• Fernanda Palma, Cortes constitucionais:
- «A jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de "cortes " salariais bebeu a cicuta que o Governo e o Presidente da República lhe forneceram. Na verdade, fê-lo ao admitir como regra que, em situações excecionais e temporárias, não serão inconstitucionais os "cortes" dos salários da Função Pública, por não violarem desproporcionadamente a igualdade.
Não formulou um critério de justiça material. Apenas se declara impedido de deixar passar pelo crivo da Constituição reduções salariais apresentadas como definitivas ou que funcionem como tais. Converteu o anterior critério especial, baseado na urgência, na temporalidade e na ausência de alternativas, num critério formal, generalizante e de pendor "político".
O Tribunal Constitucional sente a necessidade de se referir ao Tratado Orçamental (ou a outro facto político idêntico) para fazer juízos de necessidade e excecionalidade, apesar de tal facto nem sequer ser determinante das concretas opções orçamentais. Tornou-se refém de políticas orçamentais que desvalorizam o trabalho prestado em funções públicas.
O que funciona em termos macroeconómicos como despesa é, ao nível jurídico, o salário dos trabalhadores e condição de realização dos seus direitos. Como referem dois votos vencidos, não se pode pressupor a proporcionalidade dos " cortes " salariais num quadro de discriminação continuada, abstraindo do significado constitucional do direito à remuneração.
Após as hecatombes que se têm registado no setor privado, tido como a parte sã da economia e fonte do crescimento, menos se compreende a discriminação dos funcionários públicos como alvo dos "cortes". Nada legitima, por exemplo, as indemnizações ou pensões multimilionárias atribuídas a administradores de grupos arruinados e financiados pelo Estado.
A Justiça define-se na relação de cada pessoa com as outras e com o Estado e não em termos macroeconómicos, como uma visão utilitarista propõe. Na sua jurisprudência, o Tribunal Constitucional cai nos riscos decorrentes de considerar a igualdade uma mera fórmula coletiva sem conteúdo e a necessidade um argumento que se extrai das opções políticas.
Compreende-se, pois, o " elogio " indireto da agência Fitch ao Tribunal Constitucional. Porém, é justo que se diga que este se tem oposto às soluções mais iníquas (sobretudo dirigidas a pensionistas). Causa perplexidade que haja votos de vencido que não reconhecem essas inconstitucionalidades óbvias e anulam o papel da Constituição em matéria orçamental.«
1 comentário :
É aterrador constatar que a s pressões dobre o TC resultaram e que os membros do mesmo nomeados por este governo cumpriram a sua função como exigido pela deputada TLeal Coelho. A esquerda, como sempre, fica-se pelo respeitinho ao TC não exercendo nenhum tipo de pressão para que o mesmo cumpra ao menos as regras de constitucionalidade. O entendimento do jogo partidario dentro da democracia liberal dos nossos dias é totalmente diferente
ao classicismo da esquerda, nomeadamente do PS, que como partido regulador e desequilibrador do sistema devia ter feito pressão para que as decisões não fossem modeladas por um principio de excepcionalidade. Dizer que a culpa é de Seguro não chega, esta é uma questão de cidadania partidaria activa.
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