segunda-feira, outubro 16, 2006

As duas faces do neocorporativismo na justiça




O corporativismo é astuto. A sua maior preocupação é defender as regalias adquiridas — e conquistar mais regalias. Para alijar responsabilidades em relação ao actual estado da justiça, acusam terceiros dos desaires.

Durante anos, o corporativismo acusou o legislador de não aprovar leis. Agora bate noutra tecla: o crime não é combatido devido à falta de meios. Por outras palavras, abundam, no Estado e no Governo, uns malandros que têm a chave da gruta de Ali Babá e não querem dar meios para se protegerem das investigações.

Os pregadores desta tese aparecem, rotativamente, pelos media a advertir os portugueses para os perigos de que estes nem se apercebem. Não há semana em que Cluny ou Cândida Almeida ou Maria José Morgado não dêem um ar da sua graça. Nos intervalos, a transmissão da mensagem fica a cargo dos porta-vozes oficiosos. Entre estes, é justo destacar Eduardo Dâmaso, que, não estando fadado para a análise política, se refugia nas histórias de polícias e ladrões, assim se tornando um especialista em direito criminal.

A falta de meios de que Dâmaso repetidamente fala leva-o a esquecer-se de que, no Ministério Público, centenas de magistrados estão numa situação de sub-rendimento em tribunais administrativos e fiscais e até em tribunais criminais de julgamento e recurso.

A conversa da falta de meios leva-o também a esquecer-se de que bastaram dois ou três gatos-pingados da administração fiscal para ser detectada a tramóia que esteve na origem da Operação Furacão — cedo estragada pela incompetência daqueles que deixaram escapar a notícia das buscas.

A conversa da falta de meios leva, ainda, Dâmaso a esquecer-se de que o dever de um magistrado ou de um polícia é o de alcançar a máxima eficiência com os meios de que dispõe, sobretudo num país de escassos recursos.

Em todo o caso, como já noutras ocasiões referi, são sempre poucos os meios para o combate ao crime, designadamente o económico. Mas, por exemplo, no caso concreto da Operação Furacão, em que, para além dos efectivos da Polícia Judiciária, estão envolvidos neste processo um procurador da República, quatro procuradores adjuntos e 20 (vinte) licenciados dos Serviços de Inspecção Tributária, há falta de meios?

PS — À falta de melhor assunto para se manter na ribalta depois de esgotado o tema da tuberculose, também o Dr. Sampaio, saído de dois mandatos consecutivos como presidente da República, queixou-se da falta de meios na investigação. Na sua observação, demonstrou logo que não sabe a diferença entre DCIAP e DIAP. O DCIAP, aquele a que se pretendia referir, só há um, o da Dr.ª Cândida Almeida e mais nenhum. “Diapes” é que há muitos, como os chapéus de Vasco Santana, e, por isso, não podem ser referidos no singular. Mas, deixando este pormenor, a pergunta que se impõe é saber como utilizou a sua magistratura de influência para dotar a justiça de mais meios.

2 comentários :

Anónimo disse...

Dr Sampaio devia deixar de dar palpites sobre a justiça e os seus meios. Porque não aproveitou os 10 anos que esteve na presidência? Ou andaria ele ocupado a ver quem constava ou não constava nos dossiers de investigação da Casa Pia? Continuará comover-se com os seus próprios discursos e deitar uma lagrimazinha no canto do olho?
Entregou tantas condecorações que estas ficaram desvalorizadas durante mais de meio século esgotando o stock.

Os recursos humanos na justiça em Portugal estão ao nível de outros países da Europa, segundo os estudos estatísticos. Recentemente pudemos ler nos jornais que a França tem menos magistrados e juízes em percentagem que Portugal e funcionam bem.

Anónimo disse...

Mais outra investigação que pomposamente foi chamada de Operação Furacão, vai dar em águas de bacalhau, ou não tivessem os suspeitos sido avisados que iam ser investigados.