sexta-feira, maio 17, 2013

O biombo

• Pedro Silva Pereira, O biombo:
    ‘Paulo Portas traçou uma fronteira e disse que nunca a iria passar. Depois, já se sabe, passou-se. A encenação populista, pensada para ser drama, acabou em farsa. Mas está ainda por derrubar o biombo que Portas construiu para esconder tudo aquilo que aprovou.

    O homem, reconheça-se, é um artista português: deu o dito por não dito quanto a todas as bandeiras do CDS mas pretendia agora reerguê-las como se não se tivesse passado nada. Em dois anos de Governo, o "partido dos contribuintes" dedicou-se com afinco à tarefa de aumentar todos os impostos para lá do previsto no Memorando inicial da ‘troika': da sobretaxa extraordinária no IRS (que levou metade do subsídio de Natal de 2011) à taxa máxima do IVA na energia e na restauração, tudo teve a assinatura do CDS. Sabendo-se em falta, Portas ainda ensaiou um regresso à causa dos "contribuintes" numa carta aos militantes do seu partido em que deixou um aviso tão solene que parecia a sério: "o nível de impostos já atingiu o seu limite", escreveu ele. Falso alarme: pouco depois, no Orçamento para 2013, o CDS contribuía com os seus votos para acrescentar à carga fiscal um "enorme aumento de impostos" (incluindo um aumento do IRS em 30%).

    Os pensionistas também têm contas a ajustar com o CDS: a assinatura do "partido dos pensionistas" ficou inscrita na Contribuição Extraordinária de Solidariedade e no corte das pensões acima dos 600 euros, que implicou para muitos reformados a perda do 13º e do 14º mês. A coisa chegou a tal ponto que o Tribunal Constitucional teve de intervir. Por duas vezes. E vem aí mais do mesmo.

    Apesar da barafunda instalada na comunicação política do Governo, sabe-se agora o que o CDS, o PSD e o ministro não eleito Vítor Gaspar andaram a preparar naqueles longos Conselhos de Ministros: mais um violento pacote de austeridade (da ordem dos 4800 milhões de euros até 2015) em que os alvos preferenciais são, de novo, os funcionários públicos e os pensionistas.

    Apanhado novamente em rota de colisão com as suas promessas, Portas percebeu que o momento requeria um número especial de ilusionismo e lembrou-se do "truque" mais velho que há em política: o biombo. E se bem o pensou, melhor o fez: num vasto pacote de medidas, de 4800 milhões de euros, centrou as atenções numa só medida, de apenas 436 milhões; deu-lhe uma designação mediática e odiosa ("a TSU dos pensionistas") e fez fogo sobre ela, sem dó nem piedade, encenando um desafio público ao Primeiro-Ministro, ao Ministro das Finanças e à própria estabilidade política. Tudo, é claro, em nome dos pensionistas e de uma outra promessa feita aos militantes: "não deixarei o CDS sem identidade".

    O episódio seguinte é bem conhecido e não acabou bem: Portas tornou a dar o dito por não dito e aceitou que a tenebrosa "TSU dos pensionistas" figurasse no "menú" do Governo como "medida de último recurso". A fronteira imaginada por Portas revelou-se isso mesmo: imaginária. Mas não deixou por isso de permanecer no centro das atenções e de desempenhar, do ponto de vista político, a sua prestimosa função de biombo.

    A verdade é que no "menú" adoptado pelo Governo (é assim que o primeiro-ministro lhe chama) constam outras medidas bem mais violentas, como é o caso do corte retroactivo das actuais pensões da Caixa Geral de Aposentações (a pretexto da alegada convergência entre o regime da CGA e o regime geral da Segurança Social). Só com essa medida, que não é transitória, o Governo pretende retirar aos reformados 740 milhões de euros já no próximo ano - quase o dobro do previsto com a famigerada "TSU dos pensionistas".

    E que não haja equívocos: o corte retroactivo das pensões não afecta só os actuais pensionistas da função pública. Atinge todos: pensionistas do sector público e do sector privado, actuais e futuros. Por uma razão simples: qualquer corte retroactivo ataca o princípio basilar de todos os sistemas de pensões - o princípio da confiança. Ao quebrar esse princípio, o que o Estado está a dizer aos cidadãos é isto: os descontos são obrigatórios, as pensões logo se vê. É esta alta traição aos pensionistas que Paulo Portas quer esconder atrás do seu biombo.’

7 comentários :

Bandarra disse...



Muito bem, mas este esclarecimento não pode ficar apenas por artigos de jornal, tem de passar para os grandes títulos.

Ainda hoje de manhã fui surpreendido por mais uma investida do "biombo" na TSF e, confesso, da maneira como o "prato" vem servido - nem sei se por culpa dos Jornalistas ou não -, fiquei convencido de que o ouvinte comum fica empático com o Portas e ACARDITA piamente que é ele e só ele a última barreira política contra a obstinação do Gaspar.


Claro que muito ajuda a isto o facto de, logo a seguir à voz do Portas, aparecer o Paulo Baldaia em "comentário" a confirmar que sim, senhora, isto está tudo acertadíssimo dentro do "guverno", o teatro é "para alemão ver" e está mais do que visto que se a TSU dos reformados avançar o "guverno" cai!


O pobre Göbbels rói-se de inveja na tumba, perante esta eficácia...


Repito: sem um Jornalismo sério e informado em Portugal, NÃO ADIANTA ANDAR A PEDIR NOVAS ELEIÇÕES!!


E caminhamos para o acumular de tensões na Sociedade, que um dia só se libertarão de uma forma violenta e com consequências imprevisíveis!


Acordem, socialistas e centristas de Portugal.

Manuel António Dimas disse...

Mais um excelente artigo!

Fernando Romano disse...

O "Paulinho das feiras", um composto de alternativas...

Anónimo disse...

O Baldaia da TSF é mais um dos "novos avençados"....







































Leitor assíduo disse...

Haja alguém que nos abra os olhos perante estas farsas sem fim.

Anónimo disse...

Quando o povo der por isto, eles fogem para Badajoz. Fogem mesmo !!!!

Anónimo disse...

E ainda há quem se admire por ter o PS estado no governo 17 anos nos ultimos 20...não há quem aguente a direita no poder mais de dois anos seguidos!