• Alberto Arons de Carvalho, A RTP de cenário em cenário... [ontem no Público]:
- '(...) o único objectivo, diria mesmo obsessão, do ministro Relvas reside no negócio com um ou mais parceiros privados. Depois das várias hipóteses de privatização ou de concessão da empresa ou de um canal, depois da (obviamente incumprida...) promessa de que a RTP1 não teria qualquer publicidade comercial, a mais recente ideia do ministro consistiria na privatização de 49% do capital social da RTP.
Essa privatização constituiria um gravíssimo erro.
Em primeiro lugar, porque os principais objectivos do serviço público - atingir todos os públicos, privilegiar a qualidade dos conteúdos, assegurar a diversidade da programação - não são compatíveis com as ambições de um empresário privado - aliciar os anunciantes, atingir em exclusivo o grande público, maximizar os lucros.
Em segundo lugar, porque, no actual quadro dos media, crescentemente ocupado por multinacionais e players das telecomunicações, a única forma de garantir um operador vinculado à defesa da identidade, dos valores e da soberania nacionais, assim como da coesão social, consiste em assegurar que ele se mantenha, com capitais exclusivamente públicos, sob a alçada do Estado.
Em terceiro lugar, porque não existe (nem na Grécia, na Irlanda ou em Espanha!) qualquer outro exemplo de privatização total ou parcial de um operador de serviço público, depois da criticada e insólita experiência da privatização da TF1, um dos três canais do serviço público francês de televisão, em 1987. Em todos os países europeus, excepto no Luxemburgo, que todavia recebe as emissões dos vários países vizinhos, existe um influente operador de rádio e de televisão de capitais públicos e com uma grande diversidade de canais e serviços.
Em quarto lugar, porque esse papel nuclear dos operadores públicos em todos os países europeus decorre de um conjunto de cerca de 25 documentos, emanados nas últimas três décadas de diversas instâncias europeias (União Europeia, Conselho da Europa, Parlamento Europeu), que espelham um vasto consenso entre as várias famílias políticas do Velho Continente, a que apenas este PSD pretende furtar-se.
Em quinto lugar, porque a privatização de 49% implicaria que os portugueses, ao pagarem a contribuição para o audiovisual, que constitui a principal forma de financiamento da RTP, estariam não apenas a financiar o serviço público como os lucros desse parceiro privado. À custa da qualidade do serviço público...
Em sexto lugar, porque não é possível impedir, no quadro de uma empresa de capitais mistos, uma irreprimível tendência para privilegiar a rentabilidade em detrimento da qualidade e da diversidade da programação. A adopção de um pormenorizado caderno de encargos nunca impediria esse resultado. E representaria uma inaceitável intromissão dos governos na definição da programação.'
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