segunda-feira, novembro 04, 2013

Lixo

• Rui Tavares, O guião, é lixo [hoje no Público]:
    ‘Aconteceu uma coisa interessante na semana passada. Paulo Portas apresentou o guião da reforma do estado e as primeiras reações foram as que seriam se o documento fosse sério - de oposição ou de concordância mas, no parlamento e nas televisões, levando o documento a sério.

    E enquanto isso acontecia, centenas ou milhares de cidadãos descarregavam o documento na rede e viam aquilo que os porta-vozes e os comentadores televisivos não tinham tido oportunidade de ver, nem tempo de ler. E o que viram e leram foi isto: estávamos perante o mais indigente documento jamais produzido pelo governo português. Uma coisa mal-parida que envergonha qualquer país civilizado.

    Quem tivesse uma experiência de dar aulas ou avaliar alunos em exames orais poderia ter desconfiado. Era nítido, ao ouvir Paulo Portas apresentar o famigerado guião, que ele reunia em si todos os tiques de um aluno completamente em branco no momento do exame: contemporiza, enche chouriço, diz uma coisa indiscutível, avisa que vai entrar no assunto, contemporiza, volta ao princípio, olha para o relógio, diz que não quer maçar ninguém com exemplos, etc. Ora, o documento em si não destoou dessa impressão, parecendo também o produto de uma sessão de escrita automática numa noitada movida a café, sem preparação nem pesquisa, e sem tempo para rever o resultado.

    Nascendo a madrugada e com o professor à espera do trabalho, o jovem Paulo Portas aumenta o tamanho da letra para uma incomportável fonte 16, transformando 34 páginas coladas a cuspo em 112 "páginas úteis". O português do documento é horripilante. Há vírgulas a separar sujeito e predicado, predicado e complemento, vírgulas por todo lado, talvez meia dúzia de páginas de vírgulas. As vírgulas só não cindem ideias a meio porque, como é evidente, não há uma ideia para amostra em todo o documento. Sim, eu sei que se diz que Paulo Portas avançou com planos de um estado mínimo, neoliberal. Felizmente, ou infelizmente, nem a isso chegou. As suas ideias - as escolas independentes, qualquer coisa sobre a segurança social quando a economia crescer a dois por cento - não chegam a sê-lo: são arremedos abortados de argumentos. A bibliografia, como notou em primeiro lugar o blogue 365forte, é o insulto final (uma coisa que diz que "as fontes utilizadas neste documento são: EUROSTAT, INE, [...] OCDE, FMI, artigos de opinião, entre outras"). O guião de reforma do estado português, esta posta de pescada arrotada por uma qualquer impressora vice-primeiro-ministerial, começou desde logo por ser uma coisa que faz mal ao estado português, que o desprestigia e envergonha.’

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