Há por aí quem sustente que o debate de ontem na TVI se inclinou a favor de Seguro. Essa posição foi assumida por comentadores que, nas televisões, aparecem em regra associados à defesa das políticas do Governo. Duvido que esta suposta vantagem corresponda à realidade. Por várias razões:
É comummente aceite que António José Seguro não tem condições para voar alto. Falta-lhe tudo. E sobra-lhe insegurança. No entanto, à semelhança da canção de Madalena Iglésias, as pessoas viam-no como um «bom rapaz», «um pouco tímido até». Ontem, essa imagem estilhaçou-se. Veio ao de cima a natureza do menino que, ao ficar sem o brinquedo, não olha a meios para o destruir. Pior, recorrendo de novo a Madalena Iglésias, Seguro transmitiu aos portugueses a ideia de que, sem o brinquedo, ele «não é ninguém».
Talvez por isto, Seguro parecia estar à beira de um ataque de nervos. Quem assistia ao debate na TVI não se surpreenderia se, a qualquer momento, Seguro desatasse num pranto. Revelou, por isso, faltar-lhe também consistência psíquica. Como convidava Paulo Pedroso a colocar como mera hipótese de análise, «imaginem alguém com o perfil psicológico de Seguro a governar o país.»
Mas, como fez questão de mostrar, Seguro confirmou o retrato que dele fez António Costa: «Se pensarmos como a direita pensa, acabamos a governar como a direita governou». Sendo a posição perante a origem e as respostas à crise a pedra de toque que distingue a direita da esquerda, Seguro optou sem hesitações pelo campo da direita: omitiu a génese e a natureza da crise (primeiro, mundial e, depois, europeia) e propõe uma resposta apenas um pouco menos violenta da solução aplicada pelo Governo, dando uma vez mais razão à análise de António Costa: «A direita falhou no diagnóstico e na resposta, mas o PS tem tido dificuldade em ser visto pelos cidadãos como alternativa. Essa dificuldade resulta de se ter dado a entender que o que o distinguia do Governo era uma questão de ritmo e de dose.»
Acresce que Seguro decidiu suicidar-se em directo: «Não aumentarei a carga fiscal (…). E assumirei hoje que me demitirei se não houver outra alternativa.» Com a incerteza que varre o mundo, e com as fundadas dúvidas sobre as malabarices do Governo no plano da consolidação orçamental, ninguém no seu perfeito juízo pode ou deve ser tão peremptório. Ao sê-lo, Seguro não fica bem no retrato por duas razões:
- • Por um lado, dá aos portugueses a ideia de que abandonará o barco se o mar ficar mais revolto, expressando assim a sua congénita insegurança;
• Por outro lado, põe em relevo o estrutural desconhecimento dos dossiês sobre os quais perora, uma vez que a expressão «carga fiscal» (ou mais apropriadamente «carga tributária») é uma relação entre as receitas fiscais e o PIB, pelo que ela pode subir se, por exemplo, o PIB cair devido a uma recessão.
A questão que escapa à tropa fandanga que inunda as televisões é que estes debates estão viciados à partida: o adversário de António Costa é o Governo; o de Seguro é António Costa. Por isso, Costa fala para o país enquanto o ainda secretário-geral do PS se esgatanha para recuperar o brinquedo que sabe estar em vias de perder para sempre. Faz toda a diferença.
5 comentários :
Esta peça jornalística está muito clara, muito bem escalpelizada, e muito assertiva na análise às declarações de Costa e de Seguro.
De facto Seguro cometeu hara-kiri quando, já no final, disse que se demitiria se a "carga fiscal" aumentasse.
De resto, Seguro pouco mais disse, a não ser choramingar e mostrar que é uma pessoa de azedumes, ódios e rancores.
Nem mais, nem menos.
Concordo inteiramente com o conteúdo do post.
Lamento ser repetitivo, mas mais uma vez o língua de trapos do Henrique Monteiro e um desconhecido chamado Costa Pinto, ontem na TVI 24, cumpriram o seu papel de querem ser os carrascos de Costa o que não lograram.
Na SIC N o espetáculo não foi melhor.
Não tem nada a ver com isto mas viram hoje Pedro Santos Guerreiro no canal RT (russia today) Vejam o que eles dizem de Portugal...
Hoje,o Costa esteve brilhante enquanto que Seguro não passou do "fica-te mal". Estou mais animada. Falta Costa exigir a Sguro que explique a história dos "negócios e do poder". Espero que seja assunto para o debate na RTP.
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