quinta-feira, outubro 16, 2014

O preço de vender o ajustamento como um caso de sucesso


No Verão de 2013, o governador do Banco de Portugal avisou Ricardo Salgado de que Pedro Queiroz Pereira lhe havia enviado mensagens com «muita informação». Através deste artigo do Público, ainda se soube que, em Outubro desse ano, Queiroz Pereira, acompanhado de um colaborador «carregado» de documentação, se reuniu com o vice-governador Pedro Neves e o director José Queiró. A partir de então, o Banco de Portugal não poderia ignorar os problemas que afectavam o Grupo Espírito Santo — e os seus efeitos no BES.

Hoje, o i dá conta de uma troca de correspondência entre o Banco de Portugal e o Grupo Espírito Santo, com início em 3 de Dezembro de 2013, com vista à assumpção de medidas para colmatar o passivo financeiro detectado. Percebe-se que Ricardo Salgado não se conformou com as exigências colocadas pelo Banco de Portugal e que, por isso, o supervisor «apresentou um novo plano de acção diluído no tempo e mais próximo do que o GES tinha proposto».

Apesar de o GES não ter cumprido as exigências do Banco de Portugal, só em Junho de 2014 a família Espírito Santo foi afastada da liderança do BES. E, em Julho, o governador do Banco de Portugal continuava a afirmar que a situação do BES estava «sólida» e não havia risco sistémico.

A questão que se coloca é: ao contrário do que se verificou em relação ao BPN, em que o então governador Vítor Constâncio agiu logo que, através de uma denúncia, teve conhecimento das fraudes no banco do cavaquismo, porque é que o actual governador Carlos Costa demorou a actuar?

Recue-se ao início de 2014. O Governo e o Banco de Portugal preparavam o pós-troika. O BES foi apresentado como a prova da pujança do sistema financeiro, por não ter recorrido à linha de financiamento criada no âmbito do empréstimo da troika para se recapitalizar (e por sido o primeiro banco a financiar-se no mercado).

Estávamos em plena preparação da festa da «saída limpa», pelo que ninguém queria estragar o evento. Convinha isso à troika, que não queria assumir que a implosão do BES tinha ocorrido na vigência do programa de ajustamento, sem que os representantes dos credores internacionais tivessem dado por isso. Convinha isso ao Banco de Portugal, que queria ganhar tempo para encontrar uma saída que não pusesse em relevo a sua própria ineficácia. Convinha isso ao Governo, que, tendo provocado a devastação do país sem cumprir as metas constantes do memorando, queria atirar para debaixo do tapete todos os estorvos que pudessem pôr em crise a «saída limpa». Convinha isso ao Presidente da República, uma vez que, dado o lento processo de deterioração do BES, não é crível que, ao longo de meses e meses, não tivesse sido posto ao corrente da situação pelo alegado primeiro-ministro e pelo governador do Banco de Portugal.

Como escrevia Pedro Adão e Silva aqui, «[h]á bons motivos para crermos que foi a necessidade de vender o caso português como uma história de sucesso que levou ao fechar de olhos sistémico em relação ao Espírito Santo. Enquanto se repetia, como um mantra, que Portugal era um caso de sucesso, era impensável reconhecer a falência de um grupo privado, com ramificações financeiras, desta dimensão

2 comentários :

Álvaro disse...

correcto.

Anónimo disse...

O Gomes Ferreira não chama que houve um concluio entre os empreendedores politicos da direita e o banco de portugal.