«Registo o desprezo que o temor e servilismo do Presidente infundem no seu primeiro-ministro»

«Um consultor é um tipo com alguma competência em elevado grau, sem a qual não se vislumbra razão para que alguém o queira consultar. Não é um secretário, um assessor, um burocrata subalterno. É na sua autonomia técnica, política, intelectual, que está a mais valia do consultor, talvez por isso não chamemos à nossa dedicada mulher-a-dias consultora de limpeza domiciliária. Pois foi como infelizes senhoras da limpeza que dois consultores do Presidente foram demitidos. Porquê? Por delito de opinião. O consultor do Presidente fornece-lhe opiniões e análises em regime de estrita exclusividade, ficando quanto ao mais um capado cívico. Como toda a gente parece achar a coisa bem e normal, não me alongarei sobre o assunto. Mas registo o desprezo que o temor e servilismo do Presidente infundem no seu primeiro-ministro. O primeiro-ministro vê o Presidente como uma relíquia do passado do PSD, igual a muitas outras que ele já passou coercivamente à reserva. Agoniado e com pouca paciência para Cavaco, Passos barafustou (pouco) e tal bastou para selar o destino dos dois consultores, que de imediato caíram como dois diospiros. Mas nem esse penoso e pouco edificante espectáculo do sacrifício de dois amigos e antigos colaboradores amansou o chefe de São Bento. Agora, cortesia de Passos, Cavaco vai engolir em público o diploma das transferências para a ADSE, que, dolorosa ironia, será confirmado no Parlamento pela própria maioria de direita que Cavaco criou. Passos trata o Presidente como trata tudo e todos. Mais um funcionário público aposentado que não o deixa regressar "a mercado". Não se pode sequer falar de guerra entre governo e Presidente. O Presidente, timorato, minimalista e parcimonioso no exercício dos seus poderes, é tratado como um lacaio.»

Sérgio Sousa Pinto no Facebook