sábado, novembro 19, 2011

“Um texto sem dignidade e sem proveito”

• António-Pedro Vasconcelos, A quem aproveita o desmantelamento da RTP? [hoje no Público]:
    ‘‘Como se não bastasse, e desprezando a experiência do último Governo do seu partido ou o exemplo de vários países europeus (a Espanha ou a França, para não irmos mais longe), e ignorando textos que o Governo português assinou no âmbito da UE sobre Serviço Público de TV, o ministro Relvas nomeou um GT condenado à partida a produzir um texto sem dignidade e sem proveito: dez elementos, onde poucos tinham alguma relação com a matéria (…); e, simultaneamente, encomenda à administração da RTP de um plano de sustentabilidade da empresa; demissões de três membros do GT, por sinal alguns dos que melhor conheciam os dossiers.

    (…)

    De facto, como é possível sustentar que a RTP é cara e propor, ao mesmo tempo, que lhe seja retirada a publicidade e que invista mais em ficção nacional, nomeadamente em séries históricas, precisamente o que é caro numa grelha? Como se pode afirmar, com total leviandade, que a informação na RTP é controlada pelos poderes do dia, e, para lhe remediar, se propõe que seja "concentrada em noticiários curtos" e se acabe com o regulador? Como é possível ignorar que a informação dos canais públicos, e a exigência de rigor e isenção, deve ser precisamente o contraponto aos canais privados, que, esses sim (e os exemplos abundam), representam um perigo para a democracia, porque estão ao serviço de grupos de comunicação poderosos para os quais a TV é um instrumento de poder? E como se pode, ao mesmo tempo, defender a governamentalização da RTP Internacional? Como se pode sustentar, ao arrepio de toda a experiência e prática, não só europeia como mundial, uma TV pública com um canal esquizofrénico (onde caberiam programas para maiorias e minorias), quando a tendência, com o advento da TDT e de novas plataformas, é exactamente a da ramificação do serviço público por canais temáticos e serviços que a tornem útil e aliciante ao cidadão que vai ser obrigado a comprar uma ou várias boxes e, em muitos casos, a mudar de televisor? Como é possível que se ignore que o que caracteriza uma estação de TV é a grelha (com programas de informação, entretenimento, ficção e de carácter educativo) e se repita obsessivamente ao longo do texto que a TV é apenas "disponibilização de conteúdos"? Como é possível confundir a encomenda de programas a produtores independentes e aos próprios operadores privados?

    O drama desta investida do ministro Relvas contra a RTP é que veio bloquear, mais uma vez, o verdadeiro debate: como garantir a "independência do poder político e económico" do operador público, como manda a Constituição? ( …)’

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