quinta-feira, setembro 22, 2005

Inside trading

Na caixa de comentários ao post anterior, um leitor coloca a seguinte questão:

    "Porque é que não pergunta o que é feito do inquérito àquele juiz que soube antecipadamente que a Fátima Felgueiras ia ser detida e lhe transmitiu a informação, possibilitando-lhe a fuga para o Brasil?"

O CC está aberto a quem quiser responder a esta questão.

2 comentários :

Anónimo disse...

Tribunal Constitucional aceita que juiz não ouça escutas
2005/09/21 | 10:54
Escutas telefónicas são válidas, mesmo sem prévia audição pessoal do juiz. Acórdão contraria prática que levou à anulação de vários processos-crime

Depois de nos últimos anos, diversos tribunais superiores terem anulado escutas telefónicas em processos-crime, provocando por vezes o ruir da prova e a absolvição de arguidos, o Tribunal Constitucional veio agora defender uma nova abordagem, noticiou esta quarta-feira o jornal Público.

Num acórdão de 25 de Agosto, assinado por três magistrados, os juízes consideraram que não é inconstitucional o entendimento de que as escutas telefónicas são válidas, mesmo quando não houve prévia audição pessoal do juiz, mas aquelas foram apenas acompanhadas pela leitura dos textos, completos ou em súmula, apresentados pela Polícia Judiciária (PJ).

O representante do Ministério Público, naquele tribunal superior, defendeu ainda que o juiz de instrução pode ser coadjuvado pelos órgãos de polícia criminal, na respectiva selecção das escutas telefónicas, não necessitando de ser ele a fazê-la.

Tese que foi contra-argumentada pelos arguidos, que consideravam serem as escutas nulas, uma vez que a selecção das partes consideradas relevantes haviam sido feitas pela PJ e não pelo juiz de instrução.

Segundo o Público, o Tribunal da Relação de Guimarães proferiu um acórdão, em Março de 2004, negando a alteração das penas de prisão a três arguidos, condenados por tráfico de droga.

Meses depois, em Junho do mesmo ano, o Supremo anulou aquela decisão, por considerar não ter ficado suficientemente clara a questão do acompanhamento das escutas. «A fundamentação do acórdão (...), ao remeter para os documentos juntos aos autos, mormente a transcrição das escutas, acabou por omitir um dado essencial, a saber: tirando a única transcrição em que se diz que o juiz ouviu previamente a gravação, as demais ordens de transcrição foram dadas e foram ou não precedidas da imprescindível escolha por aquele magistrado?» Foi esta a questão feita pelos juízes, considerando então que «da resposta a estas perguntas vai uma distância grande, que pode oscilar entre a validade e a nulidade» daquele meio de prova.

Um novo julgamento na Relação de Guimarães, a 18 de Outubro de 2004, que teve um voto de vencido de uma magistrada, voltou a defender a validade das mesmas escutas telefónicas. «Bastando (...) demonstrar-se a bondade dos preceitos policiais e judiciais», disseram os juízes. «A operacionalidade destes mecanismos não vem estritamente definida e a prática aconselha a que, a mais das vezes, seja o órgão de polícia criminal quem previamente elabora um resumo das escutas, submetendo-o ao juiz, sem que com isso se viole qualquer regra.»

De acordo com o Público, o Tribunal Constitucional diz agora que, independentemente de não ser aquela a melhor interpretação da lei, também não é inconstitucional tal entendimento. «Em rigor, a selecção dos elementos a transcrever é necessariamente uma primeira selecção, dotada de provisoriedade, podendo vir a ser reduzida ou ampliada. Assiste, na verdade, ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas o direito de examinarem o auto de transcrição e exigir a rectificação dos erros de transcrição detectados ou de identificação das vozes gravadas. (...) A aceitação (....) torna puramente formal a pretensa irregularidade, que de modo algum pode ser considerada como pondo em risco os valores prosseguidos.»

A forma como as escutas telefónicas são validadas, o seu acompanhamento e o tempo que demoram a ser levadas ao juiz de instrução têm estado no meio de acesas polémicas, lê-se na mesma publicação.

Quem o recorda é o próprio Tribunal Constitucional, invocando as últimas propostas de alteração feita pelos mais diversos partidos políticos, para que a questão fosse regulamentada de forma mais clara.

Os juízes daquele tribunal fazem ainda uma resenha dos sistemas que existem nos mais diversos países da Europa. Na maioria deles, o Ministério Público pode autorizar escutas telefónicas, sempre que a urgência assim o determine. Só depois as mesmas são levadas ao juíz de instrução.

Anónimo disse...

I - No âmbito dos efeitos à distância emergente do recurso a «métodos proibidos de prova» poderá dar-se consistência prática à distinção entre os métodos previstos no nº. 1 do art. 126º e os previstos no nº. 3.
II - Com efeito, enquanto o recurso aos meios radicalmente proibidos de obtenção de provas inutilizará - expansivamente - as provas por eles directa e indirectamente obtidas, já deverá ser mais limitado - em função dos interesses conflituantes - o efeito à distância da «inutilização» das provas imediatamente obtidas através dos demais meios proibidos de obtenção de provas (ofensivos não do «valor absoluto da dignidade do homem», mas de «interesses individuais não directamente contendentes com a garantia da dignidade da pessoa», como a «intromissão sem consentimento do respectivo titular» na «vida privada», «no domicílio», na «correspondência» ou nas «telecomunicações»).
III - Sobretudo quando, como no caso, a nulidade do meio utilizado (a «escuta telefónica») radique não nos seus «requisitos e condições de admissibilidade» (art. 187º) mas nos «requisitos formais» das correspondentes «operações». Pois que, sendo esta modalidade, ainda que igualmente proibida (arts. 126º.1 e 3 e 189º), menos agressiva do conteúdo essencial da garantia constitucional da inviolabilidade das telecomunicações (art. 34º.4 da Constituição), a optimização e a concordância prática dos interesses em conflito (inviolabilidade das comunicações telefónicas versus «verdade material» e «punição dos culpados mediante sentenciamento criminal em virtude de lei anterior que declare punível a acção») poderá reclamar a limitação - se submetida aos princípios da necessidade e da proporcionalidade - dos «interesses individuais, ainda que emanações de direitos fundamentais, que não contendam directamente com a garantia da dignidade da pessoa».

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, a 4ª Vara Criminal de Lisboa, condenou EJTM e DLC, como co-autores de um crime de tráfico comum de drogas ilícitas, nas penas, respectivamente, de 7 anos e 10 meses de prisão e de 6 anos e 9 meses de prisão.
Inconformados, os dois arguidos recorreram à Relação de Lisboa, mas em vão o fizeram, já que, por acórdão de 19/11/03, julgou ambos os recursos improcedentes.

Ainda irresignados, recorrem agora ao Supremo Tribunal de Justiça balizando assim respectivamente o objecto dos recursos:
A. O arguido EM, pedindo uma vez mais, a absolvição, a anulação do acórdão recorrido ou a condenação na pena mínima:
O acórdão não fundamentou devidamente a decisão quanto às implicações da nulidade das escutas telefónicas.
Designadamente quanto ao nexo de causalidade entre a nulidade das escutas e a existência processual dos arguidos.
A decisão já não se pronunciou quanto ao nexo de causalidade entre a nulidade das intercepções telefónicas e a apreensão da droga, tal como o recorrente havia solicitado nas suas conclusões de recurso. De todo o modo sempre se dirá verificar-se claro e inequívoco nexo de causalidade entre as escutas telefónicas e os restantes elementos de prova, de que o tribunal se socorreu para fundamentar a sua convicção.
Com efeito, como resulta do depoimento do encarregado da investigação (inspector JV) e de vários relatos de vigilâncias externas, foi com base nos elementos colhidos através das escutas telefónicas que se soube da existência processual dos arguidos E, JD.
E ainda, foi através dos elementos colhidos nas escutas que se soube da vinda de uma mala com droga, bem como do restante circunstancialismo da sua chegada. É pois bem evidente o nexo de causalidade entre as escutas e os elementos determinantes para a formação da convicção do douto tribunal. É esta a melhor interpretação a dar aos artigos 187º, 188º, 189º e, sobretudo, ao 122º do CPP, pois a dar-se-lhes outra então essas normas são inconstitucionais por contenderem com o estatuído nos artigos 32º, nºs. 1 e 8, e 34º da CRP.
De todo o modo, sem conceder, sempre se dirá que a medida da pena se mostra excessiva. Na verdade, a considerar-se sã a confissão dos arguidos, então a sua relevância para a prova dos factos foi decisiva.
Ora, esta circunstância não foi devidamente ponderada pelo acórdão de que se recorre. Além do mais, o recorrente é primário e tem quatro filhos menores.
Entende-se assim, tal como o juiz que votou vencido, que a pena deveria ser inferior.
Por tudo o que se disse a pena nunca deveria de ser superior ao mínimo legal aplicável.

B. O arguido DL, impetrando a absolvição (em face das nulidades das escutas e dos actos que delas dependeram) (1) - ou a atenuação especial da pena (arts. 31º do dec. lei 15/93 e 71º e 73º do CP) - e, enfim, a sua suspensão:
A nulidade das intercepções telefónicas torna inválidos todos os actos que delas dependerem e que puderem afectar posteriormente.
A entidade investigadora obteve conhecimento da operação descrita nos autos, única e exclusivamente, por intermédio das escutas telefónicas que o tribunal "a quo" declarou nulas.
A apreensão do produto estupefaciente, e bem assim de todas as listagens relacionadas com a mala onde o mesmo vinha e respectivos voos, só foi efectuada por a polícia judiciária ter tido acesso às referidas escutas.
Como tal, todas as apreensões feitas e inclusivamente a detenção dos arguidos, dependeu das intercepções telefónicas que, sendo nulas, tornam inválidos estes actos.
O tribunal "a quo" condenou os arguidos com base nas declarações, violando o disposto nos artigos 122º, nº. 1 do CP e 32º, nºs. 1 e 8 da CRP, diminuindo manifestamente as garantias de defesa do arguido recorrente.
Com efeito, as estratégias de defesa de um arguido são elaboradas e pensadas em função das provas existentes no processo.
Sendo as escutas nulas e, não havendo qualquer outra prova que contra o recorrente depusesse, duvidoso seria que se aconselhasse o recorrente a fundamentar a sua própria condenação.
O acórdão ora recorrido não fundamentou correctamente a decisão proferida no sentido do efeito causado pela nulidade das escutas telefónicas.
Ocorre nexo de causalidade entre a nulidade das escutas telefónicas e a existência processual dos arguidos.
O acórdão da Relação não se pronunciou quanto ao nexo de causalidade entre a nulidade das escutas e a apreensão da droga, questão esta suscitada nas motivações de recurso.
O acórdão da Relação de Lisboa não se pronunciou sobre o nexo de causalidade entre as escutas telefónicas e os restantes elementos de prova, designadamente a confissão dos arguidos. Só ocorre confissão porque existiam escutas telefónicas; tendo sido estas declaradas nulas, a confissão está contaminada.
Pelo exposto, deverá concluir-se pela absolvição do recorrente por insuficiência de prova.
Se assim se não entender e dado que as conclusões expostas privilegiam o aspecto processual em obstrução da verdade material, dever-se-á ter em conta que:
a) a matéria de facto foi erroneamente apreciada;
b) resulta do próprio acórdão proferido pelo tribunal "a quo" a colaboração exaustiva que o recorrente teve com a Polícia Judiciária;
c) tal colaboração foi evidenciada pelo próprio coordenador da investigação, que a qualificou como muito importante para todo o processo;
d) o recorrente efectuou chamadas telefónicas e marcou encontros com o arguido E, na presença dos inspectores da Polícia Judiciária, a fim de esta entidade poder proceder à detenção desse arguido; e) mais tarde, o recorrente procedeu a auto de reconhecimento do arguido E como sendo a pessoa que tratava por «Dr.» nas escutas telefónicas e a quem ia entregar a mala, objecto dos presentes autos;
f) o coordenador da investigação, em audiência de julgamento, salientou a importância do auto de reconhecimento assinado pelo recorrente, evidenciando a atitude invulgar, do recorrente, em processos relacionados com tráfico de estupefacientes;
g) a colaboração do recorrente foi extremamente importante não só para a identificação do co-arguido E, mas também para a própria descoberta da verdade material, servindo como prova chave da fundamentação da condenação;
h) a pena aplicada não valorou devidamente a decisiva colaboração prestada às autoridades policiais pelo recorrente, bem como a implícita prognose favorável de reinserção social, inexistindo quaisquer circunstâncias agravantes.
Revelador da falta de valoração da colaboração do recorrente é o facto do tribunal "a quo" não fazer qualquer referência ao reconhecimento que o recorrente fez, em sede de inquérito, do arguido E.
A conduta do recorrente exige a aplicação ao mesmo do artigo 31º do DL 15/93. Mesmo que assim se não entendesse, sempre seria de concluir, sem grande margem para dúvidas, que os infindáveis esforços de colaboração do recorrente são verdadeiros actos demonstrativos do seu sincero arrependimento.
A Relação não se pronunciou sobre a eventual aplicação da atenuação especial. Nos termos dos artigos 72º, nº. 1 e nº 2, al. c), e 73º do C. P., a pena do recorrente deverá ser especialmente atenuada, situando-se numa moldura penal abstracta entre os 8 meses e 8 anos de prisão. Acresce que os factos dados como provados, desde que objecto de uma correcta ponderação e avaliação, e ainda que não colocado o ora recorrente ao abrigo do artigo 31º do DL 15/93, aconselhariam a aplicação de uma pena correspondente ao mínimo do artigo 21º do DL 15/93, especialmente atenuada e suspensa na sua execução. E mesmo que assim se não considerasse, a pena do recorrente nunca deveria ser superior ao limite do citado artigo 21º.

O Ministério Público, nas suas contra-alegações, aceitou o princípio do efeito à distância, mas não o alcance que se lhe pretendeu dar, e admitiu, no caso do arguido DL, que a importância da sua colaboração possa conduzir - mas não nos termos do art. 31º do Dec. Lei 15/93 - a uma redução da pena ainda maior:
AS ESCUTAS. Declaradas nulas as escutas telefónicas, tornam nulo o acto em que se verificam, bem como os que dele dependeram e aquelas que puderam afectar, como bem refere o disposto no artigo 122º, nº. 1, CPP. O parecer junto do Doutor Costa Andrade defende o princípio do "efeito à distância", como princípio imanente da nulidade das escutas telefónicas, para concluir pela nulidade de todas as outras provas, por conexas com as escutas ilegítimas. A questão hoje não é de aceitar o princípio do efeito á distância, mas definir qual o alcance deste princípio. Aí as doutrinas e jurisprudências não acompanham o parecer do Doutor Costa Andrade, numa interpretação extensivo-formal, civilística, que levaria a nulidade de todas as provas, que directa ou indirectamente pudessem resultar das escutas ilegítimas. (...) O alcance deste princípio deverá ter como limite um outro princípio, o princípio do nexo de causalidade necessária ou seja do princípio "sine qua non". Só devemos aceitar como efeito à distância da nulidade das escutas as provas a que se possa responder, absoluta e necessariamente, que sem as escutas nunca teriam existido, como imanência do princípio "sine qua non" ou princípio da causalidade necessária, obtendo-se equilíbrio entre ambos os princípios. E foi isso que fez o acórdão recorrido. Pronunciou-se de forma clara, por remissão às provas e factos provados na 1ª instância, sobre o nexo de causalidade entre as escutas nulas e os outros meios de prova. Aplicando o princípio do nexo de causalidade necessária, "sine qua non", responderemos da seguinte forma: - É garantido e absoluto que sem as escutas as mala do estupefaciente não seria encontrada? - É seguro e absoluto que sem as escutas os arguidos não confessavam o crime da forma como o fizeram? - É seguro e garantido que sem as escutas o arguido D não colaboraria com a PJ na investigação? - É seguro e absoluto que sem as escutas as buscas não se faziam, nem se identificavam os arguidos? Ora, a resposta séria a estas questões só pode ser que garantido e absoluto não é. Que podem ter facilitado sim, mas que foram condição sine qua non, não é verdade. Quem garante que a mala de droga não seria detectada no aeroporto? Seria o 1º caso sem escutas? E o conhecimento dos arguidos antes das escutas? Então foi por mero tropeçar nas escutas que descobriram os arguidos ou foi por já serem referenciados que, então, partiram para as escutas? Não se escutam 10 milhões de portugueses à procura de crime ... Escutam-se pessoas de quem se tem indício forte de crimes, e esses conhecimentos não podiam levar no caso à descoberta da mala, à droga? Quem o poderá garantir com absoluta segurança? Claramente que ninguém. Acresce que o princípio da verdade material em matéria de investigação criminal continua a ser o grande norte na investigação. Não como se pretende neste recurso que é o princípio da verdade formal. Não estamos no direito civilístico, com o princípio do inquisitório, mas em direito penal com a verdade material. Ora os arguidos colaboraram na descoberta do crime, confessaram, o crime está mais que provado sem conteúdo próprio das escutas. Ou imanência necessária delas.

A COLABORAÇÃO DO ARGUIDO D. Neste particular já nos surgem algumas dúvidas de se este arguido não deveria pelo menos ver a pena aplicada especialmente atenuada. Na verdade, após o efeito da nulidade das escutas, releva mais a colaboração do arguido com a PJ e torna este meio de colaboração muito importante ou quase essencial relativamente ao outro arguido. É verdade, como se refere no acórdão recorrido, não ter sido determinante, não foi essencial na descoberta da verdade, mas apenas importante. Ver diminuído apenas um ano de prisão, relativamente ao co-arguido, parece pouco para tal colaboração.

ARGUIDO E. Este arguido suscita, além da questão da nulidade das escutas e suas implicações na prova, a da medida da pena. Quanto a esta, entendemos que o arguido não tem razão. Na verdade a elevada quantidade da droga apreendida e os meios usados são fortemente indiciadores de estarmos perante traficantes de relevo. A confissão é realmente relevante, mas tal já foi ponderado na determinação dos 7 anos e 10 meses de prisão. Não concordamos com o pedido da redução da pena para os mínimos legais.

Subidos os autos, promoveu o Exmo. Procurador-Geral Adjunto a sua remessa para julgamento em audiência.
Entretanto, o processo foi objecto de redistribuição em 21/4/04, por doença do primitivo relator.
As questões essenciais a decidir passam:
1. Pelo chamado «efeito à distância» da declaração de nulidade de certas provas, no caso as escutas telefónicas.
2. A medida das penas, equacionada em face, nomeadamente da possibilidade de os arguidos beneficiarem de atenuação especial das penas.

2. Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir.
Vejamos, antes de mais, os factos provados:
O arguido EM, também tratado por «...» ou «Doutor» e o arguido DC, desde data não determinada, situada entre o final do ano de 2000 e o mês de Maio de 2001, bem como outros indivíduos, um dos quais de nacionalidade venezuelana, decidiram introduzir cocaína na Europa (v. g., Espanha), a partir da Venezuela e através do nosso país.
Para esse efeito, a cocaína seria remetida por via aérea numa mala proveniente da Venezuela com destino ao Funchal, com trânsito pelo aeroporto de Lisboa, local onde seria interceptada e recolhida de forma a não deixar vestígios da operação.
Ao arguido E competia acompanhar a chegada do produto estupefaciente ao nosso país e a sua efectiva entrega por parte do arguido D à pessoa ou pessoas que o iriam transportar para o país vizinho, para além de assegurar algumas funções de coordenação em razão dos contactos exteriores àquele, designadamente transmitindo ao arguido D os horários e números dos voos e os números de expedição da mala remetida da Venezuela.
Porque, contrariamente ao que tinha feito saber ao arguido E, este último não trabalhasse no aeroporto de Lisboa, veio a contactar o arguido PD, seu amigo de infância, operador de rampa nas referidas instalações aeroportuárias, que por via das funções exercidas tinha acesso pessoal à carga e descarga dos aviões, a quem expôs os propósitos acima referidos e a natureza do produto envolvido e pediu que retirasse do seu circuito normal a mala que a contivesse.
O arguido D verbalizou ao arguido D a sua aceitação.
Em data próxima, posterior a esta conversa, também, a pedido deste último, o arguido D entregou-lhe listagens de chegadas de voos provenientes da Venezuela e de ligações destes ao Funchal, a fim de habilitar o arguido D a estabelecer com os demais intervenientes, designadamente com o arguido E, a concertação do dia e hora da partida e chegada da mala, em ordem a assegurarem a sua intercepção.
Veio a ser prometido ao arguido D um ganho de 250.000$ por cada quilo de cocaína transportada/interceptada.
Uma vez acertado o dia para o efeito, o arguido E contactaria o arguido D, que por sua vez forneceria a informação necessária ao arguido D, que, munido dela, se deslocaria ao avião e interceptaria e desviaria no aeroporto de Lisboa a mala em trânsito. Retirada a mala, esta seria entregue ao arguido D, que a entregaria por sua vez à pessoa que para tanto viesse a ser designada.
Pela sua actuação, receberia o arguido DC 500.000$ por quilo, dividindo essa importância, em partes iguais, com o arguido PD.
Pela sua actuação, o arguido EM receberia, pelo menos, a quantia de 500.000$.
Na concretização desse desiderato, veio a ficar estabelecido que uma mala contendo cocaína, chegaria ao aeroporto de Lisboa no dia 2 de Julho de 2001, no voo 10.335, com o número de expedição 426707.
Tal facto foi comunicado ao arguido D e por este ao arguido D a fim de este último a interceptar e recolher, tendo-lhe o primeiro, para o efeito, enviado uma mensagem para o telemóvel, utilizando uma linguagem cifrada, em que o número de expedição foi antecedido dos dígitos 96, e o número de voo referido apelidado de código de "pin", com o propósito de encobrir o verdadeiro conteúdo a mensagem e sugerir um numero de telefone.
Por motivos que não foi possível apurar, a mala não foi interceptada.
Por via telefónica, o arguido D instou o arguido D, veementemente, por diversas vezes, na manhã desse dia 02 de Julho, para que procurasse a mala e a interceptasse, referindo-lhe o segundo ter havido uma troca ou confusão de números e, por isso, não a poder localizar.
Poucos dias depois, foram ainda efectuados diversos contactos via telemóvel por parte do arguido D ao arguido D, instando-o a indagar do destino e da localização da mala e alcançar a sua recuperação, nomeadamente na bagagem perdida e respondendo-lhe o segundo que, apesar das pesquisas e diligências feitas, não conseguira encontrar nem apurar nada.
Em data não concretamente apurada, posterior a 2 de Julho, o arguido D forneceu uma outra listagem de voos ao arguido D, a fim de este poder justificar perante os demais intervenientes a sua posição de que não havia ficado com a mala e de que tinha havido um lapso de comunicação de números quando da sua expedição.
Esta veio a ser efectivamente recuperada pela Polícia Judiciária no Funchal e, uma vez aberta, constatou-se que continha vários pacotes de cocaína, com o peso de 10.034,322 g.
Em face do seu extravio, o arguido E e o arguido D no dia 8 de Julho deslocaram-se a Madrid, a fim de, designadamente, este último se justificar perante os outros intervenientes.
Foi dito ao arguido D, de forma intimidatória, que, se a mesma não aparecesse, teria que os compensar, pagando-lhes a quantia de 20.000.000$.
O arguido EM, no ano de 2001, deslocou-se a Madrid pelo menos em 24 de Março, 26 de Março, 11 de Maio, 25 de Maio e 13 de Junho.
Na busca realizada na casa do arguido DC, foram encontrados e apreendidos: - um pedaço de papel com os dígitos 426707; - um pedaço de papel, contendo horários de voo para o Funchal; - uma listagem de diversos números de voos; - três telemóveis.
Foi-lhe ainda apreendido o veículo automóvel da marca Audi, modelo TT, matrícula MJ.
Na revista a que o arguido PD foi sujeito, foi-lhe apreendido um telemóvel com um cartão de acesso à rede Telecel e outro cartão de acesso à rede TMN.
Na busca realizada à residência do arguido EM, foram-lhes encontrados e apreendidos: - dez telemóveis; - 50.000$ em notas do Banco de Portugal, 1.500 florins em notas do Banco da Holanda, 20.000 pesetas em notas do Banco de Espanha. - 11 cartões para acesso a telemóveis; - uma pistola da marca Llama Max-145 L/F calibre 45, com o número de série rasurado.
Foi-lhe ainda apreendido o veículo automóvel da marca Citroën, modelo Xantia, de matrícula CN.
Os arguidos para a efectivação dos contactos entre eles, designadamente para os efeitos acima reportados, usavam telemóveis.
(...) O arguido D estava totalmente ciente dos fins e propósitos que animavam o arguido D, e, ainda assim, entregou-lhe as listagens acima referidas, sabendo perfeitamente a que se destinavam.
Os arguidos agiram com vontade livre, conscientes de ser proibido o seu comportamento.
O arguido EM é casado.
Tem 4 filhos, sendo que dois de uma sua anterior relacionamento com ET e outros dois da actual mulher, todos nascidos em Portugal.
Antes de detido, desenvolvia actividades como empresário na exportação de bens adquiridos em Portugal para o seu país natal (Cabo Verde).
Tem nacionalidade cabo-verdiana.
O seu CRC não regista qualquer condenação.
Em audiência, admitiu ter sido contratado para "controlar" o arguido D em toda esta operação, a troco de 500 contos, cujos contornos conhecia perfeitamente, e que relatou de forma detalhada.
No Estabelecimento Prisional encontra-se colocado como faxina do bar, mantendo comportamento adequado.
O arguido DC confessou os factos, de que revelou arrependimento, introduzindo como única nota divergente o ter actuado a partir de determinado momento, aquele em que ficou a saber que o conteúdo da mala era cocaína, ameaçado pelo arguido E.
Oriundo de uma família da classe média, os pais separaram-se quando contava três anos de idade.
Da nova relação entretanto encetada pela mãe, adveio-lhe uma irmã.
Frequentou o 12º ano da escolaridade e, com 17 anos de idade, começou a trabalhar em recepção e arquivo numa firma de ensino à distância, a CEAC.
Nessa altura vivia com a avó.
Em 05Abr99, constituiu a sociedade por quotas "..., Lda.", que, posteriormente, veio a ser convertida em sociedade unipessoal, a que esteve sempre ligado, e de que é o único sócio e gerente.
Se no primeiro ano tudo correu economicamente bem, algo aconteceu posteriormente (dívidas e descontrole financeiro).
A partir do momento da sua detenção, ajudou a investigação, que qualificou a sua colaboração "como importante para a descoberta da verdade".
Já na presença dos inspectores da PJ, o arguido D marcou por via telefónica diversos encontros com o arguido ET em locais que identificou em mapas fornecidos pela PJ com vista à sua captura.
Dirigiu-se para os locais combinados na sua companhia, mas tais encontros não se concretizaram por falta aos mesmos do arguido EM.
O seu CRC não evidencia qualquer condenação.

A fundamentação de direito do acórdão recorrido:
Preceitua o art. 21º, nº. 1, do DL 15/93, de 22/01, que: "Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou a qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no art. 40º, plantas, substancias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos". Ora como será lógico supor, as alterações introduzidas na matéria de facto provada, que acima deixamos consignadas, obrigam a re-colocar a situação da co-autoria em termos distintos dos enunciados pela pronúncia. Como vimos, o arguido D não conhecia o arguido E e entre eles ião se estabeleceu qualquer acordo no sentido da intercepção da mala. Se existe ou não uma outra co-autoria sucessiva enxertada neste iter criminis, fundada na relação do arguido D com o arguido DC, é matéria a que abaixo voltaremos. Posto que a mala - por razões que se ignoram - não tenha sido retirada em consonância com o plano delituoso inicialmente traçado, dúvidas não temos em concluir que, em face de um tipo plural e alargado acima deixado transcrito, os dois primeiros arguidos praticaram um crime de trafico de estupefacientes, pois se não "importaram", seguramente "fizeram transitar" cocaína desde a sua origem na Venezuela até Portugal. Não cabe aqui falar pois, de crime impossível, ou tentativa impossível, já que na modalidade típica indicada, o crime está perfeitamente consumado. Sendo este, como é, um crime de perigo, tal actividade, por si só, é susceptível de criar esse perigo e justificar a punição correspondente. Uma vez que essas actuações, como exuberantemente ficou demonstrado, tem a unifica-las um acordo ou execução conjunta, estão preenchidos também todos os requisitos exigidos pelo art. 26º do Cód. Penal, para a sua imputação a estes arguidos, em termos de co-autoria. (...) Quanto à agravação do crime de tráfico, retira a pronúncia, para a fundamentar, as circunstâncias decorrentes da al. b) do art. 24º do DL 15/93, ou seja, de que "as substâncias ou preparações foram distribuídos por grande número de pessoas", e da al. c) do mesmo preceito: "o agente obteve ou o procurava obter avultada compensação remuneratória". A primeira arrancará seguramente da divisão do peso total da mesma pelo número de doses potenciadas. Porém, mesmo concedendo na capacidade dispersiva significativa da cocaína apreendida, a verdade é que da interpretação que fazemos desta alínea, atendemos que a mesma aponta não para uma consideração prospectiva do que se irá distribuir, mas antes, da que se mostre consumado em lesão efectiva do bem jurídico protegido. Ora não só a droga não chegou as mãos dos arguidos, não tendo entrado no circuito de comercialização, como também, seguramente, não seriam eles que a iriam vender aos consumidores finais. No que concerne à segunda agravante, a situação já não é tão linear. Não tanto em relação ao arguido E, de que apenas se apurou um ganho possível de 500 contos - o por si confessado - mas antes em relação ao arguido D, que iria auferia cerca de 250 contos por cada quilo recebido, ou seja, uma remuneração total de 2.500 contos. É que, com efeito, a jurisprudência não tem exigido para o preenchimento deste conceito vago e indeterminado o mesmo nível revelado, por exemplo, para os crimes patrimoniais, satisfazendo-se com valores muito inferiores: "(...) a deslocação ilícita da posse ou detenção do bem objecto do crime é o seu momento fulcral; no tráfico, ao direito penal interessa menos a transferência (a posse ou da detenção do "bem"), mas mais a actividade da sua cedência ou disponibilidade em virtude do consumo final a que está destinada. Não é a diminuição do património do adquirente que está em causa mas uma particular censura do espírito de lucro ou ganho". "Por isso, e contrariamente ao que já se viu defendido, porque o prejuízo dos interesses jurídicos a tutelar pode ser maior que nos crimes contra o património, a noção de "avultada compensação remuneratória" pode situar-se a nível mais baixo que o dito valor "consideravelmente elevado" ou "elevado" para desencadear o uso da agravante do art. 24º al. c) do DL 15/93, de 22/01" (STJ, 44/2000-3). Ora a esta luz, o montante em causa está muito próximo de integrar tal conceito, embora não o atinja. Definido este enquadramento legal, procuraremos então concretizar a pena a aplicar aos arguidos, tendo em conta que as mesmas "visam a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade", sendo que "em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa" (art. 40º, nºs. 1 e 2). Que o art. 71º do mesmo diploma, estipula que "a determinação da medida a pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e as exigências de prevenção" (nº. 1). Que o limite máximo fixar-se-á - em salvaguarda da dignidade humana do agente - em função da medida da culpa, que a delimitará por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que se façam sentir. Que o seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que em concreto ainda realize eficazmente essa protecção dos bens jurídicos. Que dentro destes dois limites, encontrar-se-á o espaço possível de resposta às necessidades da reintegração social do agente, sendo certo que, para o efeito, o tribunal deverá atender "a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele" (art. 71º, nº. 2, do CP). Em qualquer das circunstâncias apontadas o dolo é directo. A ilicitude da conduta dos dois primeiros arguidos é assinalável. Não só em unção da quantidade do produto em causa - um pouco mais de 10 kg, como também da sua qualidade - cocaína, como pela modalidade do tráfico - estamos perante uma situação que envolve claros contornos transcontinentais. Só não o é mais, porque em face da sua recuperação, o perigo abstracto prevenido pela norma, não se transmutou em perigo concreto para a saúde dos consumidores a que haveria de se destinar. Em relação à culpa, não vislumbramos qualquer causa ou circunstância que a possa mitigar. A este nível de intervenção na cadeia hierárquica do tráfico, em que já existe um acesso directo à pessoa que expede ou a quem se destina a droga, não é de estranhar que os arguidos evidenciem uma "normal" inserção profissional, familiar social. Não têm antecedentes criminais.
Em termos de colaboração para a descoberta da verdade tem que ser realçada a posição do arguido DC, que no inquérito se aprestou a colaborar na detenção do arguido E, que prestou declarações que são manifestamente úteis para a verdade - sobretudo se visionadas agora numa perspectiva em que as escutas telefónicas não poderão contar como meio de prova. Só não atingem o âmbito de previsão do art. 31º do DL 15/93, porque tal colaboração, embora importante, não foi considerada pelos próprios investigadores como decisiva para a recolha de prova e para a identificação e captura do arguido E. Deverá no entanto relevar. Em julgamento, o sentido da sua confissão ressentiu-se por pretender ser ao mesmo tempo a fonte da sua própria desculpabilização, "quando veio a saber que o que vinha na mala era droga, passou a ser pressionado e ameaçado pelo arguido E", sendo certo que a sua postura de jovem alheio e inexperiente nas vivências da droga foi total e corrosivamente abalada pela defesa do arguido E, impedindo-nos assim a fixação de quantum de pena inferior, de outra maneira concebível. As declarações daquele último em audiência são igualmente importantes, mas sofrem do óbice de constituírem uma "antecipação" do que esperava virem a ser as declarações do arguido E. Perante todo este quadro, entendemos adequadas as penas de 7 anos e 10 meses de prisão para o arguido E, 6 anos e 9 meses de prisão para o arguido D (...).

As questões a decidir perante o Supremo Tribunal de Justiça (2).
Provas proibidas e efeito à distância
«São nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas» (art. 126º.1 do CPP).
«Ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas as provas obtidas mediante intromissão (...) nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular» (art. 126º.3).
«Esta nulidade («ineficácia») decorre, desde logo, da proibição constitucional de "ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações, salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal" (art. 34º, nº. 4, da Constituição) e da garantia constitucional de processo criminal de que "são nulas todas as provas obtidas mediante abusiva intromissão nas telecomunicações" (art. 32º, nº. 8)» (STJ 13Nov03, recurso 1796/03-5)
Porém, as normas relativas a proibições de prova prevalecem sobre as disposições determinantes da «nulidade do acto» por «violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal» (art. 118º.3).
Além de que «todos os requisitos ou condições referidos nos artigos 187º [Admissibilidade da intercepção e gravação de comunicações telefónicas] e 188º [Formalidades das operações] são estabelecidos sob pena de nulidade» (art. 189º).
Daí:
a) que «a nulidade cominada pelo art. 189º do CPP não se confunda (3) com as nulidades dos actos processuais (Livro II, Título V da Parte Primeira do CPP), tendo a ver, antes, com as nulidades da prova (Livro III, Título I) (4): enquanto a nulidade dos actos processuais, depois de declarada (se entretanto não sanada, quando sanável), "tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar" (art. 122º, nº. 1), já a nulidade da prova obsta, radicalmente, à sua utilização (art. 126º, nº. 1)» (STJ 13Nov03, recurso 1796/03-5); e
b) que a nulidade cominada pelo art. 126º, nº. 3, do CPP «não possa ser vista como uma nulidade dos actos processuais nem lhe caiba [directamente] o regime processual dos arts. 118º e ss.; aliás, o próprio art. 118º sublinha expressamente, no seu nº. 3, que «as disposições do presente título [«Nulidades dos actos processuais»] não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova», sendo que, quanto a proibições de prova, a nulidade dos métodos proibidos importa sempre, quanto à sua admissibilidade, a proibição da sua utilização e, quanto ao seu valor, a irrelevância dos métodos proibidos porventura utilizados» (idem).
Ora, «pode acontecer que a obtenção de determinada prova, com abusiva intromissão [...] nas telecomunicações, torne possível a realização de novas diligências probatórias contra o arguido ou contra terceiro, casos em que se põe a questão de saber qual a influência do vício que afecta a prova inicial ou directa na prova secundária ou indirecta, designadamente se este vício provoca uma reacção em cadeia, impedindo a utilização das provas consequenciais» (5).
«É o problema do efeito à distância ou da doutrina do fruit of the poisonous tree, de origem americana. A doutrina germânica e os autores americanos têm divergido nas soluções a dar ao problema. Convergem, no entanto, no sentido da inadmissibilidade [da prova inicial], quer da irrestrita relevância das provas consequenciais, quer da sua total inutilização» (6).
«No sentido da sua relevância apontam critérios como o interesse protegido pela norma jurídica violada, a gravidade da lesão, a inexistência de um nexo causal entre a prova inicial e a prova final (7) e a probabilidade de obtenção da prova secundária, independentemente da violação» (8)-(9).
Mas, «em sentido inverso invoca-se, sobretudo, que a utilização das provas subsequentes permitiria ultrapassar as proibições de prova, pelas instâncias formais de controlo ou por particulares, comprometendo os seus objectivos» (10).
«No que, entre nós, respeita às provas obtidas em consequência da violação da vida privada, do domicílio, da correspondência ou das telecomunicações, a Constituição da República Portuguesa [art. 32º.8] (11), uma vez mais, conformou juridicamente a solução do problema, ao prescrever a nulidade das provas iniciais» (12).
A este respeito, já antes do actual CPP, mas já na vigência de um preceito constitucional (o art. 32º.6) em tudo idêntico ao actual 32º.8 da Constituição, se destacavam - dos demais - os interesses individuais que contendessem directamente com a garantia da dignidade humana (13), donde que «em qualquer ponto do sistema ou da regulamentação processual penal em que estivessem em causa a garantia da dignidade da pessoa [como no caso da «utilização da tortura para obter uma confissão»], nenhuma transacção fosse possível, conferindo-se a um tal garantia predominância absoluta em qualquer conflito com o interesse - também ele legítimo e relevante do ponto de vista do Estado de Direito - no eficaz funcionamento do sistema de justiça penal» (Figueiredo Dias, Para uma nova justiça penal - Para uma reforma global do processo penal português, Almedina, 1983, p. 206 e ss.).
E, aí sim, não se poderia invocar a «necessidade de ponderação dos interesses em conflito e da validade das provas consequenciais» nem recusar-se «a doutrina que os alemães cognominam do Fernwirkung des Beweisverbots e os americanos do fruit of the poisonous tree com o (mau) argumento de que tal se impunha à luz do interesse, de outra forma não realizável, da verdade material e da punição de um real culpado [Rogall]», pois que assim se acabaria por «jogar o valor absoluto da dignidade do homem contra interesses relativos que àquele não deviam nunca sobrepor-se» (idem).
Mas, «perante interesses individuais que não contendessem directamente com a garantia da dignidade da pessoa», já «deveria aceitar-se - diversamente do que sucedia com o primeiro vector - que tais interesses - ainda quando surjam como emanações de direitos fundamentais - pudessem ser limitados em função de interesses conflituantes» (idem).
Surgiria aqui, porém, o problema de «determinar, com precisão, a finalidade e o critério com que a limitação deve ser feita»: «A finalidade só pode ser a de ordenar reciprocamente relações da vida protegidas através da concessão de concretos direitos da liberdade, e de conjugá-las com outras relações também juridicamente protegidas por essenciais à vida comunitária; e de as conjugar em termos de criação e conservação de uma ordem na qual umas e outras ganhem realidade e consistência (14). Quanto ao seu critério, ele não estará na validação do interesse preponderante à custa do interesse de menor hierarquia (...) mas sim numa optimização dos interesses em conflito; o que conduz a submeter a limitação estritamente aos princípios da necessidade e da proporcionalidade, bem como, no caso de se tratar de direitos fundamentais, a exigir que não seja afastado o seu conteúdo essencial» (idem).
«Repensar os numerosos e difíceis problemas que se situam em zonas conflituais» era tarefa que - ao tempo (1983) - haveria de cometer «ao reformador da legislação processual penal» (idem).
E este, no CPP de 1987, distinguiu as «provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas» (art. 126º.1 do CPP) das «provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou na telecomunicações» (nº. 2).
Aquelas - em que os meios de obtenção da prova ofendiam «interesses individuais que contendem directamente com a garantia da dignidade humana» - considerou-as absolutamente nulas. Mas já «admitiu» (art. 125º) as demais - por não contenderem directamente com a garantia da dignidade da pessoa - quando obtidas «com o consentimento do titular» ou, mesmo sem este, nos «casos previstos na lei» (art. 126º.2).
É certo que estas «são igualmente nulas» (também, por isso, «não podendo ser utilizadas») quando, «ressalvados os casos previstos na lei» (15), forem «obtidas sem o consentimento do respectivo titular».
Mas se assim é quanto às provas directamente obtidas por «métodos proibidos» (que «são nulas, não podendo ser utilizadas»), já - «perante interesses individuais que não contendam directamente com a garantia da dignidade da pessoa» - «poderá eventualmente vir a reconhecer-se a admissibilidade de provas consequenciais à violação da proibição de métodos de prova».
Em tal hipótese, a circunscrita invalidação (ou inutilização) da prova (directamente) obtida poderá satisfazer os interesses (de protecção constitucional da privacidade das conversações ou comunicações telefónicas, sem afectação do conteúdo essencial do correspondente preceito constitucional) decorrentes da proibição do art. 126º.3 do CPP.
Pois que a optimização dos interesses em conflito (aqueles, por um lado, e os de «um eficaz funcionamento do sistema de justiça penal», por outro) poderá demandar - ante a (estrita) «necessidade» de protecção «proporcionada» dos últimos (também eles «juridicamente protegidos por essenciais à vida comunitária») - a conjugação (ou «concordância prática») de ambos em termos de «criação e conservação de uma ordem na qual uns e outros ganhem realidade e consistência».
Ora, será justamente no âmbito dos efeitos à distância dos «métodos proibidos de prova» que se poderá dar consistência prática a essa distinção entre os métodos previstos no nº. 1 do art. 126º e os previstos no nº. 3, pois que, enquanto os meios radicalmente proibidos de obtenção de provas (16) inutilizará - expansivamente - as provas por eles directa e indirectamente obtidas, já deverá ser mais limitado - em função dos interesses conflituantes (17) - o efeito à distância da «inutilização» das provas imediatamente obtidas através dos demais meios proibidos de obtenção de provas (ofensivos não do «valor absoluto da dignidade do homem», mas de «interesses individuais não directamente contendentes com a garantia da dignidade da pessoa», como a «intromissão sem consentimento do respectivo titular» na «vida privada», «no domicílio», na «correspondência» ou nas «telecomunicações») (18).
Sobretudo quando, como no caso, a nulidade do meio utilizado (a «escuta telefónica») radique não nos seus «requisitos e condições de admissibilidade» (art. 187º) mas nos «requisitos formais» das correspondentes «operações»:
«Não é por questões de admissibilidade (art. 187º do CPP) que o arguido EM reclama, mas antes por eventuais violações cometidas em termos de formalidades exigidas pelo art. 188º do mesmo diploma (...). É aqui mesmo que se materializa, em nossa opinião, a violação legal das escutas efectuadas: a iniciativa partiu sempre do OPC; não foi o juiz que determinou as transcrições. Estas eram-lhe presentes já realizadas (na maior parte dos casos). O critério da sua selecção não foi judicial. Em relação às desmagnetizações, sucedeu o mesmo (...). A dinâmica do processado revela inequivocamente que toda a iniciativa neste capítulo partiu da Polícia Judiciária».
Pois que, sendo esta modalidade, ainda que igualmente proibida (arts. 126º, 1 e 3, e 189º), menos agressiva do conteúdo essencial da garantia constitucional da inviolabilidade das telecomunicações (art. 34º.4 da Constituição), a optimização e a concordância prática dos interesses em conflito (inviolabilidade das comunicações telefónicas versus «verdade material» e «punição dos culpados mediante sentenciamento criminal em virtude de lei anterior que declare punível a acção») poderá reclamar a limitação - se submetida aos princípios da necessidade e da proporcionalidade (19) - dos «interesses individuais, ainda que emanações de direitos fundamentais, que não contendam directamente com a garantia da dignidade da pessoa».
Com efeito, «es correcto rechazar concepciones globales y buscar la solución para las prohibiciones individuales de producción de prueba separadamente, en un análisis de los distintos intereses comprometidos en el caso y su ponderación. En ello es de fundamental importancia la diferenciación entre prohibiciones de valoración probatoria dependientes (esto es, aquellas que se fundan en la lesión de una prohibición de producción de la prueba) y prohibiciones de valoración probatoria independientes (esto es, aquellas que no se basan en una lesión a la ley, sino que son derivadas directamente de la Constitución)» (20).
Nestas, «la valoración es absolutamente imposible cuando ella lesiona el núcleo esencial intangible de da personalidad y, con ello, la dignidad humana» (p. 203).
Naquelas, já, por exemplo, «los resultados de una vigilancia telefónica (...) son invalorables cuando faltaron los presupuestos materiales para la vigilancia, en especial, la sospecha de la comisión de un de los hechos de la lista (...)» (21), mas, «por el contrario, la inobservancia de los presupuestos formales (...) no provoca una prohibición de valoración» (p. 202).
Também a jurisprudência espanhola - perante uma disposição similar à nossa («el artículo 11º.1 de la Ley Orgánica del Poder Judicial») (22) - distingue entre «la intervención telefónica constitucionalmente nula» (caso em que «se proyecta esa nulidad sobre cualquier prueba directa o indirectamente derivada de dicha intervención») e «la nulidad de la intervención telefónica por vulneración de la legalidad ordinaria» (caso em que «no se produce tan drástico efecto») (23).
«En los casos de ilicitud por contraria a la Constitución, los actos probatorios que traen causa del inicial ilícito quedan contaminados en ilicitud non convalidable por diligencias posteriores; en cambio, los actos irregulares que se desenvuelven en infracciones de legalidad ordinaria sólo originan la ineficacia del acto en sí y de lo que el mismo causalmente se derive, mas sin obstaculizar futuras posibilidades de acreditar los mismos hechos por otros medios, incluso con la posibilidad de sanar mediante otras pruebas en instrucción o en el plenario. Diferenciándose en el caso de intervenciones telefónicas realizadas con defectos, entre causas vulneradoras del artículo 18º.3 CE (por ausencia de mandamiento judicial, exceso respecto a la autorización, tergiversación de los términos en que fue concedida o exceso cronológico no cubierto por la autorización) y las que sólo produjeron infracción de requisitos procedimentales (trascripción no realizada bajo la fe judicial [...])» (24).
E, quanto à doutrina - paralela - do Tribunal Constitucional de Espanha, «lo más destacable en este asunto es que nos recuerda las bases que informan la solución de la problemática en cuestión: tras indicar que se trata de una de las cuestiones más complejas y polémicas en materia de prueba en la actualidad (...), se concluye en la importancia de examinar el conjunto del proceso y de "valorar la relación de causalidad" teniendo en cuenta la gravedad de la violación - para lo que han de analizarse sus elementos, esto es, su magnitud, intensidad, clase de delito, secuencia temporal y descrédito o no que puede suponer para la Administración de Justicia - así como la razonabilidad de la decisión (25) y la calidad del razonamiento empleado para ello» (26).

Só que a valoração dessa «relação de causalidade» (27) caberia - na nossa ordem judiciária - às instâncias (por se tratar de «questão de facto») e não ao tribunal de revista (adstrito às questões «exclusivamente de direito»). E, a esse respeito, a Relação (28) decidiu - definitivamente «de facto» - que «embora alguns meios de prova possam ter vindo aos autos mercê das escutas declaradas nulas (...) não se pode defender que as confissões, depoimentos testemunhais e documentais e demais elementos de prova elencados na decisão recorrida padeçam da vinculação a que alude o art. 122º, nº. 1, do CPP: não existe um nexo de causa-efeito entre as escutas e, por exemplo, os depoimentos dos arguidos, que foram produzidos sem vinculação com elas - no sentido de que as não determinaram na forma, conteúdo ou alcance; e o mesmo se diga quanto aos demais elementos de prova relevados na decisão».
Aliás, já a 1ª instância (com a posterior ratificação da Relação) afirmara, a propósito, que «a procedência desta nulidade (...) não quer significar que por referência aos possíveis efeitos do vício apontado (...) sejamos reconduzidos, sem mais, à anulação da pronúncia e absolvição dos arguidos; tal seria esquecer que existe nos autos um arguido [DL] que desde o momento da sua detenção quis colaborar com as entidades policiais, que se predispôs a ajudá-la nas investigações, que reivindica o estatuto decorrente do art. 31º do DL 15/93, que foi o único que pediu a abertura da instrução (exactamente para ver contemplada essa situação), vindo a manter essa postura, no seu essencial, na contestação e nas declarações que prestou em julgamento; ora, tais declarações, concatenadas com os demais elementos probatórios constantes do processo, são por si só mais do que suficientes para fundamentar um juízo indiciário suficiente dos factos, de molde a justificar a pronúncia (...); são inclusivamente bastantes para fundamentar a decisão final do colectivo relativamente às culpas e às participação dos arguidos nos factos (...), decisão essa para cujo concurso não se mostra minimamente necessário fazer apelo às referidas escutas; com efeito, extirpada a pronúncia das mesmas (...), o universo probatório disponível, ainda assim, é muito significativo para se chegar a um juízo seguro em termos decisórios».

As circunstâncias do crime
«Entre o final do ano de 2000 e o mês de Maio de 2001, os arguidos EM e DC decidiram, com outros indivíduos, um dos quais de nacionalidade venezuelana, introduzir cocaína na Europa (v. g., Espanha), por via aérea, numa mala proveniente da Venezuela com destino ao Funchal, com trânsito pelo aeroporto de Lisboa, local onde seria interceptada e recolhida de forma a não deixar vestígios da operação».
«Ao arguido E competia acompanhar a chegada do produto ao nosso país, e a sua efectiva entrega por parte do arguido D à pessoa ou pessoas que o iriam transportar para o país vizinho, e assegurar algumas funções de coordenação, designadamente transmitindo-lhe os horários e números dos voos e os números de expedição da mala remetida da Venezuela».
«Uma vez acertado o dia para o efeito, o arguido E contactaria o arguido D, que por sua vez forneceria a informação necessária ao arguido D, que, munido dela, se deslocaria ao avião e interceptaria e desviaria no aeroporto de Lisboa a mala em trânsito. Retirada a mala, esta seria entregue ao arguido D, que a entregaria por sua vez à pessoa que para tanto viesse a ser designada».
«Pela sua actuação, receberia o arguido DC 500.000$ por quilo, dividindo essa importância, em partes iguais, com o arguido D».
«Pela sua actuação, o arguido EM receberia, pelo menos, a quantia de 500.000$».
«Veio a ficar estabelecido que uma mala contendo cocaína, chegaria ao aeroporto de Lisboa no dia 02Jul01, no voo 10.335, com o número de expedição 426707. Tal facto foi comunicado ao arguido D e por este ao arguido D a fim de este último a interceptar e recolher».
Porém, «a mala [com 10.034,322 g de cocaína] não foi interceptada», tendo vindo «a ser recuperada pela Polícia Judiciária no Funchal».
«Em face do seu extravio, o arguido E e o arguido D no dia 8 de Julho deslocaram-se a Madrid, a fim de, designadamente, este último se justificar perante os outros intervenientes. Foi dito ao arguido D, de forma intimidatória, que, se a mesma não aparecesse, teria que os compensar, pagando-lhes a quantia de 20.000.000$».
«O arguido EM é casado. Tem 4 filhos, sendo que dois de uma sua anterior relacionamento com ET e outros dois da actual mulher, todos nascidos em Portugal. Antes de detido, desenvolvia actividades como empresário na exportação de bens adquiridos em Portugal para o seu país natal (Cabo Verde). Tem nacionalidade cabo-verdiana. O seu CRC não regista qualquer condenação. Em audiência, admitiu ter sido contratado para "controlar" o arguido D em toda esta operação, a troco de 500 contos, cujos contornos conhecia perfeitamente, e que relatou de forma detalhada. No Estabelecimento Prisional encontra-se colocado como faxina do bar, mantendo comportamento adequado».
«O arguido DC confessou os factos, de que revelou arrependimento, introduzindo como única nota divergente o ter actuado a partir de determinado momento, aquele em que ficou a saber que o conteúdo da mala era cocaína, ameaçado pelo arguido E. Oriundo de uma família da classe média, os pais separaram-se quando contava três anos de idade. Da nova relação entretanto encetada pela mãe, adveio-lhe uma irmã. Frequentou o 12º ano da escolaridade e, com 17 anos de idade, começou a trabalhar em recepção e arquivo numa firma de ensino à distância, a CEAC. Nessa altura vivia com a avó. Em 05Abr99, constituiu a sociedade por quotas "..., Lda.", que, posteriormente, veio a ser convertida em sociedade unipessoal, a que esteve sempre ligado, e de que é o único sócio e gerente. Se no primeiro ano tudo correu economicamente bem, algo aconteceu posteriormente (dívidas e descontrole financeiro). O seu CRC não evidencia qualquer condenação».
«A partir do momento da sua detenção, ajudou a investigação, que qualificou a sua colaboração "como importante para a descoberta da verdade". Já na presença dos inspectores da PJ, o arguido D marcou por via telefónica diversos encontros com o arguido ET em locais que identificou em mapas fornecidos pela PJ com vista à sua captura. Dirigiu-se para os locais combinados na sua companhia, mas tais encontros não se concretizaram por falta de comparência do arguido EM».

Atenuação especial da pena do arguido DL?
Determinado «grupo» (centrado, aparentemente, em Madrid e de que faziam parte - além de outros indivíduos, um dos quais de nacionalidade venezuelana - os arguidos EM e DC) planeou a importação de cocaína entre a Venezuela e Espanha. Uma mala com cerca de 10 kg de cocaína seria exportada da Venezuela para a Europa num voo destinado ao Funchal mas com trânsito por Lisboa. Seria aqui - e só aqui - que interviriam os arguidos, interceptando a mala no aeroporto e «recolhendo-a de forma a não deixar vestígios da operação». O arguido E (mediante a «gratificação» de, pelo menos, «500.000$») seria - mandatado pelo «grupo» - o «encarregado» da «operação Lisboa», competindo-lhe «acompanhar a chegada do produto ao nosso país, coordenar as operações locais (transmitindo ao co-arguido Do horário e o número do voo e o número de expedição da mala remetida da Venezuela) e assegurar a sua efectiva entrega à pessoa encarregue de o transportar para o país vizinho». Aos arguidos D e D caberia - contra um «prémio» de 500.000$ por quilo a dividir pelos dois em partes iguais - a intercepção e o descaminho no aeroporto de Lisboa da mala em trânsito e a sua posterior entrega «à pessoa que para tanto viesse a ser designada».
«Por motivos que não foi possível apurar», os arguidos D e D não lograram interceptar a mala no aeroporto de Lisboa. E daí que ela tenha seguido viagem até ao seu destino (o Funchal), onde, dada como abandonada, acabou nas mãos da Polícia Judiciária, que a apreendeu.
Entretanto, o desaparecimento da mala levou a chefia do grupo a convocar os arguidos E e D a Madrid, onde este, não tendo conseguido «justificar-se» perante os «demais intervenientes», foi intim[id]ado a pagar-lhes, em jeito de compensação (caso a mala não viesse a aparecer), a quantia de 20.000.000$».
Só que por essa altura a PJ, estabelecendo uma qualquer ligação entre a mala «abandonada» e o arguido D (29), acabou por detê-lo e este, «a partir do momento da sua detenção, ajudou a investigação da PJ (que qualificou a sua colaboração "como importante para a descoberta da verdade"): «confessou os factos», identificou o co-arguido e, na presença dos inspectores da PJ, marcou por via telefónica diversos encontros (30) com o arguido ET, com vista à sua captura, em locais que identificou em mapas fornecidos pela PJ.
Não se poderá negar, por isso, que o arguido DL, ao confessar a sua «conexão» com a mala da droga, ao revelar a sua intervenção nos factos (e, bem assim, as dos seus co-arguidos), ao identificar os co-arguidos (ou, pelo menos, ao confirmar - e particularizar - a comparticipação dos outros suspeitos) e ao colaborar em diligências (embora frustradas) tendentes à sua captura, «auxiliou concretamente as autoridades na recolha de provas decisivas (31) para a identificação ou a captura de outros responsáveis, particularmente tratando-se de grupos» (art. 31º do dec. lei 15/93).
Daí que à sua comparticipação no crime corresponda, por atenuação especial, a pena de 0,8 a 8 anos de prisão (art. 73º.1 CP).
Por um lado, as exigências (art. 40º.1 do CP) de «reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida» (32) - na consideração, além do mais, de que o arguido, integrando um «grupo» com ramificações internacionais, «colaborou» (ainda que no desempenho de um papel relativamente menor) na importação de 10 kg de cocaína (que, porém, não chegou - por oportuna intervenção das autoridades - ao «consumidor») - apontam para uma «moldura de prevenção» - não contrariada pelo «princípio da culpa» (33) - de 5 a 6 anos de prisão (no quadro de uma pena abstracta de 0,8 a 8 anos de prisão).
Neste espaço - de incidência da «ideia de prevenção especial positiva ou de socialização» - é que haverá que individualizar/concretizar a pena, tendo em conta, designadamente, que o arguido não tem antecedentes criminais, está preso desde 16Jul01, confessou os factos, de que revelou arrependimento (se bem que - contra a verdade - tenha invocado «ter actuado a partir de determinado momento, aquele em que teria ficado a saber que o conteúdo da mala era cocaína, ameaçado pelo arguido E»).
Tudo conjugado (designadamente o seu condicionamento social, cultural e económico: «oriundo de uma família da classe média, os pais separaram-se quando contava apenas três anos de idade; frequentou o 12º ano da escolaridade e, com 17 anos de idade, altura em que vivia com a avó, começou a trabalhar na recepção/arquivo de uma empresa de ensino à distância; em 05Abr99, constituiu a sociedade por quotas "..., Lda.", que, posteriormente, veio a ser convertida em sociedade unipessoal, a que esteve sempre ligado, e de que é o único sócio e gerente, e, se no primeiro ano tudo correu economicamente bem, sobrevieram-lhe depois dívidas e descontrole financeiro»), justificar-se-á a redução da pena até ao mínimo (5 anos de prisão) daquela «moldura de prevenção».

Atenuação da pena do arguido EM?
No caso do arguido EM - que no «bando» (a cuja «sede» em Madrid se deslocaria frequentemente) (34) ocupava um lugar hierarquicamente superior ao do co-arguido DL e que (por não ter o suficiente para a merecer) não beneficiará da «atenuação especial» devida ao seu co-arguido «arrependido» -, as exigências de «reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida» - na consideração, além do mais, de que o arguido, integrando um «grupo» com ramificações internacionais, «colaborou» (no desempenho de um papel intermédio) na importação de 10 kg de cocaína (que, porém, não chegou - por oportuna intervenção das autoridades - ao «consumidor») - apontam para uma «moldura de prevenção» - não contrariada pelo «princípio da culpa» (35) - de 7 a 9 anos de prisão (no quadro de uma pena abstracta de 4 a 12 anos de prisão).
Nesta (sub)moldura de prevenção é que há-de incidir a «ideia de prevenção especial positiva ou de socialização» e que individualizar/concretizar a pena.
Ora, justificar-se-á a redução da sua pena a 7 (sete) anos de prisão, tendo em conta que (a) o arguido não tem antecedentes criminais, (b) é estrangeiro mas está radicado em Portugal (onde tem a companheira e os seus quatro filhos e onde - antes de preso, em 18Jul01 - se dedicava à exportação de mercadorias para Cabo Verde), (c) admitiu em audiência (36) ter sido contratado, a troco de 500 contos, para "controlar" o co-arguido D em toda esta operação, cujos contornos conhecia perfeitamente e que relatou de forma detalhada, e (d) no Estabelecimento Prisional «mantém comportamento adequado», encontrando-se colocado, no bar, como «faxina».

Conclusões
A nulidade cominada pelo art. 189º do CPP não se confunde com as nulidades dos actos processuais (Livro II, Título V da Parte Primeira do CPP), tendo a ver, antes, com as nulidades da prova (Livro III, Título I).
Enquanto a nulidade dos actos processuais, depois de declarada (se entretanto não sanada, quando sanável), "tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar" (art. 122º, nº. 1), já a nulidade da prova obsta, radicalmente, à sua utilização (art. 126º, nº. 1).
A nulidade cominada pelo art. 126º, nº. 3, do CPP «não pode ser vista como uma nulidade dos actos processuais nem lhe cabe [directamente] o regime processual dos arts. 118º e ss.; aliás, o próprio art. 118º sublinha expressamente, no seu nº. 3, que «as disposições do presente título [«Nulidades dos actos processuais»] não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova», sendo que, quanto a proibições de prova, a nulidade dos métodos proibidos importa sempre, quanto à sua admissibilidade, a proibição da sua utilização e, quanto ao seu valor, a irrelevância dos métodos proibidos porventura utilizados.
«Pode acontecer que a obtenção de determinada prova, com abusiva intromissão [...] nas telecomunicações, torne possível a realização de novas diligências probatórias contra o arguido ou contra terceiro, casos em que se põe a questão de saber qual a influência do vício que afecta a prova inicial ou directa na prova secundária ou indirecta, designadamente se este vício provoca uma reacção em cadeia, impedindo a utilização das provas consequenciais».
«No sentido da sua relevância apontam critérios como o interesse protegido pela norma jurídica violada, a gravidade da lesão, a inexistência de um nexo causal entre a prova inicial e a prova final e a probabilidade de obtenção da prova secundária, independentemente da violação». Mas, «em sentido inverso invoca-se, sobretudo, que a utilização das provas subsequentes permitiria ultrapassar as proibições de prova, pelas instâncias formais de controlo ou por particulares, comprometendo os seus objectivos».
A este respeito, já antes do actual CPP, mas já na vigência de um preceito constitucional (o art. 32º.6) em tudo idêntico ao actual 32º.8, se destacavam - dos demais - os interesses individuais que contendessem directamente com a garantia da dignidade humana, donde que «em qualquer ponto do sistema ou da regulamentação processual penal em que estivessem em causa a garantia da dignidade da pessoa [como no caso da «utilização da tortura para obter uma confissão»], nenhuma transacção fosse possível, conferindo-se a um tal garantia predominância absoluta em qualquer conflito com o interesse - também ele legítimo e relevante do ponto de vista do Estado de Direito - no eficaz funcionamento do sistema de justiça penal».
E, aí sim, não se poderia invocar a «necessidade de ponderação dos interesses em conflito e da validade das provas consequenciais» nem recusar-se «a doutrina do Fernwirkung des Beweisverbots [fruit of the poisonous tree] com o (mau) argumento de que tal se impunha à luz do interesse, de outra forma não realizável, da verdade material e da punição de um real culpado», pois que assim se acabaria por «jogar o valor absoluto da dignidade do homem contra interesses relativos que àquele não deviam nunca sobrepor-se».
Mas, «perante interesses individuais que não contendessem directamente com a garantia da dignidade da pessoa», já «deveria aceitar-se - diversamente do que sucedia com o primeiro vector - que tais interesses - ainda quando surjam como emanações de direitos fundamentais - pudessem ser limitados em função de interesses conflituantes».
Surgiria aqui o problema de «determinar, com precisão, a finalidade e o critério com que a limitação deve ser feita»: «A finalidade só pode ser a de ordenar reciprocamente relações da vida protegidas através da concessão de concretos direitos da liberdade, e de conjugá-las com outras relações também juridicamente protegidas por essenciais à vida comunitária; e de as conjugar em termos de criação e conservação de uma ordem na qual umas e outras ganhem realidade e consistência. Quanto ao seu critério, ele não estará na validação do interesse preponderante à custa do interesse de menor hierarquia (...) mas sim numa optimização dos interesses em conflito; o que conduz a submeter a limitação estritamente aos princípios da necessidade e da proporcionalidade, bem como, no caso de se tratar de direitos fundamentais, a exigir que não seja afastado o seu conteúdo essencial» (idem).
«Repensar os numerosos e difíceis problemas que se situam em zonas conflituais» era tarefa que - ao tempo (1983) - haveria de cometer «ao reformador da legislação processual penal». E este, no CPP de 1987, distinguiu as «provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas» (art. 126º.1 do CPP) das «provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou na telecomunicações» (nº. 2): aquelas - em que os meios de obtenção da prova ofendiam «interesses individuais que contendem directamente com a garantia da dignidade humana» - considerou-as absolutamente nulas; mas já «admitiu» (art. 125º) as demais - por não contenderem directamente com a garantia da dignidade da pessoa - quando obtidas «com o consentimento do titular» ou, mesmo sem este, nos «casos previstos na lei» (art. 126º.2).
É certo que estas «são igualmente nulas» (também, por isso, «não podendo ser utilizadas») quando, «ressalvados os casos previstos na lei», forem «obtidas sem o consentimento do respectivo titular». Mas se assim é quanto às provas directamente obtidas por «métodos proibidos» (que «são nulas, não podendo ser utilizadas»), já - «perante interesses individuais que não contendam directamente com a garantia da dignidade da pessoa» - «poderá eventualmente vir a reconhecer-se a admissibilidade de provas consequenciais à violação da proibição de métodos de prova».
E, em tal hipótese, a circunscrita invalidação (ou inutilização) da prova (directamente) obtida poderá satisfazer os interesses (de protecção constitucional da privacidade das conversações ou comunicações telefónicas, sem afectação do conteúdo essencial do correspondente preceito constitucional) decorrentes da proibição do art. 126º.3 do CPP.
Pois que a optimização dos interesses em conflito (aqueles, por um lado, e os de «um eficaz funcionamento do sistema de justiça penal», por outro) poderá demandar - ante a (estrita) «necessidade» de protecção «proporcionada» dos últimos (também eles «juridicamente protegidos por essenciais à vida comunitária») - a conjugação (ou «concordância prática») de ambos em termos de «criação e conservação de uma ordem na qual uns e outros ganhem realidade e consistência».
Ora, será justamente no âmbito dos efeitos à distância dos «métodos proibidos de prova» que se poderá dar consistência prática a essa distinção entre os métodos previstos no nº. 1 do art. 126º e os previstos no nº. 3, pois que, enquanto os meios radicalmente proibidos de obtenção de provas inutilizará - expansivamente - as provas por eles directa e indirectamente obtidas, já deverá ser mais limitado - em função dos interesses conflituantes - o efeito à distância da «inutilização» das provas imediatamente obtidas através dos demais meios proibidos de obtenção de provas (ofensivos não do «valor absoluto da dignidade do homem», mas de «interesses individuais não directamente contendentes com a garantia da dignidade da pessoa», como a «intromissão sem consentimento do respectivo titular» na «vida privada», «no domicílio», na «correspondência» ou nas «telecomunicações»).
Sobretudo quando, como no caso, a nulidade do meio utilizado (a «escuta telefónica») radique não nos seus «requisitos e condições de admissibilidade» (art. 187º) mas nos «requisitos formais» das correspondentes «operações». Pois que, sendo esta modalidade, ainda que igualmente proibida (arts. 126º.1 e 3 e 189º), menos agressiva do conteúdo essencial da garantia constitucional da inviolabilidade das telecomunicações (art. 34º.4 da Constituição), a optimização e a concordância prática dos interesses em conflito (inviolabilidade das comunicações telefónicas versus «verdade material» e «punição dos culpados mediante sentenciamento criminal em virtude de lei anterior que declare punível a acção») poderá reclamar a limitação - se submetida aos princípios da necessidade e da proporcionalidade - dos «interesses individuais, ainda que emanações de direitos fundamentais, que não contendam directamente com a garantia da dignidade da pessoa».

3. Termos em que, tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em audiência para apreciar os recursos opostos pelos cidadãos EJTM e DLC ao acórdão da Relação de Lisboa que, em 19Nov03, confirmou a sua condenação, por tráfico comum de drogas ilícitas, nas penas, respectivamente, de 7 anos e 10 meses de prisão e de 6 anos e 9 meses de prisão, julga-os parcialmente procedentes e, conformidade:
a) reduz a 7 (sete) anos de prisão a pena aplicada ao cidadão EJTM;
b) e, por atenuação especial (arts. 31º do dec. lei 15/93, e 73º do CP), reduz a 5 (cinco) anos de prisão a pena aplicada ao cidadão DLC,
c) e, finalmente, condena cada um dos arguidos/recorrentes nas custas do respectivo recurso, com 7 (sete) UC de taxa de justiça (individual) e 2 (duas) UC de procuradoria (individual).

Lisboa, 6 de Maio de 2004
Pereira Madeira
Santos Carvalho
Costa Mortágua
Rodrigues da Costa
________________
(1) C/ parecer de 03Jan04 do Prof. Doutor Costa Andrade (fls. 2346-2376).
(2) Anote-se aqui, por uma elementar questão de justiça que os fundamentos da exposição que seguem constituem a reprodução praticamente inalterada quanto ao fundo do laborioso memorandum deixado pelo Exmo. Conselheiro Carmona da Mota, primitivo relator deste processo, (de quem o actual era 1º adjunto), e a cujo labor se deve, pois, o resultado da aturada pesquisa que o texto documenta, e que uma infausta circunstância pessoal impediu de levar a efeito o julgamento por si já então mandado agendar.
(3) «Embora as proibições de prova sejam entre nós uma figura, de certo modo, paralela à das nulidades, o facto é que não se confundem» (João Conde C, RMP 79).
(4) «O art. 189º dispõe que todos os requisitos e condições referidos nos artigos 187º e 188º são estabelecidos sob pena de nulidade. Importa esclarecer que tipo de sanção comina o art. 189º (...). Cremos tratar-se de proibição de prova. Como já referimos, o art. 126º, nº. 3, dispõe que, ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas as provas obtidas mediante intromissão nas telecomunicações e a nulidade tem como efeito não poder a prova ser utilizada (art. 126º, nº. 1). Dispondo a lei que as condições de admissibilidade e os requisitos das escutas são estabelecidos sob pena de nulidade, deve entender-se que a sua inobservância acarreta a proibição de prova, imposta pelo art. 32º, nº. 6 [hoje, 8], da CRP e art. 126º [do Código de Processo Penal: «são nulas, não podendo ser utilizadas, as provas (...)»]» (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, Verbo, 1999, nº. 160.6).
(5) João Conde C, RMP 79.
(6) Idem.
(7) A chamada limitação da fonte independente (independent source limitation).
(8) A chamada limitação da descoberta inevitável (inevitable discovery limitation).
(9) Idem.
(10) Idem.
(11) «São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações».
(12) O que, para o autor, teria como consequência «a invalidade daquele acto e dos que dele dependerem e aquela puder afectar (art. 122º, nº. 1, do C.P.P.), (...) pois estamos perante direitos ou interesses individuais, cuja violação contende com a dignidade da pessoa. (...) Com efeito, o art. 32º, nº. 8, da C.R.P. não faz qualquer distinção entre as provas previstas na primeira parte e as provas previstas na segunda parte, sendo o desvalor idêntico em ambos os casos. Acresce, que o art. 126º, nº. 3, do Código de Processo Penal, ao estabelecer que são igualmente nulas as provas aí previstas, remete para o nº. 1, onde prevê que as provas não podem ser, pura e simplesmente, utilizadas. (...) Finalmente, porque estamos perante proibições de prova destinadas a evitar os atentados mais gravosos quer à dignidade pessoal, quer aos valores que num Estado de Direito lhe andam directamente associados».
(13) «Princípio axiológico que preside à ordem jurídico de um Estado de Direito material: o princípio da dignidade do homem, da sua intocabilidade e da consequente obrigação, para todo o poder oficial, de o respeitar e de a proteger».
(14) «Com razão fala K. Hesse, a análogo propósito, da tarefa de construção de uma concordância prática de valores conflituantes».
(15) Pois que a própria Constituição ressalva, da inviolabilidade do domicílio e da correspondência (art. 34º.1), a «entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei» (nº. 2) e, da «proibição de ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas telecomunicações», os «casos previstos na lei em matéria de processo criminal» (nº. 4).
(16) A «tortura», a «coacção» e, de um modo geral, a «ofensa à integridade física ou moral das pessoas», todos eles ofensivos do «valor absoluto da dignidade do homem».
(17) Cuja pujança poderá purgar o «pecado original» (purged taint limitation).
(18) «Se debe seguir diferenciando en qué casos una valoración no interviene en los ámbitos más íntimos de la personalidad, sino sólo en la simple esfera privada y, con ello, en el derecho general de la personalidad» (Claus Roxin, Derecho procesal penal, traducción de la 25ª edición alemana, Editores de Puerto, Buenos Aires, 2000, p. 204).
(19) «Se pondera, con razón, entre los intereses de la persecución penal y la protección de la personalidad del imputado, de modo tal que, si se trata de delitos muy graves, la valoración es admisible» (Claus Roxin, ob. cit., p. 204). «Ya no pude hablarse de dualidad de intereses en el proceso penal, pues tanto la obligación de averiguar la verdad como su eventual limitación, emanan del Estado de Derecho y suponen una coincidencia de intereses, pudiendo admitirse "por vía de excepción" una prueba que aun de modo reflejo se haya obtenido de modo inconstitucional, es decir, con violación de un derecho fundamental sustantivo siempre que concurran elementos ponderables por el juzgador, del tipo: escasa entidad de la violación, secuencia temporal dilatada entre la prueba ilícita y las restantes, delito grave, actuación de buena fe en las autoridades que han cometido la violación, flagrancia, etc.» (López Ortega, Prueba y proceso penal, pgs. 123/144, Revista de Derecho Procesal, Aranzadi, I-1999, apud Eduardo de Urbano Castrillo y otro, La prueba ilícita penal, Thomson/Aranzadi, 2003, p. 55).
(20) Claus Roxin, ob. cit., p. 194.
(21) «Sin embargo, debe ser considerado restrictivamente, en ese contexto, que (...), para la apreciación de los presupuestos materiales, a quien le compete ordenar le corresponde un margen discrecional, de modo tal que una prohibición de valoración sólo existe en caso de arbitrariedad o de grosera apreciación errónea (...)» (Claus Roxin, ob. e loc. cits.).
(22) «En todo tipo de procedimientos no surtirán efecto las pruebas obtenidas, directa o indirectamente, violentando los derechos o libertades fundamentales».
(23) Cfr. «la Sentencia del Tribunal Supremo 974/1997, de 4 de julio» (apud Carlos Climent Durán, La Prueba Penal, tirant lo blanch, Valencia, 1999).
(24) Tribunal Supremo, la Sentencia 23 junio 1999, RJ 1999, 5848 (apud Eduardo de Urbano Castrillo y otro, La prueba ilícita penal, Thomson/Aranzadi, 2003, p. 50).
(25) «Son los órganos de la jurisdicción ordinaria los competentes para valorar la cuestión conforme al criterio que se fijen en el caso concreto, correspondiéndole al Tribunal Constitucional, exclusivamente, "la comprobación de la razonabilidad del mismo"».
(26) Eduardo de Urbano Castrillo y otro, ob. cit., p. 55.
(27) Ou «nexo de antijuridicidade»: «En resumidas cuentas, existe "conexión de antijuridicidad" cuando se da una relación entre el medio de prueba ilícito y el reflejo, lo suficientemente fuerte que permita estimar que la ilicitud originaria de la primera trasciende a la segunda hasta el punto de provocar su sanción invalidante. Siendo un "juicio de experiencia el que permitirá, en cada caso, decidir la admisibilidad de la prueba derivada si lo probable es que el resultado probatorio de cargo ha logrado se hubiera alcanzado se uno de los elementos probatorios tenido en cuenta - el declarado ilícito - hubiera faltado» (Eduardo de Urbano Castrillo y otro, ob. cit., p. 40).
(28) «A nossa discordância face ao acórdão recorrido nada tem a ver com a doutrina sustentada pela Relação de Lisboa, apenas contendendo com a sua aplicação ao caso vertente. Não cremos, com efeito, que possa suscitar reserva fundada a asserção de que "a invalidade só afecta os actos que dependem da nulidade (são consequência directa e necessária desta) e na medida em que por esta são afectadas. Esta a leitura do art. 122º.1 do CPP que nos parece ser de acolher". Bem vistas as coisas, um enunciado que, de forma sintética e lograda, dá expressão à doutrina do efeito à distância por que, com a melhor doutrina, temos vindo a propugnar. Afigura-se-nos, por isso, um enunciado de inquestionável pertinência e acerto. Já não pode acompanhar-se o acórdão recorrido na parte em que exclui o caso vertente do âmbito daquele enunciado. Isto é, na parte em que sustenta: "no caso dos autos, não se pode defender que as confissões, depoimentos testemunhais e documentais e demais elementos de prova elencados na decisão recorrida padeçam da dita vinculação a que alude o art. 122º, nº. 1, do CPP. Não existe um nexo de causa-efeito entre as escutas e, por exemplo, o depoimento dos arguidos que foram produzidas sem vinculação". Esta é uma conclusão que um observador atento mas distanciado não pode acompanhar. Por ser manifesto que os factos em exame configuram em toda linha uma manifestação paradigmática do nexo de causalidade e de imputação pressuposto e prescrito pela lei. Isto à vista da certeza de que sem as escutas ilegais nenhuma daquelas provas secundárias chegaria ao processo. Pelo menos na certeza de que não se descortina qualquer via alternativa e lícita - v. g., uma denúncia anónima, outras diligências independentes e não envenenadas pelas escutas, etc. - que pudesse fazer chegar aquelas provas ao processo. E sem elas, mais sem a demonstração de que elas existiram, não pode considerar-se interrompido o nexo causal com as escutas telefónicas. Nem afastado o efeito-à-distância. Cabendo ainda precisar que, na linha do imperativo constitucional in dubio pro reo, também aqui há-de valorar-se pro toda a dúvida subsistente quanto à existência ou não das vias alternativas de descoberta ou produção dos meios secundários de prova» (Manuel da Costa Andrade, Parecer - anexo de fls. 2346/2376 - de 3Jan04).
(29) Mercê, porventura, de denúncia do arguido D, cujos movimentos suspeitos no aeroporto não terão passado despercebidos.
(30) «Encontros que, porém, não se chegaram a concretizar por falta de comparência do arguido EM».
(31) E ainda mais «decisivas» desde que - retroactivamente - invalidadas as «escutas telefónicas» de que a PJ se terá servido no início das investigações.
(32) «Só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido à suas reacções específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação de delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida» (Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, § 55).
(33) «Em caso algum pode haver pena sem culpa ou a medida da pena ultrapassar a medida da culpa» (princípio da culpa), «princípio que não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer concepção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização» (ob. cit., § 56).
(34) Até onde viajou, no ano de 2001, pelo menos em 24 de Março, 26 de Março, 11 de Maio, 25 de Maio,13 de Junho e 8 de Julho.
(35) «Na busca realizada à sua residência, foram-lhe encontrados 11 telemóveis, 50.000$, 1.500 florins, 20.000 pesetas, 11 cartões de acesso a telemóveis e 1 pistola de calibre 45».
(36) E por isso já na pendência do recurso por ele interposto do despacho que, no termo da instrução, lhe indeferira a sua arguida nulidade das escutas.