sexta-feira, outubro 30, 2015

O Governo de iniciativa presidencial


• Pedro Silva Pereira, O Governo de iniciativa presidencial:
    «Ouvidos os partidos, todos sabemos que este Governo minoritário da direita toma posse em confronto com a maioria do Parlamento. É, portanto, um Governo de iniciativa presidencial. E é um Governo condenado ao fracasso.

    Face ao debate destes últimos dias, vale a pena chamar a atenção para alguns aspectos essenciais do desenho constitucional do nosso sistema de governo. Como o próprio Presidente da República recentemente reconheceu, desde a revisão constitucional de 1982 que a Constituição portuguesa afasta os chamados "governos de iniciativa presidencial". Mais exactamente, a dupla responsabilidade política do Governo perante o Presidente e a Assembleia da República, prevista na versão original da Constituição de 1976, foi substituída por um modelo de maior pendor parlamentar em que a responsabilidade política do Governo passou a existir exclusivamente perante o Parlamento, sendo complementada por uma mera "responsabilidade institucional" perante o Presidente (a consequência mais visível desta alteração foi a redução da possibilidade do Presidente demitir o Governo aos casos muito excepcionais de "irregular funcionamento das instituições democráticas").

    Esta nova configuração da responsabilidade política teve profundas implicações no desenho do nosso sistema de governo, a ponto de levar muitos constitucionalistas a concluir que o sistema se converteu de semi-presidencial em semi-parlamentar, tal a dominância acrescida que passou a ter a componente parlamentar. De facto, não se tratou apenas de limitar o poder presidencial de demissão do Governo, libertando o Executivo de qualquer forma de tutela ou dependência da confiança política do Presidente. O que ocorreu foi uma alteração bastante profunda, que atingiu os próprios alicerces do sistema de governo: a fonte de legitimidade do Governo, que até então era dupla, passou a estar concentrada exclusivamente no Parlamento, assembleia representativa da Nação. E escusado será lembrar que a vontade do Parlamento, como é norma em democracia, se expressa pela regra da maioria.

    O que de mais importante resulta da revisão constitucional de 1982 para o desenho do nosso sistema de governo é que, embora o Presidente da República seja eleito por sufrágio universal directo, deixa de haver qualquer nexo entre a legitimidade do Presidente da República e a legitimidade do Governo, a qual se passa a fundar exclusivamente na Assembleia democraticamente eleita - e por isso, aliás, não dispensa o teste da "investidura parlamentar" (através da não rejeição do programa do Governo). A novidade, porém, não reside no facto de agora nenhum Governo poder existir apenas "pendurado" no apoio político do Presidente - em bom rigor, isso já era assim mesmo antes da revisão constitucional de 82, visto que a dupla responsabilidade política sempre implicou a sujeição do Governo também ao crivo parlamentar. A verdadeira novidade é outra: a eliminação da responsabilidade política do Governo perante o Presidente, autonomizando a legitimidade do Governo, tornou ilegítimo o uso - ou abuso - dos poderes presidenciais (incluindo o poder de nomeação do primeiro-ministro) para, em claro desvio de poder, forçar o Parlamento a conviver com um Governo de pura iniciativa presidencial.

    É certo, no uso do seu poder de nomeação do primeiro-ministro o Presidente goza de uma relativa margem de interpretação dos resultados eleitorais, embora deva levar em conta a opinião dos partidos com assento parlamentar. Mas num sistema em que o Governo depende exclusivamente da Assembleia, essa margem é tanto mais pequena quanto mais inequívoca for a mensagem que os partidos transmitem ao Presidente. Ora, no caso presente a mensagem dos partidos não podia ter sido mais inequívoca: um governo minoritário da direita não tem qualquer viabilidade parlamentar, ao contrário do que sucede com um Governo formado pelo Partido Socialista. Ainda assim, o Presidente preferiu ignorar a opinião maioritária dos partidos e optou por impor este seu Governo de iniciativa presidencial. Fez mal. Mas fará ainda pior se, contra a Constituição e os superiores interesses nacionais, insistir em abusar dos seus poderes para afrontar o Parlamento, convertendo este Governo de iniciativa presidencial num prolongado e danoso Governo de gestão. Se há coisa que a Constituição não permite é que a Presidência da República seja transformada numa "força de bloqueio" da solução governativa apoiada pela maioria parlamentar que resultou das eleições.»

4 comentários :

Anónimo disse...

Este cavaco é do mais execrável e salazarento que há! Parecido com ele é também o matreiro do marcelo rebelo de sousa, só que sabe disfarçar melhor, mas só até conseguir alcançar a Presidência. Espero que os portugueses votem contra ele! Agora viram o ditador que é o cavaco, não queiram mais do mesmo! Que PS, CDU e BE criem um Governo com os melhores técnicos e políticos dos três partidos e salvem o País, pois foi por causa da desunião das esquerdas que estes pafiosos foram de mansinho destruindo Portugal e agora já estávamos a entrar novamente numa ditadura. Ainda bem que os partidos de esquerda abriram os olhos a tempo! Agora que venha o novo governo que defenderá finalmente as populações e impedirá o descalabro total. Vai encontrar tudo minado, cuidado! E terá que, através dos mecanismos legais, anular os concursos feitos ilegalmente e as nomeações sem concurso que deram tacho a milhares de boys e girls pafiosos que vão tentar boicotar o trabalho futuro. Força António Costa e novo Governo de esquerda! M.

Gungunhana Meirelles disse...

O estribilho «ganhámos e eleição», apresentado como justificação de se ter de ser nomeado para formar governo, já irrita de tão hipócrita, superficial e revelador da mentalidade batoteira do PAF.

A falácia em que se cai será fácil de perceber para quem tiver um mínimo de experiência de jogos competitivos. Consiste em se pretender atribuir a «vitória» sem previamente se ter constatado -- ou procurado estabelecer -- as chamadas «condiçoes de vitória».

Em xadrez existe uma condição simples: ganha quem consegue capturar o rei adverso. Já no jogo oriental Go a condição é mais complexa: ganha quem consegue mais território com menos baixas, sendo necessário subtrair ao território de cada um dos contendores as baixas respectivas antes de comparar os resultados. E num wargame, por exemplo, essas condições podem ser ainda muito mais variadas: uma conquista de objectivos geográficos, uma simples contagem de baixas, um certo tempo de resistência ao aniquilamento, uma combinação de alguns ou todos esses critérios etc.. Tudo depende da batalha/guerra porque as batalhas/guerras não são todas iguais.

Passemos destes dois exemplos de jogos de tabuleiro, para dois jogos eleitorais pelas regras da constituição portuguesa, chamando, para simplificar, «objectivos» às «condições de vitória».

1) A eleição para PR. Qual é o objectivo? Conquistar a presidência. Quem ganha? Quem conquista a presidência, ou seja, quem tiver mais de 50% dos votos à primeira volta ou mais votos à segunda. Resposta óbvia, ponto final, parágrafo.

2) A eleição para a AR. Qual é o objectivo? Conquistar lugares no parlamento. Quem ganha? Quem conquista lugares no parlamento? Pode ser um critério, e na verdade, o único critério possível segundo o objectivo definido. Portanto a resposta ao jogo simples da AR só pode ser que ganham todos os eleitos e perdem todos os não-eleitos. Para outra resposta teremos de reconsiderar a forma como estamos a formular o objectivo da eleição (neste caso, condicionando-o, aliás, de acordo com uma percepção relativamente comum dos eleitores e um tanto incorrecta, porque a AR não serve só para aprovar/reprovar governos, ao papel da AR na formação de um novo governo). Temos portanto que reformular a questão conforme passo a fazer.

3) A eleição para a AR à luz da formação de um novo governo. Qual é o objectivo? Formar um novo governo. Quem ganha? Quem forma um novo governo? Não, porque a formação de um novo governo não depende só da AR, nem resulta linearmente da eleição da AR. Quem forma um novo governo é o primeiro-ministro e quem nomeia o PM é o PR. A AR limita-se a aprovar ou reprovar o novo governo que lhe é apresentado. Logo, a resposta à pergunta «quem ganha a eleição para a AR à luz da formação de um novo governo?» só pode ser, para a pergunta fazer algum sentido: ganha quem obtém a maioria dos 230 lugares, ou seja, quem reúne as condições para fazer passar um governo seu e impedir qualquer governo diferente desse.

4) E a pergunta seguinte pode ser «quem é que consegue ganhar um apoio maioritário para o seu governo?», mas essa pergunta já pertence a outro jogo: o jogo político jogado na AR e não o jogo eleitoral jogado nas urnas.

Posto isto, uma chamada de atenção. O que os patetas de serviço aos media estão constantemente a ecoar como papagaios, é basicamente isto (a formulação que eles fazem deste jogo eleitoral para a AR):

5) A eleição para a AR à luz do feel-good feeling dos comentadores PAFiosos: Qual é o objectivo? Obter o maior contingente de deputados. Quem ganha? Quem obtém o maior contingente de deputados. Está certíssimo e tem tudo a ver com a satisfação pessoal do comentador, mas muito pouco com as condições objectivas de vitória à luz da formação de um novo governo. Nada a ver com a constituição e nada a ver com a lógica.

Anónimo disse...

Este governo agora empossado é uma perca de tempo, de dinheiro e de parte da nossa paciência.
Isso é o que eles querem. Destruir a nossa esperança.
E são capazes de andar assim, sabe-se lá, por quanto mais tempo nestas desengonças destruindo as nossas vidas a seu belo prazer sem nada que os constranja porque os imperativos nacionais proclamados não passam de balelas com que se vão enchendo não só de dinheiro mas de poder ofegante castrador e dominador na mais perfeita acepção do fascismo.
José C.

Júlio de Matos disse...



O mais INTOLERÁVEL é que a legitimidade política da Assembleia da República é fresquíssima, tem apenas, um mês, ao passo que... onde é que já vai a "legitimidade" política de um BANDALHO presidencial eleito para o segundo mandato com a menor maioria de sempre, já há CINCO ANOS (em bom rigor, noutro Portugal!...) e com NÍVEIS DE POPULARIDADE BAIXÍSSIMOS desde há ANOS!!


Com que cara é que esta MERDA vai enfrentar o País no dia em que for DESPEJADO DE BELÉM, hã?