- “(...) Imaginemos que estamos em 2030 e que um historiador procura narrar os debates políticos e públicos em torno da educação na primeira década do século XXI em Portugal. O historiador encontrará um Governo que, entre 2005 e 2009, procurou introduzir mudanças estruturais no sistema educativo, algumas delas altamente impopulares junto dos profissionais do sector. Concluirá que muitas dessas reformas eram vistas como necessárias do centro-esquerda ao centro-direita, e que a titular da pasta de então era vista com simpatia por muitas personalidades que elogiavam a sua coragem política e eixos gerais do programa. Significaria isto que todos concordavam com todos as medidas? Não. Mas o mesmo historiador notará que havia consenso suficiente em torno de muitas delas: não sendo perfeitas nem agradando da mesma forma a todos, iam na direcção considerada correcta, abrindo o horizonte para outras alterações futuras (à esquerda e à direita). Ao mesmo tempo, havia a sensação de que não era, politica e historicamente, aceitável adiá-las por mais tempo, e que a maioria absoluta do Governo do Partido Socialista de então era uma ocasião essencial para estabelecer uma espécie de “pacto de regime” informal no sector da educação.
O que concluirá o historiador da posição tomada pelo jornal “Público“ ao longo de percurso? Que o seu director se resguardou num modelo teórico de sistema educativo muito diferente (mas legítimo) do actual para se colocar numa posição de fácil crítica às políticas seguidas, ignorando deliberadamente que o seu modelo não seria nunca possível de concretizar, e que o máximo que podia pretender era que algumas das medidas políticas postas em prática fizessem o seu caminho: se tivessem sucesso, então talvez então no futuro as suas ideias tivessem alguma possibilidade de ver a luz do dia. Era esta atitude, aliás, de muitos aliados fora da esfera política do Governo de então: não concordavam com todas as medidas, mas sabiam que, sem serem lançadas as bases de um modelo diferente, o sistema que idealizavam (mais descentralizado, dotado de escolas com mais autonomia, assente num maior envolvimento dos parceiros da sociedade civil, etc.) nunca poderia vir a ser desenvolvido.
Resumindo, o nosso historiador concluirá em 2030 que o director do jornal ‘Público’ cometeu o lapso de misturar “ideias (na sua óptica) correctas” com “medidas na direcção correcta” – esquecendo que não é possível chegar às primeiras sem passar pelas segundas. E notará que ele acabou por eleger como improváveis aliados aqueles que queriam que todo o sistema ficasse na mesma, preso ao ‘centralismo’, ao ‘jacobinismo’ e ao ‘estalinismo’ que tanto criticava: os sindicatos de professores. Ficando tudo na mesma, as mesmas críticas do director ao sistema teriam razão de ser nos anos seguintes (...).”
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