quarta-feira, abril 23, 2014

A reconstrução do país à maneira da direita

• Rui Tavares, A futilidade cruel:
    «(...) O que baixou os juros da dívida, então? Como disseram desde o início aqueles que diagnosticaram esta crise como sendo primordialmente uma crise do euro, os juros da dívida baixariam a partir do momento em que a União Europeia tivesse uma estratégia minimamente plausível para segurar a sua moeda. Não foi preciso muito, na verdade: bastou a garantia dada por Mario Draghi de que o Banco Central Europeu faria tudo na defesa do euro para que os mercados acalmassem e a fase aguda da crise passasse. Além disso, tivemos uma enormíssima injeção de liquidez nos bancos europeus — bastante maior do que o que foi emprestado em condições draconianas aos estados. E agora a promessa de que o Banco Central Europeu dará início a uma fase de “auxílio quantitativo” semelhante à que foi levada a cabo nos EUA. Entre outras coisas, foi isso que baixou os juros de Portugal, da Irlanda e até da Grécia. Os portugueses sofreram para manter uma história, nada mais.

    Se há lição que devam tirar destes acontecimentos todos os progressistas, portugueses e europeus, é que conta quem está no poder. Quem está no poder impõe políticas, impõe sacrifícios e, no fim, impõe uma narrativa. Os juros podem ter baixado exatamente pela razão que a oposição sempre disse que os faria baixar. Mas quem se aproveitou da subida dos juros para forçar a austeridade, desmantelar o estado social e de forma geral “ir além da troika”, também vai aproveitar-se da descida dos juros para proclamar vitória. E assim sucessivamente, enquanto a esquerda (pelo menos a portuguesa) continuar a defender o estado, mas a entregá-lo de mão beijada à direita.

    E essa lição vai ser mais importante ainda nos anos que aí vêm: anos de reconstrução. Mais uma vez, conta quem está no poder. Se for a direita neoliberal, o país será “reconstruído” à maneira dela, com privatizações na saúde e no ensino público, e uma segurança social espartilhada e descapitalizada. (…)»

2 comentários :

Anónimo disse...

Não esquecer da narrativa grega, que tem um excedente orçamental primário, calculado de uma maneira "ajustada" pela CE, http://blogs.wsj.com/brussels/2014/04/23/greek-primary-surplus-statistics-troika-edition/

Anónimo disse...

também Portugal tinha excedentes primários no tempo de Salazar. Era cá uma festa!
Abundancia, e pleno emprego para toda a gente, um mar de rosas...ou como se pode ter as contas do país em ordem com o país real a passar fome.
é exactamente o que pretendem estes que hoje nos governam.
e aparentemente , o próprio povo gosta de passar fome, pois ainda não os pôs com dono...