quinta-feira, novembro 15, 2012

A Sport TV e o Dr. Relvas


• João Pedro Figueiredo, A lista de Relvas [hoje no Público]:
    ‘Da segunda lista publicada por Relvas este ano - a anterior, que deveria ter sido publicada até 31.10.2011, apareceu apenas, por seu esquecimento, em 22.03.2012 - desapareceram, sem deixar rasto, os jogos da I Liga (um jogo por jornada envolvendo uma das três equipas mais bem classificadas nas cinco últimas épocas), os jogos das equipas portuguesas na Liga dos Campeões (um por jornada) e na Liga Europa (um por jornada a partir dos quartos-de-final). Assim, para a época de 2012/2013, o futebol de clubes deixou de ser considerado matéria de largo interesse para a sociedade...

    Perante um pedido de esclarecimento parlamentar, o ministro apressou-se, e com a resposta na ponta da língua, a "esclarecer" as razões para a quase total eliminação do futebol daquela lista: a decisão foi tomada "com o único objetivo de beneficiar o interesse dos contribuintes"! E isto porque a RTP gastou, entre 2004 e 2010, mais de 109 milhões de euros em futebol. Crendo nos números, tal como veiculados pelo PÚBLICO na edição de 11.11, 36,6 milhões de euros terão sido gastos em jogos da 1.ª Liga, 35,5 milhões das seleções, 5,7 milhões da Taça de Portugal, 1,6 milhões da Taça da Liga e 28,6 milhões da Liga dos Campeões. O que não disse, naturalmente, é quanto a RTP encaixou em publicidade e, já agora, em notoriedade com as transmissões referidas. Nem quanto (não) gastou, já em 2011 e 2012, com o futebol...

    Terça-feira, no Parlamento, Relvas voltou a dizer: "O que considerei de relevante interesse público[sic] é a passagem em canal aberto público dos jogos da seleção nacional [de futebol] e mesmo assim é um investimento muito significativo". E acrescentou que "quem no passado assinou despachos de interesse de serviço público" (sic) "o fez com a atitude de saber que não o ia cumprir" (!), porque (!!!) "quem passou os jogos da 1.ª liga foi uma televisão privada, que foi a TVI. E pode voltar a fazê-lo. Qualquer das televisões não está impedida de fazê-lo".

    Só que, para infortúnio do bom aluno e como resulta do que aqui se começou por dizer, o dinheiro gasto pela RTP em futebol e o serviço público de televisão não têm rigorosamente nada a ver com a lista de acontecimentos de interesse generalizado do público em questão! A RTP, como a SIC e a TVI, potenciais destinatários da lista, nunca foi obrigada a comprar os direitos de transmissão dos jogos nela previstos. A lista impedia sim que as Sport TV deste mundo se arrogassem o direito de exigir fortunas pelos jogos de futebol que suscitam maior interesse na sociedade, permitindo às televisões em aberto disponibilizá-los a toda a população, e não fazê-los privilégio da Sport TV e de quem tem dinheiro para a subscrever. E agora, diga-se também que à revelia do parecer emitido pela ERC, Relvas passou a impedir que a lista o impedisse: eliminados os jogos de futebol da lista, a Sport TV pedirá o que quiser aos operadores em aberto que, ao contrário do que o ministro aventou, dificilmente cobrirão um preço que, mesmo com o mecanismo de proteção da lista, este ano não puderam ou não quiseram cobrir.

    É absolutamente extraordinário que o ministro desconheça que a lista por si assinada não é nem uma lista de interesse público nem se confunde com um serviço público já definido em local próprio e que, pelas razões por si mesmo invocadas, não impede sequer a RTP de passar futebol nas suas emissões! É que, não obstante a definição dos montantes a atribuir ao serviço público competir ao Estado - num quadro plurianual que não aprovou, apesar de exigido por lei -, Relvas continua a esquecer que a RTP tem autonomia de gestão e editorial, não lhe competindo a ele determinar se a RTP deve ou não passar futebol e, ainda por cima, que jogos pode ou não transmitir...

    Esclarecido o mistério e identificado o verdadeiro beneficiário da medida, a Sport TV, claro, resta perguntar ao ministro paladino do contribuinte o que vai efetivamente fazer, em época de aprovação do Orçamento do Estado, em prol do seu protegido. Ou se a sua benemerência fiscal ficou estrabicamente esgotada na lista que aprovou.’

2 comentários :

Luís Lavoura disse...

Isto é um perfeito disparate.
O futebol é um espetáculo (como as touradas, os concertos da Mariza, ou o circo). Quem quer assistir a um espetáculo, pode e deve pagar por isso. Não há qualquer obrigação de qualquer televisão transmitir qualquer espetáculo em sinal aberto. O facto de um espetáculo ser muito popular de forma nenhuma cria tal obrigação.
As pessoas que querem ver jogos de futebol podem perfeitamente fazer como eu: deslocam-se a um café ou restaurante que tenha Sport TV e, pelo preço de uma bebida qualquer, vêem.

Anónimo disse...

Disparate é privar a RTP das receitas de publicidade que os jogos descartados lhe dariam.
No meio de tanta crise, a publicidade entre jogos ainda é das que paga melhor.Tenho dúvidas de que a medida tomada não se torne em prejuizo, em vez da tão almejada poupança.
Mas lá está, quem corta a direito não quer saber de vantagens versus custos, apenas quer um encaixe temporario para tapar os buracos que vai abrindo enquanto a corre numa fuga para a frente...