- ‘De um guião para a realização de uma reforma tão decisiva quanto aquela que pretende mudar o Estado espera-se que as medidas que propõe sejam devidamente fundamentadas, explicadas, ordenadas em função da sua prioridade e calendarizadas de acordo com os objectivos a atingir em cada fase. O documento que Paulo Portas apresentou sob aquele qualificativo está longe de corresponder a um plano consistente e articulado. É mais uma oportunidade perdida.
Para um Governo que leva quase dois anos e meio de mandato, esperava-se mais. Acima de tudo, esperava-se algo melhor e mais credível. O pequeno truque de apresentar um documento com corpo e entrelinhamento invulgarmente elevados foi um tiro no pé. Se a expectativa era a de que o próprio guião fosse aproveitado para evidenciar o espírito de mudança que devia animar uma reforma do Estado, os seus autores optaram por uma velha fórmula, muito acarinhada pelos burocratas. Um documento extenso, que exceda, pelo menos, o número mágico de cem páginas, é melhor do que um texto curto, incisivo, objectivo e claro.
A ideia foi pouco menos do que infantil. Mas é reveladora. Denuncia que nem o vice-primeiro-ministro e quem o auxiliou terão acreditado na solidez do trabalho. Nada melhor, neste caso, do que fazê-lo crescer para criar a ilusão de que o produto do suposto labor de vários meses não se resumia a escassas dezenas de páginas, com o correspondente fraco peso institucional, ao nível daquele que no boxe não mereceria mais do que a categoria mini-mosca. Pior, é a circunstância de ninguém de bom senso ter sido capaz de chamar a atenção para a inutilidade da ideia e, mais importante, para a sua natureza contraproducente.’
- João Cândido da Silva, O guião mini-mosca
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