Era uma vez um governador

Quando Daniel Bessa soltou, no mês passado, umas baboseiras sobre o anterior governador do Banco de Portugal, Carlos Costa não só se manteve em silêncio como as imagens televisivas mostraram que o actual governador estava visivelmente divertido com os desbragados latidos do caniche de todos os donos. Era o período em que Carlos Costa chamava a si os louros de investigações alheias (v.g., dossiê Queiroz Pereira), a que nem a inacção perante vários factos que se iam conhecendo empalidecia a sua imagem pública laboriosamente construída.

Mas a realidade é tramada. O governador, que, ainda há menos de 15 dias, garantia na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública da Assembleia da República que o BES tinha uma «almofada» mais do que suficiente para tapar eventuais buracos e que, ao converter o Banco de Portugal num entreposto comercial, podia assegurar que os investidores estrangeiros faziam fila para se tornarem accionistas do banco, viu a realidade desabar em cima da sua cabeça. O Estado vai intervir no BES (como ontem aqui se tinha antecipado).

É tarde de mais para Carlos Costa procurar agora mostrar-se muito diligente. De resto, um homem que se permitiu estar seis anos como chefe de gabinete do comissário europeu João de Deus Pinheiro — que tinha a seu cargo o exótico pelouro da cooperação da União Europeia com os países de África, Caraíbas e Pacífico — não pode ter grande apreço pelo seu próprio trabalho. E isto explica muito.