domingo, abril 30, 2006

LER OS OUTROS

Vital Moreira, no causa nossa, qualifica de insuficiente a medida anunciada de impor um tecto às pensões mais elevadas:

    “No programa de reforma da segurança social -- com medidas consistentes e imperiosas -- há uma que bem podia ser mais ousada. Refiro-me à que prevê o estabelecimento de um máximo para o montante das pensões (com referência a um valor ainda por determinar), mas cujo efeito consiste apenas em "congelar" desde agora no seu actual valor as que excederem aquele limite. O que quer dizer que vão continuar a ser atribuídas pensões de valor superior a 5000 euros, mesmo quando, como sucede em geral, o esforço contributivo dos beneficiários ao longo da sua vida activa não as justifica de modo algum.”

LER OS OUTROS

Paulo Gorjão escreve, no Bloguítica, um post intitulado O RETRATO DO PORTUGUÊS, no qual chama a atenção para uma declaração do ministro da Agricultura:

    “Uma inspecção feita aos beneficiários da electricidade verde -- que implica uma comparticipação de 40 por cento da factura de energia, quando esta se destina a actividades agrícolas -- detectou uma taxa de 45 por cento de irregularidades (…)”

sexta-feira, abril 28, 2006

Sugestão de leitura – “The Wall Street Journal” arrasa a administração do BCP

“The Wall Street Journal”, um dos jornais financeiros mais conceituados do mundo, diz que os administradores do BCP estão a “encher os bolsos” à custa dos accionistas. Segundo o mesmo órgão, cada administrador vai ganhar mais 6 milhões com a compra do BPI, acrescentando que o banco usou alguns dos aumentos de capital para fazer “investimentos desastrosos”.

A notícia completa está aqui.

quinta-feira, abril 27, 2006

Memo

É bom não esquecer que há magistrados nos órgãos da Liga de Futebol Profissional e na Federação Portuguesa de Futebol. E que alguns são convidados frequentes das comitivas de alguns clubes, quando estes se deslocam ao estrangeiro para disputar jogos para as competições europeias.

Apito dourado: no Porto, sê portista

Sem que se perceba porquê, sendo os factos os mesmos, como é que se pode alterar em tão grande medida a qualificação jurídica dos factos?

O Ministério Público não deve uma explicação?

quarta-feira, abril 26, 2006

Aposentados de Maio

A Caixa Geral de Aposentações já tornou pública a relação das pensões de reforma de Maio de 2006. Seleccionámos, como fizemos nos meses anteriores, as de montante superior a 4.000 €. Como se sabe, relativamente aos magistrados, há que acrescer à pensão o subsídio de habitação compensação, no valor de 700 €, que eles continuam a receber após o abandono do serviço activo.

Esta lista apresenta um pormenor interessante: não é encabeçada por um magistrado, mas por um especialista de pessoal dos CTT [6463.40 €]. Por menos de 15 euros, bate sobre a meta um juiz conselheiro [5748.46+700 €].

Eis a lista de aposentados de Maio de 2006:

    Estado-Maior do Exército
    • 4558.83 € — Professor Catedrático — Academia Militar

    Estado-Maior da Força Aérea
    • 4193.49 € — Tenente-General

    Ministério da Justiça
    • 4782.42 € — Procurador-Adjunto — Procuradoria Geral República
    • 5748.46 € — Juiz Conselheiro — Conselho Superior Magistratura
    • 4184.62 € — Procurador-Adjunto — Procuradoria Geral República


    Ministério da Saúde
    • 4155.47 € — Assistente Hosp. Grad. Pediatria — Centro Hospitalar do Alto Minho, E.P.E.
    • 4422.50 € — Assistente Grad. Neonatologia — Centro Hospitalar Coimbra
    • 4810.14 € — Chefe Serviço Pediatria — Centro Hospitalar Vila Nova Gaia
    • 4183.44 € — Assistente Graduado — Hospital Arcebispo João Crisóstomo
    • 4813.83 € — Chefe Serviço Hospitalar — Hospital Dr José Maria Grande
    • 4214.92 € — Assistente Graduado — Centro Hosp Lisboa Ocidental, E. P. E.
    • 4812.35 € — Chefe Serviço Cardiologia — Hospital N Sra Rosário, E.P.E.
    • 4211.55 € — Assistente Grad. Oftalmologia — Hospital N Sra Rosário, E.P.E.
    • 4055.69 € — Director Serviço — Inst Português Sangue
    • 4183.44 € — Assistente Graduado — Hospital Distrital Lamego
    • 4835.79 € — Chefe Serviço — Centro Hospitalar Caldas Rainha
    • 4446.40 € — Chefe Serviço Obstetrícia — Maternidade Júlio Dinis
    • 4622.80 € — Chefe Serviço — Centro Hospitalar Coimbra
    • 4223.26 € — Assistente Grad. Clínica Geral — Adm Reg Saúde Lx Vale Tejo
    • 4519.65 € — Chefe Serviço — Hospital São João, E.P.E.
    • 4781.08 € — Chefe Serviço Hospitalar — Maternidade Dr Alfredo Costa
    • 4064.02 € — Assistente Grad. Anestesiologia Ctro Hosp Lisboa Ocidental, E. P. E.
    • 4661.56 € — Chefe Serviço Medicina Interna — Ctro Hosp Lx Ocid, E. P. E.
    • 4024.47 € — Assistente Hospitalar Graduada — Hospital Santa Maria, E.P.E.

    Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
    • 4973.27 € — Vice-Reitor — Universidade Lisboa
    • 4144.16 € — Professor Catedrático — Universidade Aveiro
    • 4282.54 € — Professor Catedrático — Universidade Atlântica

    Empresas Públicas e Sociedades Anónimas
    • 4225.07 € — Assessor Conselho Adm — Ana Aeroportos Portugal SA
    • 4829.92 € — Contr. Traf. Aéreo/Assessor Sénior — Nav Aérea Portugal Nav Portugal EPE
    • 6463.40 € — Especialista de Pessoal R — CTT Correios Portugal SA
    • 4829.92 € — Controlador Tráfego Aéreo — Nav Aérea Portugal EPE

segunda-feira, abril 24, 2006

Magistratura abre-se à sociedade civil


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Mais de cem pessoas juntaram-se, segundo o DN de ontem, na reabertura do Ourigo (na Foz). Para a posteridade fica uma modelo das passerelles jubilada (Marisa Cruz), um jogador da bola (João Pinto), uma juíza de direito (Paula Paz Dias) e um empresário da noite (Mário Ferreira), por sinal o proprietário do estabelecimento. O DN dá ainda conta de que Mário Ferreira será o primeiro português a passar férias no espaço. Deduz-se que sem companhia.

Aos visitantes

1. O Blogger dedicou uma boa parte do dia a fazer manutenção deste vosso blogue. Não conseguimos colocar posts.

2. Uma inesperada sobrecarga de trabalho não nos tem permitido dar resposta a muitos mails recebidos. Vamos tentar recuperar o serviço em atraso.

domingo, abril 23, 2006

Operação Furacão




A conversa fica para amanhã.

sexta-feira, abril 21, 2006

Primavera-Verão



Lemos as 103 páginas do Boletim Económico - Primavera 2006 e há que reconhecer que o Banco de Portugal sabe do que fala quando nos informa de que “[a]s medidas de consolidação orçamental adoptadas desde 2002 não conseguiram inverter a trajectória de rápido crescimento da despesa (…)” [p. 24].

É que o banco central tem uma comissão de vencimentos, que está incumbida de rever em baixa — segundo as expectativas dos analistas mais optimistas — as remunerações dos membros do seu conselho de administração. Tal comissão é presidida por Miguel Beleza, que só lá mais para o Verão pensa entregar “o trabalho ao Governo”, antes de partir para férias.

Aparententemente, o Banco de Portugal desconhece a existência da Resolução do Conselho de Ministros n.º 155/2005, de 6 de Outubro, que estabelece, no ponto 14, que, “(…) no prazo de 30 dias a contar da data da entrada em vigor da presente resolução, os órgãos de direcção, as comissões de vencimentos e os órgãos ou grupos de trabalho similares existentes no âmbito das entidades sujeitas à presente resolução devem informar o Governo, através do Ministro de Estado e das Finanças, das medidas a adoptar com vista ao efectivo cumprimento das disposições da presente resolução.”

Inverter a trajectória de rápido crescimento da despesa é, na verdade, uma tarefa ciclópica.

[Se o leitor quiser refrescar a memória, faça o favor de dar um pulinho até aqui.]

Stock options

António Carrapatoso tem um saber de experiência feito. Devemos ouvi-lo com atenção quando sugere que há que responsabilizar “cada cidadão”:

quinta-feira, abril 20, 2006

O papel da violência na História

"Uma bofetada a quente não se pode considerar excessiva."

Sugestão de leitura




Estávamos à espera que José Pacheco Pereira (JPP) colocasse no Abrupto o artigo que escreveu para o Público, intitulado A fauna das caixas dos comentários.

Referindo-se ao artigo, Rui Albuquerque considera: “Mais do que um artigo, o texto de JPP eleva o «comentador» (mais ou menos) anónimo à categoria de objecto de estudo científico, a um novo capítulo da sociologia e da psicologia individual e de grupo, quem sabe, mesmo até a um novo ramo da ciência. Um blog sem comentários não existe. Um blog sem caixa de comentários é um paradoxo. Um importante acontecimento, portanto, e um autêntico marco na história da blogosfera lusa, em conclusão.” E Rui Albuquerque propõe “que o dia 20 de Abril seja doravante consagrado como o «Dia da Blogosfera Portuguesa», ou o «Dia do Comentador (mais ou menos) Anónimo»”.

Não tendo ainda JPP disponibilizado o artigo no Abrupto, transcrevemos parte no CC (e a sua versão integral na… caixa de comentários):

    “O comportamento destas pessoas-em-linha é compulsivo, eles “habitam” nas caixas de comentários que são a sua casa. Deslocam-se de caixa para caixa de comentário, deixando centenas de frases, nos sítios mais díspares, revelando nalguns casos uma disponibilidade quase total para comentar, contracomentar, atacar, responder, mantendo séries enormes que obedecem à regra de muitos frequentadores desta área da Rede: horário laboral na maioria dos casos, quebra no fim-de-semana e nos feriados. São pessoas que estão a escrever do seu local de trabalho ou de estudo, de empresas ou de escolas, onde têm acesso à Internet. Há, no entanto, alguns casos de comentadores caseiros e noctívagos, que só podem estar a escrever noite dentro, como era o caso nos primeiros anos da blogosfera portuguesa, antes de se democratizar. É um fenómeno aparentado com muitas outras experiências comunitárias na Rede, mas está longe de ser o mundo adolescente dos frequentadores do MySpace (http://www.myspace.com/) ou dos “salas” de conversa virtual.

    No caso português, os comentadores não parecem ser muitos, embora a profusão de pseudónimos e nick names dê uma imagem de multiplicidade. São, na sua esmagadora maioria, anónimos, mas o sistema de nick names permite o reconhecimento mútuo de blogue para blogue. Estão a meio caminho entre um nome que não desejam revelar e uma identidade pela qual desejam ser identificados. Querem e não querem ser reconhecidos. É o caso da “Zazie”, do “Euroliberal”, do “Sniper”, do “Piscoiso”, “Maloud”, “Bajoulo”, “Xatoo”, “Atento”, “Dasanta”, “José”, “e-konoklasta”, “Cris”, “Sabine”, “José Sarney”, “Anticomuna”, etc., etc,. Trocam entre si sinais de reconhecimento, cumprimentam-se, desejam-se boas férias, e formam minicomunidades que duram o tempo de uma caixa de comentários aberta e activa, o que normalmente dura pouco. Depois migram para outra, sempre numa tempestade de frases, expressando acordos e desacordos, simpatias e antipatias, quase sempre centrados na actividade de dizer mal de tudo e de todos.

    Imaginam-se como uma espécie de proletariado da Rede, garantes da total liberdade de expressão, igualitários absolutos, que consideram que as suas opiniões representam o “povo”, os “que não têm voz”, os deserdados da opinião, oprimidos pelos conhecidos, pelos célebres, pelos “sempre os mesmos”. São eles que dizem as “verdades”. Mas não há só o reflexo do populismo e da sua visão invejosa e mesquinha da sociedade e do poder., há também uma procura de atenção, uma pulsão psicológica para existir que se revela na parasitação dos blogues alheios. Muitos destes comentadores têm blogues próprios completamente desconhecidos, que tentam publicitar, e encontram nas caixas de comentários dos blogues mais conhecidos uma plataforma que lhes dá uma audiência que não conseguem ter.

    Não são bem Trolls, sabotadores intencionais, mas têm muitas das suas formas perturbadoras de comportamento. A sua chegada significa quase sempre uma profusão de comentários insultuosos e ofensivos que afastam da discussão todos os que ingenuamente pensam que a podem ter numa caixa de comentários aberta e sem moderação. Quando há um embrião de discussão, rapidamente morto pela chegada dos comentadores compulsivos, ela é quase sempre rudimentar, a preto e branco, fortemente personalizada e moralista: de um lado, os bons, os honestos, os dignos, do outro a ralé moral, os ladrões, os preguiçosos que vivem do trabalho alheio e dos impostos dos comentadores compulsivos, presume-se. O que lá se passa é o Faroeste da Rede: insultos, ataques pessoais, insinuações, injúrias, boatos, citações falsas e truncadas, denúncias, tudo constitui um caldo cultural que, em si, não é novo, porque assenta na tradição nacional de maledicência, tinha e tem assento nas mesas de café, mas a que a Rede dá a impunidade do anonimato e uma dimensão e amplificação universal.

    O que é que gera esta gente, em que mundo perverso, ácido, infeliz, ressentido, vivem? O mesmo que alimenta a enorme inveja social em que assentam as nossas sociedades desiguais (por todo o lado existe este tipo de comentadores), agravada pela escassez particular da nossa. Essa escassez não é principalmente material, embora também seja o resultado de muitas expectativas frustradas de vida, mas é acima de tudo simbólica. Numa sociedade que produz uma pulsão para a mediatização de tudo, para a espectacularização da identidade, para os “15 minutos de fama”e depois deixa no anonimato e na sombra os proletários da fama e da influência, os génios incompreendidos, os justiceiros anónimos, o “povo” das caixas de comentários, não é de admirar que se esteja em plena luta de classes.”

Serviço Público [com maiúsculas]

Através deste magnífico blogue, descobrimos o Kontratempos, que pôs mãos à obra: promover a desburocratização de processos na administração pública, partindo de casos concretos de todos os dias. Os seus leitores não se fizeram rogados e apresentaram já um conjunto de propostas: das energias renováveis ao recenseamento eleitoral, da acção social no ensino superior ao processo de casamento. Reproduzimos uma das sugestões:

    “Que tal as certidões de óbito passarem a ser vitalícias? É que pelo menos até há pouco tempo atrás tinham um prazo de validade de 6 meses... Será que o morto pode ressuscitar?”

Por outras palavras, o Kontratempos propõe à Unidade de Coordenação da Modernização Administrativa que, para o meritório trabalho que tem em mãos, ouça os cidadãos, aqueles que sentem na pele os efeitos da burocracia. Por exemplo, abrindo um site para acolher sugestões.

Sugestão de leitura - Douto parecer

Carla Machado, professora universitária, escreve hoje um artigo no Público, com o sugestivo título Douto parecer, que nos permitimos reproduzir:

    'Apesar de muito já ter sido dito sobre o tema, o assunto é, para mim incontornável. Refiro-me à notícia divulgada no PÚBLICO há alguns dias sobre a absolvição pelo Supremo de uma responsável de um lar para crianças com deficiências acusada de maus tratos. Não conheço o caso em pormenor, nem sei se a decisão do Supremo é ou não justa, no caso concreto. Não é a decisão que questiono. O que me inquietou – tomando como correctas as citações do acórdão feitas no corpo da dita notícia – foi a argumentação usada pelo Supremo para fundamentar tal decisão:

    1. “Umas palmadas (…) no rabo fazem parte da educação.” Pois fazem. Segundo vários estudos conduzidos no nosso país, as palmadas (e, com elas, as bofetadas, os puxões de orelhas, as sovas) são mesmo peça-chave da nossa forma de educar. Um estudo recente que coordenei, conduzido na região Norte, mostra mesmo que actos mais graves (bater causando marcas, dar murros ou pontapés, insultar a criança, dizer-lhe que nunca devia ter nascido) são praticados por cerca de 25 por cento das famílias portuguesas. Bater, às vezes de forma violenta, é comum. Deverá, por causa disso, ser considerado correcto?

    2. “Na educação do ser humano justifica-se uma correcção moderada.” Sim. Mas corrigir é necessariamente bater? Não existem outras respostas, tais como a explicação à criança do que fez mal, ou outros castigos, como sejam a perda de privilégios? E, se corrigir é necessariamente bater, porque não corrigimos os nossos delinquentes dessa forma? Serão as nossas crianças mais perigosas do que os internos nos nossos estabelecimentos prisionais?

    3. “Cremos que estão postas de parte, no plano científico, as teorias que defendem a abstenção total deste tipo de castigos moderados.” Fiquei contente por saber. Especialmente porque estudo a violência na família há mais de dez anos e ainda não me tinha chegado aos ouvidos que podíamos estar descansados quanto aos efeitos nocivos da punição física. Pelos vistos, toda a polémica entre os que defendem que o bater tem consequências negativas no desenvolvimento infantil, nomeadamente na génese de comportamentos de agressão e hostilidade, e os que defendem a ausência dessas mesmas sequelas está sanada. Porque será então, coisa esquisita, que se continua a escrever e a investigar sobre o tema? E porque será que vários países, tais como a Suécia, baniram o castigo corporal? E porque será que a Recomendação 1666 (2004) do Conselho da Europa considera que os Estados-membros deveriam proibir explicitamente todas as formas de castigo físico?

    4. Aparentemente, dar com frequência bofetadas à mesma criança ou fechar uma criança num quarto escuro ou levar a criança a chorar por medo não são maus tratos. Enganados andam os investigadores que recorrentemente tipificam como abusivas condutas desta natureza. Enganado anda quem defende que os castigos, mesmo que físicos, não devem constituir uma prática recorrente nem ser indutores de medo, sob pena de lesar a dignidade infantil e o seu sentimento de aceitação e segurança. Enganado anda quem julgar que tal será particularmente importante com crianças já fragilizadas pela sua deficiência. Em tempos, achava-se que medo era sinónimo de respeito. Pelos visto, há quem continue a achar.

    5. Ficamos a saber que qualquer “bom pai de família (…) por uma ou duas vezes (…) dá palmadas no rabo de um filho” ou “dá uma bofetada a um filho”. E que não o fazer é mesmo “um negligenciar educativo”. Muito obrigada ao Supremo por esta contribuição significativa para os estudiosos dos maus tratos. Até agora negligenciar era privar de cuidados, de supervisão, de apoio emocional, de disciplina (entendida como imposição de regras à criança, acompanhadas dos respectivos incentivos e penalizações). Sabemos agora que não bater é comportamento negligente. Cautela, pais que não batem: de ora em diante poderão ter um técnico a bater-vos à porta e a questionar-vos sobre tão negligente conduta!

    6. Mas continua a missão esclarecedora do Supremo: tudo isto se refere ao “bom pai de família”. Pobre de mim, que pensava que tal terminologia tinha sido banida dos nossos textos jurídicos e da nossa linguagem técnica! Pelos vistos, o pai de família bate. E a mãe deverá bater também? Ou será tal privilégio do pai? E a mãe, se não bate, o que faz? É batida?

    7. O acordo do Supremo faz eco do pensamento do comum dos cidadãos. Daqueles que acham que uma criança que não apanha perde respeito aos pais, que quem não bate não sabe educar e que a porrada nunca fez mal a ninguém. Não é a primeira – nem será a última vez – que um tribunal faz eco do senso comum. Há alguns anos o famoso ”acordo do macho ibérico” também insinuava que as mulheres novas que andam à boleia em plena coutada de tal macho convidam à violação. Não é novidade que um tribunal faça avaliações que ecoam as do “Zé” da esquina. Mas será isto que se pede a um órgão de soberania?'

NOTA — Será que o blogue incumbido da resenha das notícias relacionadas com a justiça também vai reproduzir o artigo?

quarta-feira, abril 19, 2006

Da série "Frases que impõem respeito" [5]

“Estivemos a trabalhar contra nós próprios”.

    Vice-presidente da AR Guilherme Silva, um dos absentistas, atribuindo a falta de quórum na AR à circunstância de não terem sido suspensos os trabalhos parlamentares na “Semana Santa”

Quórum [falta de]

    "Cada vez mais defendo a exclusividade parlamentar que, ligada à limitação de mandatos, dará uma garantia de independência".

    "Law makers are law makers and are not law breakers [os legisladores devem fazer as leis e não quebrar as leis]".

    "Mas podem ser introduzidas melhorias aos regimes estatutários. Aqui está um repto às forças partidárias, às forças políticas e em especial aos líderes parlamentares quanto à melhoria do desempenho, dos padrões de desempenho dos mandatos parlamentares".

    O presidente da Assembleia da República referiu-se também à questão dos conflitos de interesses dos deputados, que considerou ser "susceptível também de ser melhorada" em termos legislativos e dever ser tratada "com firmeza, clareza mas também com alguma prudência".

    "O regimento admite que haja contagens a todo o momento e só explicitamente diz que há falta quando não há quórum", declarou Alberto Martins, defendendo que passe a ficar expresso que as votações servem sempre para uma "avaliação das faltas". "Propomos que o momento determinante seja o momento da votação, que é o mais solene da vida parlamentar, o momento decisivo das opções legislativas, sirva para aferir as presenças e as ausências", acrescentou o líder da bancada do PS.

    "(…) os parlamentos de todo o mundo fecharam na Semana [Santa]". Para Guilherme Silva, os deputados não tomaram a decisão de fechar o Parlamento porque não quiseram ser rotulados como "malandros". "E depois ficamos admirados quando temos este resultado dos deputados não estarem lá. Fizemos tudo para que isso acontecesse".

    "(…) houve negligência do próprio Parlamento" ao marcar as votações para esse dia.

ANEXO:


terça-feira, abril 18, 2006

Uma de três em três meses: a próxima é em Junho

As forças de segurança voltam à rua em Junho. Não se vão manifestar (descentralizadamente), mas concentrar-se. A noção de "forças de segurança" é agora mais extensiva: abrange, além dos elementos da PSP e da GNR, a Polícia Marítima, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e os guardas prisionais. Os guardas florestais e as polícias municipais não foram contactados, certamente.

Saem à rua já não para reivindicar a “reposição imediata” de regalias sociais, mas para exigir melhores condições de trabalho: mais viaturas, armas e coletes à prova de bala. Subsídio de risco e coisas assim também fazem parte do caderno reivindicativo. Talvez porque compreendam os constrangimentos orçamentais, a Polícia Marítima não exige barbatanas, nem os guardas prisionais cavalos-marinhos. Hão-de arrepender-se.
________
Imagem

Da série "Frases que impõem respeito" [4]

"No fundo, tratou-se dum vulgar caso de relacionamento entre criança e educador, duma situação que acontece, com vulgaridade, na melhor das famílias."


Participe, mas não se envolva



James Rosenquist, Tumbleweed, 1963-6


Quando a galinha dá o ovo, ela participa.

Quando o porco dá o fiambre, ele se envolve.

Médicos e indústria

A Gulbenkian, em parceria com o Royal College of Surgeons of England, promove, no âmbito do II Ciclo Conflitos de interesses e Medicina, uma conferência subordinada ao tema Médicos e Indústria. É amanhã, às 10 horas, no auditório 2. A entrada é livre.

segunda-feira, abril 17, 2006

Sugestão de leitura – Auto-retrato das empresas tecnológicas

A indústria de tecnologias de informação sofre de vários problemas «graves» como os contratos precários e a fuga aos impostos, uma «prática generalizada também nas cotadas em Bolsa», acusou o presidente da ParaRede.

O Jornal de Negócios informa ainda de que, num debate que reuniu os responsáveis da Pararede, WeDo, Cap Gemini e SAP, as empresas foram unânimes em afirmar que seria importante haver um «regulador» ou «certificador» que poderia ajudar a evitar que situações dúbias ocorressem.

Paulo Morgado, administrador-delegado da Cap Gemini, sublinhou que «grande parte das empresas estão no mercado de venda de horas/homem, sem se importar se têm formação ou não».

Da série "Frases que impõem respeito" [3]

“A arguida residia no Lar, passando aí todo o dia e aí pernoitando, trabalhando das 7h às 23h e às vezes durante a noite quando era necessário ajudar a colega que fazia o horário nocturno, nomeadamente por algum utente estar doente.”

Sugestão de leitura – “os patrões do meu país”

Sérgio Figueiredo assina o editorial do Jornal de Negócios, intitulado Sociedade viciada. Eis um extracto:

    “Gostava de ter visto os patrões do meu país a exigir uma mudança efectiva no funcionamento do mercado de trabalho. Gostava de ter visto a sua principal confederação, a CIP, reivindicar para as relações laborais a mesma flexibilidade que o Governo anda a cultivar noutros domínios.

    Gostava, enfim, de ter visto gestores e empresários a dar um contributo, efectivo e não trinta-e-um-de-boca, para libertar a sociedade do Estado. Mas não. Esta reforma do regime do subsídio de desemprego não nos mostrou essa classe empresarial de vanguarda, exigente, coerente até com os princípios que prega. Ao contrário. Vimos a mesma pedinchice de sempre. Vimos o choro pelo apoio perdido (...).

    A rescisão amigável é um eufemismo, uma artimanha à portuguesa, para se evitar essa decisão dolorosa que é mandar alguém embora. O acto, em si mesmo, raramente tem algo de «amigável». E «barato», menos ainda. É um eufemismo porque suaviza o acto do despedimento, porque o torna mais polido e porque há a ideia de negociação. E há, de facto, uma negociação. Mas é uma negociação perversa, porque quem vai pagar parte desse acordo nunca está presente, nem ninguém lhe perguntar o que quer que seja. A empresa finge que resolve o seu problema, quando na prática está a transferi-lo, com encargos redobrados, para o Estado. Dito de outra forma: mais impostos. (...) E, sim, é verdade, o Estado deve ser convocado para esta empreitada, mas não com o subsídio que os nossos empresários andam a lamentar. O Estado deve sempre subsidiar a pessoa que fica excluída do mercado de trabalho. E ter políticas activas de emprego que evitem que o desgraçado fique condenado à própria sorte.”

O que lá vai, lá vai…

Alguém faz ideia de quantos eleitos cirandam hoje pelos Passos Perdidos?

Eh pá, a malta mais nova anda avisada, tás a ver?



Jim Dine, Awl, 1965


O lóbi do tabaco anda perturbado: “Os portugueses fumaram 16 mil milhões de cigarros em 2005, menos mil milhões do que em 2004. Segundo dados anuais dos fabricantes (…), as vendas de tabaco desceram 5,4% no último ano.” O presidente da Associação Nacional dos Grossistas de Tabaco, Jorge Duarte, comenta a quebra do consumo de tabaco e as restrições que se anunciam:

    • “(…) a malta mais nova começa a ter mais informação sobre os malefícios do tabaco e muitos jovens já nem começam a fumar”;
    • “As tabaqueiras vivem de populações flutuantes, entre os fumadores que morrem e os que entram no fumo”;
    • “(…) o caminho deve ser o da informação e não o da proibição”.



Thelonious Monk, Smoke Gets In Your Eyes

domingo, abril 16, 2006

Da série "Frases que impõem respeito" [2]


"Vou pegar na trela e levar o Man à rua, pois que neste país nada já parece valer a pena."

Memo

"(...) as empresas públicas devem divulgar, nos seus relatórios de gestão, o elenco completo das remunerações principais e acessórias, incluindo todos os complementos remuneratórios em dinheiro ou em espécie auferidos pelos membros dos respectivos órgãos de direcção, bem como os regimes de previdência e eventuais planos complementares de reforma de que os mesmos beneficiem e o valor dos encargos deles decorrentes para a mesma empresa em cada exercício."

    Resolução do Conselho de Ministros n.º 155/2005, de 6 de Outubro

Novos leitores

Costuma-se dizer que os posts que não aparecem na página inicial de um blogue não são lidos. Como se tivessem sido trasladados para o arquivo morto. A experiência diz-nos que não é bem assim. O CC é constantemente revolvido — e alguns leitores não deixam de dar a sua opinião sobre temas longínquos. Ainda bem. Eis um comentário hoje produzido sobre um post de Setembro passado:

    “Foi hoje o meu primeiro contacto com este blog, e estou a achá-lo bastante esclarecedor.
    Não tanto pelos conteúdos (factuais?)dos autores do mesmo, mas pelas respostas inenarráveis de pretensos magistrados.
    Vejo uma classe que se arroga o direito de ser um orgão de soberania, e logo acima dos demais cidadãos, a recorrer a um nível de linguagem e argumentação que só valida a impressão que o cidadão comum vai tendo dos magistrados: já não constituem uma classe de prestígio, dedicada à defesa do cidadão e da justiça, mas cada vez mais dedicada a "servir-se"...

    Ainda sobre os privilégios, o direito inerente a eles, responsabilidades e afins.
    Sou profissional da saúde, trabalho por turnos - o que quer dizer que em média viverei menos 15 anos que qq cidadão comum,(e que, se fosse mulher, teria o dobro da probabilidade de abortar),sou confrontado diariamente com decisões morais, éticas e técnicas que afectam a vida de doentes e familias, lido diariamente com doenças altamente contagiosas, risco de agressões, ambiente de trabalho stressante.
    Não tenho direito sequer a subsidio de risco (pelo contacto directo que tenho com doenças infecciosas) muito menos de penosidade (por lidar com doentes moribundos/psiquiatricos, etc) e menos ainda de deslocação ou habitação (os hospitais centrais e com melhores oportunidades de aprendizagem restringem-se a três cidades: Porto, Lisboa e Coimbra).
    Também tenho um curso superior e uma profissão que me obriga a estudo constante e a reciclagem frequente.
    Pergunta: Porque ganho metade de um Juiz em princípio de carreira?”

sábado, abril 15, 2006

Da série "Frases que impõem respeito" [1]

“No justiceiro, vemos nos filmes do Oeste, o ‘Ok Corral’, o homem chega lá e dá três balázios em alguém; fez justiça e é o maior. Mas não foi um juiz, foi um justiceiro”.

Intervalo




Bill Evans, Waltz for Debby


"Relaxe. Salvo raros casos de vida ou de morte, nada é tão importante como parece a princípio." [S. Brown]

A(s) vírgula(s)

Evite guardá-las num saquinho e só as distribuir quando pensa que a prosa está concluída. João Pedro George, no Esplanar, n' A Arte da Pontuação, explica por que não o deve fazer:

    “Colocar uma vírgula antes ou depois de uma palavra pode ser uma questão de vida ou de morte. Em Perdón Imposible, José Antonio Millán relata-nos um episódio em que o imperador Carlos V, na iminência de assinar uma sentença de morte que dizia «Perdão impossível, cumprir a condenação», viu-se acometido por um ataque de magnanimidade e, antes de rubricar, resolveu corrigir a frase: «Perdão, impossível cumprir a condenação». Bastou mudar uma vírgula e salvou-se, assim, a vida de um homem.”

sexta-feira, abril 14, 2006

Matéria de facto

“What is mind? No matter.
What is matter? Never mind.”

Punch (1855)

quinta-feira, abril 13, 2006

Que saudades tínhamos de António Cluny (desde os tempos do Envelope 9)!





Alberto Costa proferiu umas palavras menos simpáticas sobre o desempenho da investigação criminal — o que, aparentemente, até o "comum dos mortais" entende. António Cluny, o presidente vitalício do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, nem tempo teve para acabar o chá na Versailles. Dita de imediato para a TSF:

    "É uma afirmação bastante séria e eu estou convencido de que o Senhor Ministro está necessariamente habilitado a documentá-la, porque uma afirmação dessas tem que implicar um estudo aprofundado das acusações dadas nos últimos anos, dos julgamentos feitos, das razões porque é que a prova é ou não é sustentável em julgamento, é ou não é suficiente, é ou não é adequada a cada caso."

Cluny é, como se sabe, procurador-geral adjunto no Tribunal de Contas.

E, quando o anterior presidente deste tribunal superior, o Juiz Conselheiro Alfredo José de Sousa, qualificou a actuação do Ministério Público de "passiva", tendo sublinhado que, "em cada 100 relatórios de auditoria, quer do Tribunal, quer inclusivamente da Inspecção-Geral de Finanças e de outras inspecções-gerais, só dois ou três por cento é que são utilizados pelo Ministério Público para a efectivação das responsabilidades financeiras", que fez António Cluny?

Surgiu de rompante na TSF a exigir que Alfredo José de Sousa revelasse se estava "habilitado a documentar" essa "afirmação bastante séria"? Provavelmente, pediu mais uma empadinha na Versailles, pois ninguém o viu nem ouviu.

O que vale a António Cluny é que impera a preguiça (e a falta de memória) entre os jornalistas.

PS — O sindicalista Cluny já transmitiu, através da TSF, instruções ao Conselho Superior do Ministério Público: "De qualquer forma, essas afirmações [do ministro] terão necessariamente de ser tomadas [sic] e analisadas pelo Conselho Superior do Ministério Público (…)".

Plano tecnológico para o pecado



Goya, Cena da Inquisição, c. 1816


Porventura a pensar no comentador anónimo, o Vaticano colocou o excesso de utilização de Internet, televisão e jornais na lista dos pecados a confessar. Foi o penitenciário-mor do Vaticano que revelou a criação, na lista de pecados, de uma secção voltada para as novas tecnologias.

Como é usual acontecer nas organizações fechadas sobre si mesmas, há sempre um qualquer acólito que vem a terreiro fazer a defesa das suas abstrusas posições.

Tema para um imaginário acórdão




[Part I]


"Ambos lemos a Bíblia dia e noite,
mas tu lês preto onde eu leio branco."

William Blake, The Everlasting Gospel (1810)

Uma palavra mais (devido aos mails recebidos)

Não é a crucificação da analfabeta a quem foram confiadas as crianças com deficiências mentais que está em causa. É a argumentação utilizada no acórdão que choca, quando repetidamente despreza, ao analisar os maus-tratos, os problemas específicos que afectam aquelas crianças. Uma argumentação que, não raras vezes, chega a ser grotesca [“As crianças geralmente não gostam de salada e não havia aqui que marcar perante elas a diferença.”]. Tratou-se de uma oportunidade perdida de dar um sinal claro à sociedade de intransigência na defesa da integridade das crianças — agora, sim, em geral.

PS — Joel Timóteo Ramos Pereira, que felizmente não lê o CC, ainda nos consegue surpreender: sem ofensa, um rochedo inexpugnável, quando está em causa a necessidade de proteger a corporação. O título do post que escreveu é, em si mesmo, uma tese sobre o corporativismo, a que não falta uma pitada de humor, porventura colhida no Código Penal.

quarta-feira, abril 12, 2006

48,260869565217391304347826086957 % dos deputados não arredaram pé

Hoje era dia de votações na Assembleia da República. Estavam presentes 111 deputados. Não havendo quórum, a coisa foi adiada. As votações semanais costumam decorrer à quinta-feira, mas, em virtude da interrupção dos trabalhos parlamentaras (alegadamente devido à Páscoa), as votações foram antecipadas para esta quarta-feira. Aprenda-se com os erros: para o ano, antecipem-se as votações para terça-feira.

Entretanto, o presidente da Assembleia da República prometeu fazer cumprir “taxativamente” o estatuto dos deputados: a cada falta não justificada corresponde o desconto de um vigésimo do vencimento. O processo poderá estar concluído antes de o Envelope 9 chegar ao destino.

A avaliação dos juízes em questão

Estivemos o dia todo a resistir a comentar o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que o Público hoje divulga. A situação descrita, envolvendo crianças com deficiências mentais, é demasiado brutal para mais um post de circunstância. Como o era também um outro acórdão que encontrou justificação para a violação de umas inglesas no Algarve, pois elas estariam mesmo a pedi-las.

Não nos pronunciando sobre o caso concreto, impressiona-nos o perfil sociológico e intelectual dos juízes que integram aquele tribunal superior. Poder-se-ia dizer que, antigamente, o STJ era constituído por velhinhos totalmente impermeáveis a um raio de luz. Mas, agora, estaremos em presença de magistrados que andarão entre os 50 e 60 anos — gente que, nos anos 60, teria não mais de 20 anos. Aparentemente, não aprenderam nada. E isso é um traço muito preocupante, sobretudo quando esta gente tem o poder de escolher os sucessores. Talvez agora se entenda a importância da avaliação dos juízes, designadamente quando são aferidos aspectos como o “bom senso” e a “categoria intelectual”.

A palavra aos leitores –cheira-me que sim

Um leitor, que não se identifica, deixou na caixa de comentários esta nota:

    Ó miguel, diga-me lá como é que alguém pode mandar algum e-mail para o blogue se SEMPRE QUE EU FIZ ISSO, E FORAM MAIS DE QUATRO VEZES, as mensagens foram-me devolvidas porque a caixa ESTÁ SEMPRE CHEIA ?

    Não sei se o mesmo aconteceu com a Dra Mónica, mas cheira-me que sim.Vá enganar outros.

O leitor tira conclusões pelo faro. A circunstância de experiências com canídeos ter demonstrado a importância do olfacto não assegura que produza os mesmos efeitos no Homem. Temos de ser mais cautelosos. Por isso, o leitor erra em relação à “Dra Mónica” quando afirma que lhe cheira que a ilustre magistrada terá tentado remover a frase em epígrafe através de um mail, uma forma decente de comunicar.

E, porque vem a propósito, o leitor mente quando assevera que a caixa de correio está sempre cheia. É verdade que mudámos o endereço. Temos recebido mails que fazemos questão de os guardar. Por isso, mudámos do Hotmail para o GMAIL, que tem maior capacidade.

Mas nem o anterior endereço, nem o actual estão ou estiveram alguma vez a transbordar por fora. Só nós sabemos o trabalho que isso nos dá.

Quando quiser, o leitor pode escrever-nos. E convém que seja para o endereço actual, que está visível no canto superior direito há mais de um mês. É o seguinte:

corporacoes@gmail.com

Uma corporação unida jamais será vencida! [3]



Liz Taylor, Cleopatra, 1962

A Cleópatra também descortina uma conspiração maquiavélica no que designa por “um foro especial para os políticos serem julgados”. Bate forte e feio em MST por este revelar que existe um regime de excepção para os magistrados. Se o argumento da Cleópatra é válido, não se entende por que o mesmo princípio não é aplicável aos membros não magistrados do CSM, apesar de participarem nas deliberações que afectam os juízes.

Acresce que não se trata de “um foro especial para os políticos serem julgados”, mas de um foro especial para crimes cometidos por políticos no exercício de funções. Faz toda a diferença.

Em Espanha, existe um regime análogo, mas que não abrange apenas membros do Governo e deputados, pois é extensivo também aos autarcas. Tal circunstância não tem impedido que haja políticos que sejam “incomodados” pela justiça, de que o caso mais recente é o da Câmara de Marbella.

E em Portugal, que se passa? Quantos políticos foram condenados no “foro normal”? Que aconteceu a Leonor Beleza com o caso dos hemofílicos? E que sucedeu no processo das “viagens fantasmas” dos deputados?

Mas — “É só fazer contas” — os juízes dos tribunais da relação são menos independentes do que os da 1.ª instância?

Uma corporação unida jamais será vencida! [2]



Vivien Leigh, Antony & Cleopatra, 1945


A propósito do Conselho Superior da Magistratura (CSM), que MST considera dominado pelos juízes, a Cleópatra sustenta: “O Conselho Superior da Magistratura, para quem desconhece, é constituído ou composto por 17 membros, sete são juízes eleitos pelos seus pares, sete são designados pela Assembleia da República, dois são indicados pelo Presidente da República e um – o presidente do Conselho – é ocupado por inerência pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça”, para então concluir que “o CSM não é dominado pelos Juízes.” “É só fazer contas”, como diz.

A Cleópatra esquece-se de que o CSM funciona em plenário, que se reúne quando o rei faz anos, e em conselho permanente. O conselho permanente é constituído pelo presidente, pelo vice-presidente, por um juiz da Relação, por dois juízes de direito, por um dos dois vogais designados pelo Presidente da República e por dois vogais entre os eleitos na quota da Assembleia da República. Os juízes estão em maioria e é a este órgão que cabe, entre outras funções, decidir tudo o que respeita ao movimento de juízes nos tribunais de 1.ª instância, às classificações de serviço e à determinação de inspecções, inquéritos e sindicâncias a realizar.

A Cleópatra esquece-se também de que um dos vogais designados pelo Presidente da República para o CSM tem sido um magistrado, o que logo altera a “correlação de forças”.

E, não nos circunscrevendo à lógica dos “sedimentados ensinamentos de matemática”, cumpre assinalar que nem os vogais designados pelo presidente da República, nem os designados pela Assembleia da República têm prestado contas, tanto quanto é público, da sua actividade no CSM — se é que foram incumbidos de fazer a defesa de quaisquer posições. Para não falar da circunstância de serem, em regra, advogados, que têm é de tratar da sua vidinha — e a última coisa que lhes ocorrerá é incompatibilizarem-se com a magistratura, ainda por cima por razões “quixotescas”.

Uma corporação unida jamais será vencida! [1]



Vogue, 1918


A crónica de Miguel Sousa Tavares (MST) no Expresso provocou ondas de choque por essa blogosfera fora. Veja-se o caso do Dizpositivo, um blogue recente de magistrados (judiciais), que se não poupa a esforços para rebater as palavras de MST.

A Cleópatra*, por exemplo, dá uma resposta ponto por ponto, acrescentando-lhe, de resto, alguns pontos. Vejamos alguns aspectos:

A possibilidade de “juristas de reconhecido mérito” poderem ter acesso aos tribunais superiores arrepia a Cleópatra. Essa possibilidade está prevista na lei — o que permitiu que Menéres Pimentel e, agora, Maria dos Prazeres Beleza fossem nomeados juízes conselheiros. Não será estranho que, durante longos anos, tivesse sido recusado o acesso a juristas de reconhecido mérito e que vários juízes tivessem votado contra o ingresso de Maria dos Prazeres Beleza, que é magistrada do Tribunal Constitucional?

____________
* Estando em causa um nick, não conseguimos contornar o tratamento informal que o uso do artigo definido sugere.

Mais do mesmo

Conforme prometido, eis a parte respeitante à justiça da crónica (“Mais do mesmo”) de Miguel Sousa Tavares no Expresso do último sábado:

    ‘Eu julgava que, depois dos mandatos do dr. Baptista Coelho à frente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), em que a classe de juízes se afirmou perante a opinião pública como um corpo fechado e corporativo, avesso a qualquer espécie de autocrítica e insensível ao desprestígio e tremendo fiasco da Justiça enquanto serviço público, já não seria possível aos juízes continuaram, cegos e surdos, por esse caminho suicida.

    Mas parece que me enganei. Com a eleição do desembargador António Martins para suceder ao dr. Baptista Coelho, a ASJP, ao que se comenta, escolheu o caminho da radicalização ainda mais extremada. E, se dúvidas houvesse, a curta entrevista do novo dirigente sindical dos juízes portugueses ao EXPRESSO da semana passada é suficiente para as dissipar.

    As respostas do dr. António Martins a duas simples perguntas contêm todo um programa de acção que é uma verdadeira declaração de guerra a um poder político, que dir-se-ia usurpado em golpe de Estado e não sufragado a eleições pelos portugueses.

    Desde logo, acusa ele o Governo de ter delineado «uma cavalgada de ataque ao poder judicial» que antecede a instauração da «lei da selva». E não encontra melhor exemplo para isso do que a possibilidade de acesso de «juristas de reconhecido mérito», que não são magistrados de carreira, aos Tribunais Superiores — possibilidade esta que, prevista há longos anos na lei, acaba agora de ser exercida apenas pela segunda vez, em benefício de uma mulher, cuja competência jurídica é pública e notória. Mas, em defesa da fortaleza corporativa dos juízes, o dr. António Martins vê nisto uma tentativa clara do Governo de «quebrar a independência dos tribunais e controlar o poder judicial». Como se alguém vindo de fora do sistema, e aliás aprovado pelo Conselho Superior de Magistratura, que os juízes dominam, não pudesse, por definição, ser independente!

    O segundo exemplo que arrola é a proposta da comissão de revisão do Código Penal de que os governantes e deputados em efectividade de funções só possam ser julgados nos Tribunais da Relação, coisa que ele vê como a criação de «um sistema especial de justiça para os políticos». É possível que sim, mas o que não deixa de ser eloquente é que o dr. António Martins finja esquecer-se que do mesmo sistema especial beneficiam os juízes há largos anos, sem que isso pareça incomodá-los, antes pelo contrário.

    O terceiro exemplo é mais grave: o dr. António Martins insurge-se contra a possibilidade de as escutas telefónicas, em lugar de autorizadas por um juiz, passarem a sê-lo «por uma comissão administrativa nomeada pelo Governo», o que, em sua opinião, «violaria o princípio constitucional da separação de poderes». De facto, violaria. Só que há uma substancial diferença entre o que ele diz e o que se discute. Ninguém põe em causa que as escutas, em processo-crime, continuem a ser autorizadas exclusivamente por um juiz: o que se propõe é que, depois, haja uma comissão – nomeada pelo parlamento e não pelo Governo – que controle de forma genérica o uso que os juízes fazem dessa poderosa arma de investigação, que é também um poderoso instrumento de devassa da vida das pessoas. E o que o dr. António Martins parece desejar é que os abusos cometidos, a negligência e a irresponsabilidade, bastas vezes vindas a público nesta matéria tão sensível, continuem em roda livre, sem que ninguém os controle. Que os cidadãos se disponham a abdicar pacificamente daquilo que são direitos constitucionais absolutos a favor do sagrado direito à impunidade dos juízes.

    É extraordinário que o representante da classe dos juízes – que funciona como verdadeiro porta-voz do poder judicial -, confrontado com as coisas inadmissíveis que têm vindo a público acerca da prática das escutas telefónicas, em lugar de reconhecer os erros cometidos e o desleixo verificado, em lugar de propor soluções para lhes pôr cobro e garantir efectivamente a protecção dos direitos de cidadania – que é uma obrigação de qualquer juiz -, nada mais tenha a defender do que a manutenção do estado de coisas actual, em obediência ao que afirma ser o princípio da separação de poderes. E, já agora, também é extraordinário que quem tanto se preocupa com esse princípio anuncie que o seu sindicato vai apresentar ao Governo «propostas concretas» de legislação em matéria penal e processual penal, as quais, obviamente, espera ver aprovadas. Onde fica a separação de poderes, quando o sindicato que representa os juízes se propõe ser ele a redigir as leis que os hão-de governar o que eles hão-de aplicar nos tribunais?

    Esta entrevista é exemplar da importância daquilo que está em jogo. Nenhuma reforma, por mais necessária e bem sucedida que seja, é tão importante quanto a urgente reforma da Justiça. Com os magistrados ou contra os magistrados. E é lastimável que o eng. Sócrates já pareça ter desistido de ir em frente, queimando tempo, energias e «momentum» nas espadeiradas sem nexo de um ministro da justiça que, claramente, não surge talhado para o desafio.’


LER OS OUTROS – Mónica já não mora aqui

Este blogue parece ter ficado impressionado com as peripécias em torno da epígrafe do CC ora retirada. Transcrevemos na íntegra o post publicado:


Declaração de independência




O Câmara Corporativa publicou há dias esta frase da Drª Mónica, Juíza de Direito:

    "É também possível afirmar que os juízes são independentes quando estão dependentes do sistema nacional de saúde, que os obriga a ingressar numa fila única às 6:00 horas da manhã para marcar consulta com o seu médico de família, sem qualquer garantia que serão atendidos no dia que pretendem e a horas que não perturbem a sua agenda do Tribunal?"

Mas o melhor veio depois, quando a Drª Mónica escreveu na caixa de comentários do citado blogue:

    "Verifiquei que no v. blog mantêm uma frase minha, sob o tema "Câmara Corporativa", retirada de um texto que elaborei para o VII Congresso dos Juízes Portugueses. Tal frase foi retirada do seu contexto e à mesma foi por vós acrescentado o título "Câmara Corporativa", com o intuito de desfavorecer a classe profissional a que pertenço - Magistratura Judicial.
    Para além do mais, Não AUTORIZO que publiquem qualquer texto meu.
    Agradeço que, no mais curto espaço de tempo possível (ainda hoje ou até amanhã), retirem a minha frase totalmente do v. blog, de outro modo, terei de denunciar a situação às entidades competentes.
    Grata pela atenção dispensada."

Será possível afirmar que os juízes são independentes quando são obrigados a defender a sua honra em caixas de comentários de blogues mal intencionados?

LER OS OUTROS - O b-a-bá da CRP

Vital Moreira já aqui se referira ao assunto. Souto Moura escreveu ontem uma "carta aberta" no Público, no qual procura esclarecer a sua posição. Este esclarecimento levou Vital Moreira a escrever um outro post, intitulado E insiste, que transcrevemos:

    “Numa «carta aberta» hoje aparecida no Público, o Procurador-Geral da República insiste em negar que tenha de dar conta à AR das suas actividades, nomeadamente no que respeita à «execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania» (a começar pela AR, bem entendido), na parte em que tal execução compete ao Ministério Público, como dispõe a Constituição.
    Tinha como certo que, ao menos, o PGR devia conhecer o b-a-bá da CRP. Pelos vistos, não é assim.”

terça-feira, abril 11, 2006

Tá? Tá? Tá lá? A chamada caiu…

A ANACOM fixa níveis de qualidade para os serviços da PT – Comunicações. Voltaremos ao assunto.

Separar as águas

Já aqui o dissemos não há muito tempo. Nós falámos das pensões de reforma mais elevadas justamente para pôr em evidência que são os beneficiários dessas pensões que, quando no activo, mais reivindicam aumentos salariais.

O Correio da Manhã volta hoje a falar das pensões, misturando alhos com bugalhos. Como se a sustentabilidade da segurança social estivesse dependente das pensões de reforma mais elevadas, ainda por cima suportadas pela Caixa Geral de Aposentações, e não pela segurança social, pormenor que escapa ao arguto jornalista.

Em todo o caso, registe-se, recorrendo aos “sedimentados ensinamentos de matemática” (feliz expressão da magistrada Mónica Maria) do jornalista do Correio da Manhã, que, no ano corrente, dos 63 pensionistas com reformas superiores a 5 mil euros, 57 são magistrados.

A propósito de um comentário de um leitor (anónimo, claro)

Vários comentários que expressam posições que não coincidem com as nossas opiniões têm sido transcritos no CC. Acontece que, quando estão em causa questões relacionadas com a justiça, os comentários, salvo honrosas excepções, limitam-se a insultos. Até alguns leitores que supomos serem magistrados, mesmo quando não perdem a cabeça, o melhor que dão de si é lições paternalistas. Para não falar dos que enveredam por discursos eivados da superioridade moral dos magistrados. Serão provavelmente bons exemplos do espírito de casta prevalecente nesses corpos profissionais. Deveríamos dar destaque a tais comentários?

Não temos nenhuma simpatia especial por Maria José Morgado. Nem achamos que tenha, na sua passagem pela Polícia Judiciária, desenvolvido um trabalho que sirva de paradigma. Recordamo-nos vagamente de um despacho de Maria de Fátima Mata-Mouros, enquanto juiz de instrução criminal, que poderá ajudar a compreender a nossa opinião.

Ainda assim, mesmo que se trate de um caso singular de mediatização, ou até só por isso, vale a pena dar a conhecer alguns dos pontos de vista da magistrada que Manuel Monteiro gostaria de ver à frente da Procuradoria-Geral da República. É tão-só isso que está em causa.

"Temos uma magistratura da idade média e de mercearia"

Vamos ver se hoje arranjamos tempo para transcrever alguns fragmentos da entrevista dada por Maria José Morgado à Rádio Renascença no Domingo, reproduzida no Público de segunda-feira.

ADENDA — Houve um leitor que teve a amabilidade de transcrever, na caixa de comentários deste post, a entrevista dada por Maria José Morgado. Evita-nos trabalho e evita que sejamos acusados de falta de isenção na escolha dos fragmentos a transcrever. Passem por lá e leiam-na.

Insensatez


Jobim & Vinicius na voz de Rosa Passos:


segunda-feira, abril 10, 2006

E tudo o vento levou

"Se as flores pudessem falar"



Andy Warhol, Flowers (Do it Yourself)


Nelson Ned, antes de abalar, ainda procurou, por todos os meios, consolar-nos:

... X...


Antoni Tàpies, Grand X



Mónica já não mora aqui. Ou melhor, ali em cima. Foi removida a epígrafe [19:48] que constituía a imagem de marca do CC:

    “É também possível afirmar que os juízes são independentes quando estão dependentes do sistema nacional de saúde, que os obriga a ingressar numa fila única às 6:00 horas da manhã para marcar consulta com o seu médico de família, sem qualquer garantia que serão atendidos no dia que pretendem e a horas que não perturbem a sua agenda do Tribunal ?”

Se algum leitor estiver interessado em aprofundar o assunto, poderá consultar o site da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, até para evitar fazer uma leitura descontextualizada do documento subscrito por uma magistrada judicial.

Férias judiciais (as da Quaresma)


O CC ressente-se. Desde sexta-feira passada (inclusive), o número de visitas reduziu-se drasticamente. Temos que nos resignar. Até ao Domingo de Páscoa, vamos ter a companhia de apenas metade dos nossos habituais leitores. Estamos, de novo, em plenas férias judiciais.

domingo, abril 09, 2006

“Domingo à tarde”

Nelson Ned também nos veio confortar:



DFGHJLMN

Continuemos a percorrer o alfabeto. Mónica, não tarda nada, já não mora aqui [16:43].

Mais do mesmo

Já leram a crónica de Miguel Sousa Tavares no Expresso, intitulada Mais do mesmo? Havemos de, com tempo, transcrever algumas partes. Fica, por agora, o destaque:

    “Nenhuma reforma, por mais necessária e bem sucedida que seja, é tão importante quanto a urgente reforma da Justiça. Com os magistrados ou contra os magistrados.”

“Non credo ci siano tanti coglioni che votano a sinistra”

A Itália vai hoje a votos. A ideologia que o comentário transcrito tão bem traduz levou Berlusconi ao poder. Num ápice, a república dos juízes cedeu o lugar à aventura do homem que, “depois de usar o poder económico pessoal para chegar ao poder político, afinal, também usou este para engrandecer aquele, tornando o "eu" e o "meu" inextrincáveis.” Removido o “mais rudimentar sentido de Estado”, lançou “mão dos mecanismos de curto-circuito às instituições e de comunicação pessoal, directa e mágica com a multidão (numa versão actualizada dos métodos que foram caros à direita antidemocrática e à chamada "esquerda social").” A justiça, essa, assiste, impotente, às trapaças.

“Espere um pouco, um pouquinho mais”

A música continua. Agora com Nilton César:



EIOU

Continua a desconstrução da epígrafe: agora vão saltar as restantes vogais. Não desanimemos. Mais tarde ou mais cedo, há-de realizar-se o VIII Congresso dos Juízes Portugueses [12:16].

sábado, abril 08, 2006

Luta

"As pessoas parecem lutar por coisas muito pouco adequadas à luta".

    G. K. Chesterton

Apelo aos leitores

Neste momento particularmente difícil para todos nós, demos as mãos. Apoiemo-nos mutuamente. A epígrafe não era tudo. Para compensar a perda, teremos durante uns dias música no CC. Ouçamos hoje Quando, por Roberto Carlos:



ABC

Damos hoje início à campanha Mónica já não mora aqui. Hoje saltam as letras a, b e c. Que os leitores estejam preparados, porque em breve ligaremos o acelerador de partículas, também usado na polimerização de plásticos [23:32].

Embuste


Edgar Degas, Esperando, 1882


“Mónica” deixou a seguinte nota na caixa de comentário:
O estilo confunde. Revela uma aplicada incursão hermenêutica pela intervenção de Mónica Maria Dias no VII Congresso dos Juízes Portugueses. Um estilo, como se sabe, assertivo:

O embusteiro compôs bem a personagem:

O autor material do embuste vai também bem quando, aqui ou ali, se baralha. Ou quando dá ao comentário o tom fatalista de tragédia grega de que está impregnada a ilustre intervenção:

A própria sintaxe não destoa. No entanto o impostor dá um desajeitado passo em falso. Nenhum jurista se atreveria a ameaçar “denunciar a situação às entidades competentes” [Sociedade Portuguesa de Autores?] sem base legal para tanto. E, que diabo!, por muito assertiva que seja, mesmo que tal lhe possa proporcionar as “sensações emotivas mais fantásticas, inacessíveis para o comum dos mortais”, isso qualquer juiz de direito há-de certamente saber.

Em todo o caso, não vamos manter acorrentada a frase em epígrafe. Mas, antes de lhe darmos asas, precisamos de preparar os leitores. Fá-lo-emos de modo a não provocar síncopes, o que seria escusado.

sexta-feira, abril 07, 2006

Um por cada dois

O Governo quer reduzir o número de funcionários públicos: a regra é admitir um funcionário por cada dois que se aposentem. Parece que a informação ainda não chegou às câmaras municipais: “As autarquias contrataram 3920 trabalhadores para apenas 1870 aposentados, a avaliar pelos dados da Caixa Geral de Aposentações.

Por outro lado, o fim do Serviço Militar Obrigatório deixou uma herança pesada: “A profissionalização das Forças Armadas também fez disparar o número de contratações, com 6347 admissões ao longo de 2005.

Ideias feitas

O Eurostat compara o número de funcionários públicos em cada Estado da União Europeia com a respectiva população activa. Portugal apresenta uma percentagem superior à de Espanha ou à do Luxemburgo. Nos restantes Estados-membros esta percentagem é mais elevada, sendo o primeiro lugar ocupado pela Suécia. Veja-se o peso dos funcionários públicos na população activa (dados de 2004):

    Suécia - 33,3%;
    Dinamarca - 30,4%;
    Bélgica - 28,8%;
    Reino Unido - 27,4%;
    Finlândia - 26,4%;
    Holanda - 25,9%;
    França - 24,6%;
    Alemanha - 24%;
    Hungria - 22%;
    Eslováquia - 21,4%;
    Áustria - 20,9%;
    Grécia - 20,6%;
    Irlanda - 20,6%;
    Polónia - 19,8%:
    Itália - 19,2%;
    República Checa - 19,2%:
    PORTUGAL - 17,9%;
    Espanha - 17,2%;
    Luxemburgo - 16%.

quinta-feira, abril 06, 2006

Carta endereçada a Carmona Rodrigues


A carta dos seis advogados (e sócios do Sporting) dirigida a Carmona Rodrigues foi publicada no jornal A Bola de ontem, numa página interior e par (p. 26), com uma letra de tamanho tão reduzido que necessitámos de uma lupa para a poder ler. Transcrevemo-la:

    “Os signatários são todos sócios do Sporting Clube de Portugal, com vários anos de filiação, conforme se poderá constatar pelo número de sócio constante na lista anexa, estão temerosos com o futuro do Sporting, por força da situação financeira calamitosa que é do conhecimento público, e desejam dar o seu contributo na procura de uma solução que possa relançar a saúde económica do Clube.

    Pensam os signatários que esse objectivo só pode ser alcançado se for preservado o património do Sporting e se as valias desse património forem potenciadas pelo próprio Clube.

    Não tem sido esse o entendimento de quem conduziu o Sporting nos últimos anos, com as consequências que estão à vista e são públicas.

    Têm os subscritores fundadas suspeitas de que alguns dos negócios que envolvem o património imobiliário do Sporting padecem de irregularidades que ferem a sua validade. Só para alertar V. Ex.ª sobre operações que se podem considerar ilegais desde que haja acesso aos contratos e escrituras que a Direcção do Clube se recusa a facultar referimos o historial de uma delas.

    Existe na Câmara Municipal de Lisboa para aprovação um ou dois lotes de terreno com a área de construção de 139 mil metros quadrados.

    Acontece que o contrato efectuado pelo Sporting Clube de Portugal e a M.D.C foi assinado pelo Director Geral do Clube, Diogo Gaspar Ferreira supomos, sem poderes bastantes para o fazer e em perfeito “conflito de interesses” passou, acto contínuo a esta operação, a fazer parte da administração da empresa M.D.C.

    Consta que a M.D.C. está a negociar com um Fundo Americano a venda deste património com um lucro de 30 milhões de contos.

    Sendo que se a operação for efectuada pelo Sporting daria lucro liquido à colectividade de cerca de 53 milhões de contos.

    É de salientar que a C.M.L., ao vender ou doar terrenos ao Sporting, fê-lo na convicção de que os terrenos seriam para ajudar a colectividade nas suas despesas gerais, com grande incidência nas suas modalidades amadoras e não em operações especulativas de criminosos lucros a favor de entidades estrangeiras.

    Pelo exposto, solicitamos a V. Ex.ª não despachar qualquer licenciamento que possa comprometer o valiosíssimo património do Clube, que em grande parte se deve à generosidade da Câmara Municipal de Lisboa.

    Por isso, e porque os valores, como se demonstra, envolvem prejuízos de dezenas de milhões de contos, em operação ruinosa e de má-fé, não hesitarão os subscritores em defender os interesses e o património do Clube, Instituição de Utilidade Pública, até às últimas consequências.”

Carmona resolve?


Seis advogados e sócios do Sporting suspeitam de irregularidades na operação de venda dos terrenos do antigo Estádio José Alvalade. O “Sporting” alienou os terrenos por 13 milhões de contos à multinacional MDC, que aguarda o licenciamento para construir, mas só liquidará uma grande parte do montante acordado quando puder construir. Entendem os seis advogados que o Sporting poderia efectuar uma operação "que daria lucro líquido à colectividade de cerca de 53 milhões de contos".

Em causa estão lotes de terreno, com uma área de construção estimada em 139 mil metros quadrados, que aguardam aprovação de licenciamento. Por isso, os seis advogados solicitaram a Carmona Rodrigues que não defira o processo até se esclarecerem as suspeitas.

Um dos contratos com a MDC foi assinado pelo director-geral do clube, Diogo Gaspar Ferreira, que, além de se admitir que não tivesse poderes bastantes para o celebrar, passou, acto contínuo a esta operação, a fazer parte da administração da MDC.

Carmona Rodrigues pode vir a transformar-se no presidente da comissão liquidatária do Sporting, no caso de aprovar o licenciamento.

quarta-feira, abril 05, 2006

A indústria de articulados


As seis maiores fábricas de advogados facturaram 105 a 115 milhões de euros em 2005. Trata-se de uma investigação do Jornal de Negócios, porque, ao contrário do que se verifica, por exemplo, em Inglaterra ou Espanha, a Ordem dos Advogados mantém segredo sobre este tipo de informação.

O jornal estima que a PLMJ, AM Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice e Associados tenha facturado 30 a 32 milhões de euros; a MLGT, Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados 25 a 27 milhões; a GPCB, Gonçalves Pereira, Castelo Branco & Associados 17 a 18 milhões; a Vieira de Almeida & Associados 16 a 17 milhões; a Uría Menéndez 11 a 12 milhões; e a Linklaters 9 a 10 milhões.

A margem de lucro média destas seis sociedades deverá situar-se entre os 40 e 50 por cento, o que significa que cerca de 50 milhões de euros serão distribuídos pelos respectivos sócios.

Os impostos vão ser todos declarados, não é?

Sugestão de leitura – O corporativismo nas universidades

Conhecemos um caso em tudo idêntico ao que é relatado por Tiago Mendes, no artigo que hoje publica no Diário Económico com o título A minuta, no qual sustenta que o “corporativismo em algumas universidades portuguesas é tanto mais condenável quando esperamos que elas sejam pólos de excelência e exemplos a seguir.” Aqui fica um extracto:

    “Um caso caricato chegou-me há dias ao conhecimento. Rezava assim: um cientista português, radicado no estrangeiro, respondera a um concurso duma universidade portuguesa, publicitado na internet. A sua candidatura fora desqualificada, informava a Reitoria da instituição em causa, por não incluir “a minuta de candidatura”. A dita “minuta”, que não era referida no anúncio nem estava acessível ‘online’, não passava de um formulário no qual se requeriam o nome próprio, a filiação e a referência do concurso. Só a informação relativa à filiação não era deduzível da restante candidatura. Conclusões? Duas. Uma geral e uma particular.

    A primeira: é nos pequenos detalhes que muitas vezes se percebem as grandes diferenças. Este tipo de requerimentos, essencialmente burocráticos, mesquinhos e alimentadores da mediocridade, não se coadunam com uma cultura meritocrática. Erguer este tipo de “muralhas”, de forma kafkianamente engenhosa, para proteger os habitantes do “castelo” não é prática admissível numa instituição onde a busca de conhecimento seja o móbil maior. A segunda: só com uma invejável dose de ingenuidade conseguiremos não suspeitar que a instituição em causa, a Universidade de Lisboa, tenha encorajado, ao mais alto nível, a contratação preferencial de pessoas da casa.”

Sugestão de leitura – Simplificar para quê?

Um artigo cuja leitura sugerimos: o de Maria Manuel Leitão Marques, no Diário Económico, com o título Simplificar para quê? Muito embora não sejam os sistemas que controlam, mas as pessoas através dos sistemas, em particular aquelas cuja função é parte integrante do sistema, afigura-se-nos que merece destaque esta ideia: “Com o tempo, alguns controlos tornam-se formalidades, deixando de olhar para aquilo que realmente importava controlarem.”

Os grandes mistérios do Universo [23]

Sabendo-se que a abertura de farmácias nos hospitais permitiria enormes poupanças ao Estado e facilitaria a vida aos doentes que recorrem às Urgências, em especial durante a noite, por que não avançou ainda o ministro da Saúde com esta medida?

O lobo mau

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      em resposta a uma pergunta [na assembleia para aprovação do relatório e contas] , ficou-se a saber que a direcção da ANF tem uma estratégia que assenta no isolamento do ministro da Saúde no seio do Governo
A verdade é que foi assim no passado... E agora?

Fisco lança ofensiva sobre as farmácias

As farmácias serão, nos próximos tempos, um dos sectores de actividade na mira da inspecção tributária. Serão adoptados na selecção das farmácias a fiscalizar vários critérios, designadamente os seguintes:

    • Rendibilidades baixas com custos elevados;
    • Inventários empolados;
    • Trespasses realizados por valores considerados muito baixos;
    • Existência de lucros não distribuídos.

Será que João Cordeiro interrompe de imediato as férias?

Cordeiro em apuros

As contas da Associação Nacional de Farmácias (ANF), que representa cerca de 3.000 farmacêuticos, foram aprovadas: 73 votos a favor, nove abstenções e 21 votos contra. João Cordeiro, que não está habituado a ter oposição, abandonou as instalações no momento da votação, “tendo dado a entender que se demitiria caso as contas não fossem aprovadas”.

As dores de cabeça de Cordeiro resultam da constituição de um grupo de reflexão denominado Fórum Farmacêutica, que considera que há falta de transparência na gestão da ANF. No entender destes farmacêuticos, “sem notas às contas, demonstração de fluxos de caixa, demonstração de resultados por departamentos e contas consolidadas de empresas participadas e associadas, não se torna possível avaliar adequadamente a posição financeira e as operações da associação como um todo”. Acresce que foram “colocadas várias questões à direcção, que regra geral respondeu de forma intimidatória, agressiva e inconveniente ou não respondeu”.

Os críticos de João Cordeiro exigem uma auditoria externa às contas da ANF. Cordeiro, esse, meteu férias.

Os grandes mistérios do Universo [22]

terça-feira, abril 04, 2006

Reflexos condicionados





As “teses” (aqui e aqui) não passaram de um exercício de copy & paste. Alípio Ribeiro, procurador-geral do distrito do Porto, deu uma entrevista a O Primeiro de Janeiro e o CC limitou-se a escolher alguns fragmentos, evitando mesmo transcrever as opiniões menos consensuais. Vale a pena dar uma vista de olhos pelas caixas de comentários — para verificar como os reflexos condicionados tolhem o raciocínio de alguns dos nossos estimados leitores.

Sugestão de leitura - Ode ao comentador anónimo




Mário Negreiros escreve, no Jornal de Negócios, um artigo intitulado Os senhores das alcunhas, no qual analisa o comportamento de todos aqueles que preenchem as suas horas mortas escrevendo comentários anónimos por essa Internet fora. Eis uma parte:

    "A Internet é reveladora de muitas coisas, e nem todas são bonitas. Revela grandes canalhas (pedofilia, racismo, terrorismo, etc). Também revela pequenos canalhas. E é dos pequenos que me ocupo hoje.

    Refiro-me aos que, escondidos sob alcunhas, enchem o espaço cibernáutico de uma agressividade que não pode deixar de ter algo de patológico.

    Praticamente todos os fóruns de discussão na internet em que caí na asneira de entrar eram dominados por esses pequenos canalhas, cuja característica mais evidente é um apreço pelas próprias opiniões tão grande quanto o desapreço por quaisquer outras opiniões. Têm uma necessidade que parece compulsiva de atribuir ignorância a quem quer que se atreva a dar palpites sobre os assuntos que só eles, os pequenos canalhas, dominam (ou seja, todos e quaisquer assuntos) (...).

    Os pequenos canalhas são chatos mas, individualmente, inofensivos (mas atenção, porque nada impede que um pequeno canalha seja também um grande canalha). O mal que os pequenos canalhas fazem está na quantidade: são muitos. Infestam. Dão o tom de grande parte do que se diz na internet e, assim, espalham mundo a fora a impressão de que os humanos são seres maldispostos, malcriados, mal-amados, maus.

    Qualquer coisa que caia no grande caldeirão da internet servirá de alimento aos senhores das alcunhas, que se põem a mandar vir, muito machos, muito irónicos, muito cínicos (nem todo o cinismo é covarde mas toda a covardia é cínica) contra o que se escreve (ou contra o que eles lêem, que não são necessariamente a mesma coisa). É pena.

    (…) E que por cordialidade não se entenda medo de frontalidade e de espírito crítico. O que a cordialidade inibe não é o debate, mas a agressão. Mas como poderiam os pequenos canalhas abdicar da agressão se é precisamente para agredir que eles se escondem em alcunhas e, com a baba a cair-lhes da boca, digitam rancores mal resolvidos e anónimos contra tudo e contra todos?"

LER OS OUTROS

Vital Moreira escreve, no causa nossa, dois posts, cuja leitura sugerimos. Num post intitulado As dúvidas do PGR, Vital Moreira ajuda Souto Moura a esclarecer uma dúvida colocada pelo próprio: “Como é que um órgão de soberania responde perante outro, se não depende dele?” O professor de Coimbra, ainda que surpreendido com a questão, dá pistas para chegar à solução do problema: “Ora, que se saiba, a PGR não é nenhum órgão de soberania, pelo que a observação citada é perfeitamente descabida.

Num outro post (As nomeações), Vital Moreira alude às nomeações do Presidente da República para o Conselho Superior da Magistratura:

    'Ainda não foi desta que as duas nomeações presidenciais para o CSM prescindiram de incluir um magistrado (Laborinho Lúcio) -- embora neste caso com uma duradoura experiência de cargos políticos alheios à magistratura --, o que assegura assim a manutenção de uma maioria "corporativa" no Conselho, que Jorge Sampaio também já não tinha querido quebrar.'

Uma carta realmente importante

Esta carta foi dirigida ao Público. Um leitor divulgou-a numa caixa de comentários do CC. Poderá estranhar-se a circunstância de não lhe termos dado destaque. À primeira vista, parece uma forma desajeitada de pôr os jornalistas na ordem.

Mas uma segunda leitura do comentário produzido por Manuel Fernando dos Santos Serra, presidente do Supremo Tribunal Administrativo (STA), através da pena do seu chefe de gabinete, dissipa as dúvidas: “há muitos outros factos a noticiar, estes sim, de extrema relevância para a jurisdição administrativa e fiscal e cujo conhecimento aproveitaria, seguramente, a todos os cidadãos.

De facto, parece-nos que nem os leitores, nem os jornalistas têm razões para se abespinharem. Traduzindo as palavras do presidente do STA, não estará o Conselheiro Santos Serra a indicar aos jornalistas pistas de investigação, designadamente sobre a actividade dos tribunais administrativos e fiscais? Por exemplo, quanto tempo os tribunais administrativos demoram a decidir um simples recurso de anulação? Porque é que não se consegue obter uma decisão em tempo razoável? Quantos processos foram “findos” na sequência de amnistias? Qual é a produtividade dos magistrados?

Não serão estes os “factos a noticiar, estes sim, de extrema relevância para a jurisdição administrativa e fiscal e cujo conhecimento aproveitaria, seguramente, a todos os cidadãos”? Senhores jornalistas, toca a levantar o rabo da cadeira… Ao trabalho!