sexta-feira, fevereiro 02, 2007

O delírio

O extraordinário Diogo Almeida, com uma invejável costela cómica (que pena o país não ler blogues!), vem, a exemplo do que o Juiz Pedro Soares de Albergaria já fizera, interrogar-se sobre se o pai não deveria ter voto na matéria em relação à interrupção voluntária da gravidez.

Talvez Almeida tenha a atenuante de ser jovem. Mas esse não é o caso do Juiz Albergaria, que, além do mais, passa a vida a citar o Supremo Tribunal Federal dos EUA. Recomendo a ambos que leiam o acórdão em que o Supremo Tribunal Federal conclui pela inconstitucionalidade de uma lei do Estado da Pensilvânia que obriga à consulta prévia do pai antes de se praticar uma interrupção da gravidez.

Em todo o caso, deixo ainda uma proposta ao cuidado de Pedro Soares de Albergaria (e do jovem Almeida): e que tal prever-se um aborto terapêutico para defender a saúde física ou psíquica do pai? Quer dizer, quando a gravidez da mulher prejudicasse a saúde do progenitor, esta deveria ser obrigada a interromper a gravidez. Assim é que se respeitava o princípio da igualdade!

[Publicado originalmente no Sim no Referendo]

4 comentários :

o sibilo da serpente disse...

Caro Miguel:
Eu fui um dos primeiros "idiotas" a lançar esta questão de não concordar que a decisão de abortar seja apenas da mulher. E foi o motivo que me levou a abster-me, quando tencionava votar sim. E por que me abstenho? Se o assunto é só das mulheres, então que votem elas. É uma reacção primária? Talvez. Mas também me parece primário aceitar-se que o progenitor seja pura e simplemente afastado do processo de decisão. E, como é óbvio, não estoua falar dos casos extremos das violações ou semelhantes. Refiro-me, obviamente, aos casos em que há uma relação estruturada.
abraço cr

f. disse...

caro jm coutinho ribeiro, chamo-lhe a atenção para o facto de poder, mesmo votando sim, participar nessa decisão. tudo dependendo, é claro, da relação que tem com a mulher em questão. isso não é óbvio? ou queria que a lei especificasse que uma mulher para abortar precisaria do consentimento escrito do 'pai' do embrião? como se certificaria essa paternidade? com testes de adn? que levam semanas a ficar prontos? a questão é remetida exactamente para onde deve ser: para a intimidade da relação.
além disso, chamo-lhe a atenção para o facto de estar a ver a questão apenas na perspectiva da mulher que quereria abortar contra a vontade do homem. e se for ao contrário? tem alguma ideia para o desempate? moeda ao ar?
parece-me que a biologia -- ou a divindade -- resolveu essa questão em definitivo. a meu ver mal: os homens também deviam ter o direito de engravidar.
vote lá sim, vá. não seja antipático. e sobretudo, não serja tão desconfiado.

Anónimo disse...

Questão:

Se a opinião do pai é irrelevante na decisão de terminar uma gravidez indesejada, então, por identidade de razão, o pai não terá quaisquer responsabilidades na eventualidade de a mulher desejar a criança e o pai não? Se a decisão de continuar ou terminar a gravidez é da competência exclusiva da mulher, então será da competência da mulher o sustento da criança que venha a nascer.

Todos dirão que a opinião anterior é ridícula, pois a criança é fruto dos dois e aos dois compete a responsabilidade de a educar. No entanto, a responsabilidade da gravidez apenas compete a uma das partes! Não aceito!

Quando vejo estas opiniões na maneira como as pessoas encaram a gravidez. Julgo que pensarão que as crianças nascem sozinhas ou por vontade exclusiva da mãe, sem que o pai tenha qualquer intervenção no assunto.

o sibilo da serpente disse...

cara f.
Ainda estou indeciso sobre se devo ou não responder ao seu inteligente comentário. É que para clarificar a minha posição neste assunto, teria, eventualmente, de abrir algumas cicatrizes minhas e de outras pessoas que não sei se nos lêem.
Vou pensar mais um bocadinho...