sábado, maio 04, 2013

"Se insistirmos em apagar a memória, estamos a plagiar o orangotango"

• Pedro Adão e Silva, Um problema de memória [hoje no Expresso]:
    ‘(…) este Governo, com a sua agenda de ruturas radicais, é um paradigma vanguardista desta vontade indómita de deitar o passado para o caixote do lixo. Um indicador avançado desta vocação é, sintomaticamente, o próprio portal do Governo.

    O que deveria ser um sítio onde constaria a informação disponibilizada ao longo dos tempos pelos vários Governos passou a ser uma galeria de fotos de ministros (disponíveis para download, não vá algum funcionário mais zeloso querer ter o ministro como wallpaper) e comunicados de imprensa. No fundo, a única coisa sobre a qual o Governo acha que tem de apresentar contas é a agenda mediática. No passado, ainda que com bastantes insuficiências, podíamos encontrar online documentos que enquadravam decisões, relatórios com avaliações e as próprias apresentações dos membros do Governo. Hoje, não só não há praticamente nenhuma informação relevante disponível como aquela que existia foi apagada.

    Para dar dois exemplos de busca de informação que fiz recentemente, era possível aceder às várias apresentações públicas dos PEC e deixou de o ser — o que impossibilita a comparação entre as intervenções de Teixeira dos Santos e Vítor Gaspar, do mesmo modo que, enquanto foi extinto o programa Novas Oportunidades, deixámos de conhecer as avaliações da iniciativa.

    Os exemplos em que o histórico dos sites foi apagado são infindáveis, no que está longe de ser uma questão marginal. Conhecermos as decisões é um elemento fundamental de transparência em relação ao passado mas também em relação ao presente.

    Este apagão no site do Governo sugere, ainda, um outro problema, não menos irrelevante: uma confusão entre o que é Estado e Governo. Uma coisa é o conjunto de decisões, necessariamente transitórias, do Governo, outra, bem diferente, é a autonomia do Estado e da administração pública, que deve ser preservada e cuja existência vai para lá dos ministros de cada momento. Curiosamente, este Executivo, que se apresentou como liberal, tem ido bem longe nesta confusão. Um exemplo caricato disto são as novas receitas médicas, nas quais o logotipo do Ministério da Saúde, presente desde há muito, foi substituído pela marca "Governo de Portugal".

    Já aqui escrevi, citando Ortega y Gasset, que o que distingue o homem dos outros animais é a memória. Se insistirmos em apagá-la, estamos a plagiar o orangotango. Ora um portal de um Governo é um sítio tão bom como outro qualquer para este exercício de plágio.’

2 comentários :

Anónimo disse...

A proposito de memoria, não foi este menino q disse q Cavaco fazia bem em estar calado, salvaguardando-se para uma iminente crise resultante do chumbo do TC? Foi, não foi?

A taxa de memorização é sempre inferior à taxa de esquecimento.
Isto não custa nada, o q conta é o dinheiro ao fim do mês.

Manuel disse...

Ah, mas existe isto feito pela FCCN antes de ser extinta:
http://www.arquivo.pt/