSeguro e o PS, procurando uma saída airosa no seu último mandato. Tudo vai depender das movimentações no interior do PSD em torno de Rui Rio.

Tenho para mim que AJSeguro nunca irá ocupar a cadeira de S. Bento. Não foi capaz de assumir esclarecida oposição a estes bandos, que vão ter tempo de dar a volta por cima.

Um mero palpite, não mais que isso.


Manuel Estêvão disse...

O PS perdeu a Guarda mas ganhou a Covilhã, por exemplo...Há muitas maneiras de ver os números e ou olhamos para eles com rigor e exaustivamente ou corremos o risco de a ser traídos pelas nossas inclinações. O fenómeno da Madeira também é merecedor de abordagem. Que interessante se no Continente também fosse possível constituírem-se plataformas políticas idênticas à esquerda...

Anónimo disse...

Não sou socialista, mas como independente votei no PS no domingo e, pela primeira vez desde o 25 de Abril, Sines terá uma governança socialista, e ainda por cima com maioria absoluta!

Discordo do ofuscar as vitórias com a perda de capitais de distrito e a história dos concelhos rurais. Guarda (tal como Beja ou Évora), apesar de capitais de distrito não têm comparação, nem o peso, de cidades como Sintra ou Gaia e, mesmo Coimbra. Em Braga a história é outra e é um modelo de governação caciqueira que foi penalizado (tal como no Porto com a derrota de Menezes).
Quanto às freguesias não me parece que se possa fazer uma comparação. Mas poderemos especular sobre quem terá beneficiado com a "costura de freguesias"... É ir ver como eram e como ficaram!

Anónimo disse...

Com todo o respeito, fazer esta abordagem "nacional" é fazer fretes à direita. Há uma leitura nacional sim senhor, mas temos 308 combates e nesses, no domingo, o PS ganhou. Perdeu com recandidatos da CDU (Beja, Évora, etc.) e recandidatos do PSD (Guarda e Aveiro). Perdeu porque foi autista em Matosinhos e na Guarda. Braga...bem depois das partes gagas que culminaram com a estátua do Cónego Melo, estavam à espera de quê?

Ernestina Sentieiro disse...

Concordo no essencial.

Uma análise mais fina (resultados em diferentes mesas de voto e não apenas das freguesias no seu todo) há-de mostrar que faltou ao PS, com excepção de Lisboa, o voto daquelas camadas que foram convencidas da "culpa de ter trazido a troika", argumento insistente da Direita e propalado, em versão diferente, até à náusea, pelos comunistas. A estratégia da direcção de Seguro, de não defender o que de bom foi feito no governo anterior, foi - e é - suicida. Tem efeitos nefastos muito profundos. Incluo aqui o baixar de braços ante o esquecimento e - pior! - os ataques a obra notável em muitos municípios geridos por socialistas.

O que se vai dizendo com superficialidade nas televisões também confunde. Por exemplo, dá-se o maior relevo à conquista pelo PCP de Loures (mas o discurso sectário de Bernardino na noite eleitoral passou sem reparo. E se fosse de um socialista?!.) . E nunca se referiu que a CDU também perdeu câmaras - Nisa, Crato, Torres Novas - para o PS. Por que é que nunca se citou sequer o resultado da Amadora, "dormitório" de Lisboa como Loures, por exemplo. Ou de Guimarães e Barcelos, da mesma dimensão, com o triplo da polpulação de Évora, mas muitíssimo mais difíceis de governar?
Nunca se repara que o PS continua a ser o único partido que elege em todos os distritos do país, ou que o PCP é um partido de implantação regional.

O "caso" do Porto também merece outra atenção. A candidatura de Moreira foi preparada paulatinamente, desde a afronta do Governo à requalificação da cidade. Rui Rio soube mobilizar. E o CDS apoiou discretamente, possibilitando-lhe um popular, mas perigoso, discurso anti-partidos. Porém o que lhe deu a vitória foi, sem dúvida, a campanha destrambelhada de Menezes. As churrascadas de porco tiraram-lhe tantos votos como o buraco nas contas de Gaia ou as promessas delirantes de pontes, túneis, mandarim e viagens de avião para as crianças. O portuense "comum" detestou o género de vendedor de banha da cobra e quando a sondagem da Católica, em cima da hora e com estrondo, sugeriu um empate, a maioria escolheu Moreira como refúgio.
Manuel Pizarro foi prejudicado, neste cenário. Tinha um honestíssimo programa para a cidade. Fez uma campanha esforçada e competente. Era um rosto menos conhecido, mas acabou por ganhar o respeito de todos

Olimpico disse...


Concordo com o comentário de ERnestina Sentieiro, mas acrescentaria mais. Rui Rio, para ter a certeza que o "SEU CANDIDATO" ganharia, assumiu a possibilidade de ser alternativa à liderança do PSD e como natural candidato a 1º ministro. Esta intervenção, foi fatal para LUIS FILIPE MENEZES, e penalizou também o candidato do PS.

O Partido Socialista Teve efetivamente uma vitória eleitoral, mas permitiu que esta tivesse sido "abafada" pela comunicação Social e pelo PCP, que parece ter ganho o PAÍS!!!

Claro que AJS, como diz ES, tudo permitiu ao PSD para cavalgar a chamada "herança Sócrates" acordou tarde para o erro.... E para evitar o "seu fim" deitou mão de algo que pode ser perigoso para quem vier a seguir: Falando sobre os cortes das pensões, ele afirmou:
«« Pode o parlamento aprovar e o tribunal Constitucional também, mas quando nós formos governo será tudo anulado...»» Será que AJS pensa ser PRIMEIRO MINISTRO (?!)..




Anónimo disse...

Concordo com a análise feita.
E acho que o maior erro do PS será não olhar para os números com olhos de ver e ficar assim muito contentinho numa visão clubística de que quem analisar fora da linha oficial está a fazer o jogo do adversário.

PMatos disse...

Mais uma achega para o tema: http://politicaevida.blogspot.pt/2013/09/autarquicas-2013.html

baladupovo disse...

O que dá a entender é que queriam que Seguro não tivesse sido o grande vencedor destas autárquicas.