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domingo, março 29, 2015

Sevinate Pinto (1946-2015)

Faleceu Armando Sevinate Pinto. Socorro-me das palavras de Augusto Santos Silva: «Era um profundo conhecedor da agricultura e do mundo rural e um defensor convicto e equilibrado do seu desenvolvimento. Vai fazer-nos bastante falta.» Ainda há cerca de um mês e meio, havia publicado A mais recente "fotografia" da agricultura (artigo do Público citado pelo CC).

O Eng. Sevinate Pinto estava afastado da actividade política desde que assinou o Manifesto dos 74, uma vez que então o Presidente da República o exonerou das funções de Consultor para os Assuntos Agrícolas e Mundo Rural da Casa Civil da Presidência.

quarta-feira, outubro 22, 2014

Fizeram uma escolha

• Pedro Nuno Santos, Fizeram uma escolha:
    «Nos debates sobre dívida pública, o governo português apresenta-se como querendo honrar os compromissos do Estado e pagar tudo o que deve. Tem moral quando o faz? - Não, não tem. Na realidade, o governo português decidiu "não pagar" parte dos salários dos funcionários públicos e parte das pensões de muitos pensionistas, em vez de tentar negociar a flexibilização das metas orçamentais ou uma nova estrutura para a nossa dívida pública.

    Negociar não significa conseguir o resultado pretendido, mas nem sequer tentar significa fazer uma escolha à partida - para honrar os compromissos internacionais, o governo escolheu não honrar os compromissos com uma parte significativa dos cidadãos portugueses. É uma opção política legítima, não podem é apresentar-se como os que honram todos os compromissos e contratos assumidos pelo Estado português.

    O haircut unilateral imposto sobre salários e pensões são uma violação dos contratos assumidos entre o Estado e os seus trabalhadores e pensionistas - podem alegar que se tivessem escolhido outra opção teria sido pior, não podem é dizer que "pagam" tudo. Também relativamente aos credores, o governo tem dois discursos diferentes, consoante sejam externos ou nacionais. Se por um lado não prevêem nenhuma negociação com os credores internacionais, já relativamente aos credores das câmaras municipais o governo entende que qualquer programa de resgate, no âmbito do Fundo Apoio Municipal, deve implicar uma negociação prévia, que pode implicar (i) alongamento dos prazos de pagamento, (ii) perdão de juros de mora, (iii) redução das taxas de juro ou (iv) perdão de capital em dívida.

    É o próprio secretário de Estado, António Leitão Amaro, que diz que "se os contribuintes fazem um esforço, é natural que os credores também o façam e, se calhar, é melhor receber 70% agora do que 100% daqui a três anos". E tem toda a razão. O governo não pode é acusar os outros de "não quererem pagar" quando é isso que faz com funcionários públicos, pensionistas e credores de autarquias. Fizeram uma escolha, têm de viver com ela.»

terça-feira, outubro 21, 2014

Manifesto dos 74 em plenário da Assembleia da República


    «Informamos que o debate em plenário da Assembleia da República, da petição do “Manifesto dos 74 - Preparar a reestruturação da dívida para crescer sustentadamente” será na próxima 4ª feira, 22 às 15:30 horas.

    Em Abril passado, na sequência do “Manifesto dos 74”, apresentámos uma petição à Assembleia da República, que foi subscrita, num curto espaço de tempo, por mais de 36 mil cidadãos.

    Como se referia quer no texto do Manifesto inicial, quer no da Petição, há hoje um consenso alargado na sociedade portuguesa que reconhece que nenhuma estratégia de combate à crise que enfrentamos será eficaz, se não assentar também na identificação das condições a que deve obedecer um processo de reestruturação da divida, no âmbito europeu.

    Temos razões acrescidas para crer que uma deliberação da Assembleia da República sobre tais condições não será um factor de fragilidade para o País. Pelo contrário, reforçará a legitimidade das instituições democráticas e a posição negocial do Estado Português junto das instâncias europeias.

    Cada grupo parlamentar terá três minutos de tempo de palavra e a votação será feita no dia seguinte, 5ª, 23 também a partir das 15:00 horas.

    O plenário é aberto ao público.

    Vimos, por isso, apelar a que, enquanto Cidadão, venha participar em mais este momento importante de um processo fundamental para o futuro do País, assistindo à discussão no Parlamento.»

quarta-feira, julho 23, 2014

Sobre os balanços dos bancos portugueses

• Pedro Nuno Santos, Preparemo-nos:
    «(…) O que já não se podia ignorar, por razões de seriedade técnica e política, era o impacto de uma reestruturação, com a dimensão da que precisamos, nos balanços dos bancos portugueses e a necessidade de estudar e apresentar uma resposta para esse problema. Não há reestruturações "sem espinhas" e já quase todos sabemos que a vamos ter de fazer. Preparemo-nos, então!»

domingo, julho 06, 2014

As origens da crise da dívida são essencialmente bancárias

Sejamos realistas: se nada for feito, a austeridade vai continuar por muitos anos; com a austeridade não haverá crescimento económico, e sem crescimento Portugal arrisca-se a não conseguir pagar o que deve. É mau para a zona euro mas pior ainda para os portugueses, que continuarão sufocados pelo garrote da dívida. A solução é dotar a União Europeia de mecanismos que permitam reestruturar a dívida pública criando a “folga” necessária ao crescimento. O Manifesto dos 74, que uniu personalidades portuguesas dos mais diversos quadrantes políticos, já tinha alertado para a imperiosa necessidade da reestruturação. João Cravinho, um dos mentores do documento, desmistifica as origens da crise da dívida (que são essencialmente bancárias); recorda exemplos históricos de reestruturação sem recurso à austeridade e analisa números e argumentos que sublinham a falta de credibilidade da estratégia oficial de redução da dívida. Há alternativas. Fiel ao espírito do manifesto reúne aqui três diferentes abordagens à reestruturação: a defendida por James K. Galbraith, Stuart Holland e Yanis Varoufakis, o ensaio PADRE e a solução proposta pelo Conselho de Peritos Económicos da Alemanha. Há outras saídas, mas na essência não diferem muito das apresentadas neste livro. O que falta é a coragem política de escolher um caminho. Nesse sentido "A Dívida Pública Portuguesa", antecipa a forçosa discussão sobre o tema que vai dominar a política portuguesa (e europeia) nos próximos anos.

domingo, junho 29, 2014

O homem que apanha sempre o comboio em andamento


Poderia dar vários exemplos das guinadas políticas do PS nestes três anos. Desde logo, a mudança de posição em relação aos pedidos de fiscalização sucessiva das normas inconstitucionais dos orçamentos do Estado (referida na epígrafe).

Mas, hoje, ouvi com algum espanto as declarações de António José Seguro sobre a renegociação da dívida: «Como é sabido há um consenso nacional e quem tem estado fora desse consenso é o Governo. Espero que o Conselho de Estado ajude e contribua para que o Governo entre para dentro deste consenso nacional e que possamos todos fazer o possível para aliviar os sacrifícios dos portugueses através de uma renegociação do pagamento da nossa dívida. Nós queremos pagar, queremos é melhores condições para o fazer».

Pode não haver um «consenso nacional», porque os interesses que o Governo representa são aliados dos credores externos para justificar a estratégia de empobrecimento. Mas há com certeza um consenso patriótico em torno da necessidade de reestruturar a dívida. Esse consenso teve a sua expressão pública no Manifesto dos 74.

Que posição tomou o PS em relação ao Manifesto? O secretário nacional Álvaro Beleza, falando em nome do partido, mostrou-se agastado com os seus subscritores, tendo tido o desplante de lhes fazer um convite pouco amistoso de adesão ao Novo Rumo: «Podem inscrever-se». Entre outros aspectos, foi este constante tacticismo que descredibilizou a actual direcção do PS.

sexta-feira, junho 27, 2014

O último subscritor do Manifesto dos 74


Técnicos do FMI chegaram à conclusão de que a reestruturação das dívidas dos países sob resgaste poderia ter evitado a devastação das suas economias — ou, pelo menos, poderia ter implicado benefícios «significativos», nomeadamente um ritmo de ajustamento orçamental menos violento. Na sequência da experiência europeia dos últimos anos, estes técnicos apresentaram ao conselho de administração do FMI um documento — The Fund's Lending Framework and Sovereign Debt — no qual defendem uma revisão das regras que são usadas nos seus resgates.

A notícia é dada hoje pelo Jornal de Negócios, que explica o que está em causa:
    «Segundo as regras de Washington, qualquer empréstimo significativo, como os que são necessários em crises de dívida, implica uma avaliação prévia da sustentabilidade das finanças públicas do país resgatado. Caso a análise conclua que a dívida é "sustentável com elevada probabilidade", a instituição pode emprestar sem problemas. Caso contrário, um empréstimo terá de ser precedido de uma reestruturação que garanta a sustentabilidade. Esta foi uma das novidades introduzidas em 2002 - após empréstimos do FMI no início da década à Argentina que acabou por reestruturar logo de seguida.

    O problema é que chegados a 2010, e dadas as dúvidas sobre a sustentabilidade da dívida grega, esta regra foi flexibilizada. Isto porque uma reestruturação na Grécia foi considerada como inviável do ponto de vista político na Europa, mas também - foi o argumento oficial - porque tal reestruturação poderia ter implicações sistémicas difíceis de antecipar.

    E foi assim que, argumentando com o elevado risco implícito numa reestruturação de dívida, o Conselho Executivo do FMI, então liderado por Dominique Strauss Khan, criou uma "excepção sistémica", que permitiu empréstimos à Grécia em 2010 mesmo com muitas dúvidas sobre a sua capacidade de pagar - o mesmo se passou depois com os resgates à Irlanda e a Portugal.

    Quatro anos volvidos, as lições começam a surgir. No ano passado, o FMI defendeu que deveria ter avançado com uma reestruturação de dívida na Grécia logo à cabeça E os dados que dispõe agora parecem apontar para vantagens de se ter avançado com um reescalonamento das dívidas portuguesa e irlandesa.

    Estas são conclusões que se podem tirar do artigo apresentado ao Conselho Executivo do FMI ("The Fund's Lending Framework and Sovereign Debt"), no qual se defende que a regra de 2002 se mostrou demasiado rígida por "implicar uma reestruturação de dívida definitiva, mesmo quando possa vir a revelar-se desnecessário" - acabando por motivar a excepção de 2010. Os técnicos do Fundo propõem assim que essa "excepção sistémica" seja eliminada, para dar lugar a uma regra que defina que, nos casos em que a dívida não seja "sustentável com elevada probabilidade", o FMI seja forçado a ponderar a imposição de um reescalonamento da dívida, ou seja, uma extensão de maturidades. Trata-se de uma reestruturação "light", com custos mais baixos para os credores privados, mas que reduz os riscos dos credores oficiais e ainda baixa as necessidades de financiamento nos primeiros anos, permitindo ajustamentos orçamentais mais suaves - o que teria ajudado nos últimos resgates.»

Que dirão agora todos aqueles que se atiraram com unhas e dentes ao Manifesto dos 74, vendo que o FMI está a pedir licença para se tornar o 75.º subscritor do Manifesto?

quarta-feira, junho 04, 2014

Beleza: mais uma pirueta


As incoerências de Álvaro Beleza acerca das eleições primárias [cf. aqui e aqui] aconselhariam a que ele tivesse direito a um merecido período de quarentena. No entanto, talvez porque não haja quem se disponha a dar a cara por Seguro, este secretário nacional do PS volta a ser hoje o porta-voz do delírio no Rato: «Eu defendo uma alternativa clara em que o PS seja o partido liderante da esquerda, que converse à esquerda, que faça tudo para que haja um governo com forças políticas à esquerda e que seja claramente alternativo à política deste Governo. O bloco central não faz bem à democracia e ao país.»

Esta impressiva declaração, contida numa entrevista ao Diário Económico da obscura Ongoing, contraria as recentes piscadelas de olhos entre Pedro Passos Coelho e António José Seguro. Mas o pior é que há um histórico que leva a inferir que este depoimento tenha tanta consistência como as cambalhotas sobre as eleições primárias. Querem ver alguns exemplos de pontes lançadas à esquerda nos últimos três anos? Veja-se:

1. O PS absteve-se na votação do Orçamento do Estado para 2012. Depois, quis impedir que fosse suscitada a fiscalização sucessiva das normas inconstitucionais. Carlos Zorrinho, presidente do grupo parlamentar, não poderia ter sido mais elucidativo: «A posição do PS sobre o Orçamento [do Estado para 2012] é muito clara: A prioridade é a fiscalização política do Orçamento. Por isso, nós, institucionalmente, demarcamo-nos totalmente desta iniciativa de alguns deputados do PS com o Bloco de Esquerda».

Foi preciso que o Tribunal Constitucional batesse forte e feio (ainda que sem efeitos práticos) no Orçamento do Estado para 2012 para que o PS aceitasse que a «fiscalização política», seja lá isso o que for, não esgotava a actividade que compete à Oposição.

2. Ainda recentemente, Angela Merkel desvalorizou as divergências entre o Governo e o PS, argumentando que «a oposição também apoia as medidas orçamentais», referindo-se implicitamente ao facto de o PS também ter subscrito o mal-afamado Tratado Orçamental.

De imediato, António José Seguro aproveitou a boleia de Merkel para desfazer as dúvidas suscitadas pelo alegado primeiro-ministro de que o PS se oporia a um consenso com o Governo em matéria de finanças públicas: «Não meta mais medo aos portugueses. Há pouco no debate que aqui se produziu o primeiro-ministro disse que era muito importante que houvesse um consenso no país para afastar as incertezas dos investidores», depois de já ter dito que o consenso já existe e foi reconhecido internacionalmente. Seguro referia-se às aludidas palavras da chanceler alemã relativamente ao entendimento entre o PS e Governo sobre o Tratado Orçamental.

3. A atrapalhação do PS face ao Manifesto dos 74 não escapou a ninguém. Entre silêncios e fontes não identificadas do PS a chutar para fora, acabou por sobressair, uma vez mais, Álvaro Beleza, que apenas foi capaz de atirar esta pérola: «Podem inscrever-se» no Novo Rumo.

A situação em que se encontra o PS — com a direita em mínimos históricos — é consequência de uma oposição timorata a um violento ataque ao Estado de direito. Os portugueses interiorizaram que, com mais ou menos afecto, a liderança de António José Seguro não tem capacidade para inverter o rumo dos acontecimentos. O propósito de o PS liderar um governo com forças políticas à esquerda deveria ter sido um caminho iniciado há três anos. Apresentado neste momento, não passa de um delírio de quem está manifestamente desorientado.

sábado, maio 03, 2014

Não há milagres... mas há o Manifesto dos 74


• Augusto Santos Silva, Não há milagres:
    «O Governo fez o contrário do que disse que faria. O compromisso do primeiro-ministro, de que não haveria desta vez aumento de impostos, foi reduzido a pó pelo Documento de Estratégia Orçamental (DEO). Há vários aumentos. Aumenta a taxa social única, na parte que é devida pelo trabalhador. Aumenta a taxa normal do IVA. E aumentarão vários impostos específicos sobre o consumo, em termos ainda por precisar.

    O significado de mais esta reviravolta não deve ser menorizado. Para todos os efeitos, e em português suave, Passos Coelho tentou enganar as pessoas. Em bom português, mentiu. Não é a primeira, nem a segunda, nem a terceira vez que o faz, desde o tempo inicial em que garantia que tudo se resolveria à custa das "gorduras" do Estado, estando salários e pensões a salvo de qualquer investida.

    O Governo deu também mais uma vez razão à ideia de que uns são filhos e outros enteados. Aumenta o IVA, aumenta a TSU, mantém a sobretaxa do IRS, vai aumentar outros impostos e taxas, mas baixou a tributação sobre os lucros das empresas.

    Ficam umas promessas, a mais importante das quais é muito nebulosa: os salários da Função Pública serão repostos no nível nominal de 2011 aí até 2019, embora evidentemente nada vá depender do atual Governo a partir de 2016 e pelo meio haja cortes nos suplementos e unificação da tabela salarial. Certa é a bandeira eleitoral para o próximo ano: a reposição de 20% dos salários e cortes menos profundos nas pensões. Basicamente, o Governo espera que alguns euros a mais nos bolsos das atuais vítimas principais (que são os funcionários e os reformados) possam diminuir a sua raiva; e conta, por outro lado, com uma relativa diluição dos efeitos contrários no conjunto dos contribuintes e consumidores.

    Veremos a seu tempo se isto terá algum seguimento. Mais importante, agora, é olhar para a questão de fundo. O que o DEO mostra, uma vez mais, é que, sem alterar a restrição orçamental em que nos movemos, estamos a condenar ao corte continuado dos rendimentos. Seja por via dos salários e pensões, seja por via dos impostos, é apenas disso que se trata: quebrar os rendimentos, isto é, fazer empobrecer. Ao mesmo tempo, reduzindo o serviço público em áreas tão importantes como a educação, a saúde e a proteção social, continuaremos a cortar rendimentos, apoios e oportunidades às pessoas e, em particular, às de menos posses.

    Ora, só podemos ultrapassar este fado triste e inútil se conseguirmos mudar o quadro orçamental. Podemos fazê-lo de três formas, que não são exclusivas. A primeira é intervir no denominador: fazendo crescer o produto, diminuímos o peso da despesa e o valor do défice, porque ambos são rácios do produto. Quer dizer: com políticas favoráveis ao crescimento e ao emprego (e nelas não se contam certamente aumentar o IVA e a TSU), melhoramos a situação orçamental.

    Asegunda forma é reduzir o serviço da dívida (que é superior a 4% do PIB anual). Podemos fazê-lo reduzindo as taxas de juros, alargando os prazos de pagamento ou reduzindo o montante a pagar. E a terceira forma é suavizarmos o processo de consolidação, tornando menos draconianas as metas de redução a cumprir ano a ano.

    A segunda e a terceira forma são as que permitem a parte mais substancial da folga de que precisamos para políticas económicas e de emprego. A possibilidade de usá-las depende da nossa vontade e capacidade para renegociar com as instituições europeias, agora que a troika se vai embora, as condições de pagamento da dívida pública portuguesa.

    Quer dizer: o conteúdo do DEO é a melhor prova da razão que assiste aos subscritores do Manifesto dos 74, o tal que pediu uma renegociação da dívida. É que, sem ela, não conseguiremos escapar a esta sina que nos obriga a escolher entre aumentar impostos ou diminuir salários. Não há milagres

sábado, abril 26, 2014

A mão de Aníbal


Não é preciso recordar que a mão de Aníbal esteve sempre atrás do arbusto a incitar a direita a alçar-se ao poder. E que, quando, no Verão passado, o Governo entrou em decomposição acelerada, ele pôs-lhe a mão por baixo, não o deixando estatelar-se na rua.

É este Presidente da República que, tendo patrocinado todas as atrocidades do Governo, aproveita a sessão comemorativa do 25 de Abril para incentivar os partidos políticos a um consenso. Ele já o vinha fazendo antes, quando pensava ser possível um consenso em torno da estratégia de empobrecimento do Governo.

Mas, entretanto, o clima político mudou. Este novo apelo de Cavaco acontece quando sucessivas sondagens mostram o crescente isolamento do Governo e um vasto conjunto de cidadãos (da direita à esquerda) apresenta uma política alternativa consubstanciada no Manifesto dos 74.

Ao ignorar o consenso a que a sociedade portuguesa chegou, este derradeiro apelo de Cavaco significa que ele não está disposto a deixar cair o Governo, após a saída da troika. Por outras palavras, Cavaco não quer antecipar as eleições legislativas, sem as quais não é possível superar o bloqueio político que paralisa o país e impede que o vasto compromisso que se foi tecendo na sociedade possa ser aplicado.

Na pior das hipóteses, este é o penúltimo «25 de Abril» em que temos de aturar este Presidente da República e este governo.

segunda-feira, abril 21, 2014

Dívida pública,
posição dos portugueses
e liberdade de imprensa

O jornalista deu-lhe este título (ontem no Negócios online):


A Cofina mandou substituir o título (hoje na edição em papel):


Independentemente de figurar no título da notícia o objectivo (a reestruturação) ou o método para o atingir (a renegociação), o que importa é que a maioria do povo português entende que a crise (primeiro a de 2008 e, depois, a do euro) que abalou o país, agravada pela estratégia de «ir além da troika» do Governo, tornou insuportáveis os actuais montantes, juros e prazos de pagamento da dívida:
    «A maioria dos portugueses que teve conhecimento do chamado manifesto 74 revê-se no apelo que aí é feito à reestruturação da dívida. Segundo uma sondagem da Aximage, realizada para o Negócios e para o “Correio da Manhã”, quase dois terços dos portugueses defendem o documento

segunda-feira, abril 14, 2014

Um final necessariamente infeliz

• João Galamba, Um final necessariamente infeliz:
    «Não há melhor exemplo da euforia irracional que se apoderou dos mercados da dívida do que ver um país que, quer em termos de PIB, quer em termos de desemprego, quer em termos de investimento está numa depressão económica, que tem um rácio da dívida pública em percentagem do PIB próximo dos 180% e que está em deflação fazer uma emissão de dívida pública no mercado primário com juros inferiores ao que tinha antes do início da chamada crise das dívidas soberanas e com uma procura quase sete vezes superior à oferta. Falo, como é evidente, da Grécia, que celebrou este estrondoso sucesso no mesmo dia em que via uma bomba explodir nas ruas da sua capital. Nem Fellini se lembraria de tamanha farsa.

    A Grécia é um excelente exemplo de como o que se tem passado nos mercados da dívida pública é uma típica bolha especulativa que não tem qualquer relação com os chamados fundamentais da realidade económica do país e que, mais cedo ou mais tarde, vai rebentar, porque é insustentável. A Grécia, para todos os efeitos, é um país falido, com uma economia devastada, com um tecido social à beira da rutura (se é que não passou já desse ponto) e que nunca poderá pagar o que deve sem uma radical inversão de política. Se é assim, como explicar a queda vertiginosa dos juros da sua dívida pública?

    Os juros descem na Grécia, descem em Portugal, descem em Espanha e descem em todos os periféricos. E descem tanto mais quanto mais altos estavam antes de toda esta euforia começar. Como mostrou o economista Paul de Grauwe, depois da garantia de Draghi de que o BCE faria tudo o que fosse necessário para evitar o desmembramento do euro, o que melhor explica a descida dos juros é o nível inicial desses mesmos juros: quanto mais alto era o nível, maior é a queda. E descem porque, fruto das políticas expansionistas dos bancos centrais, há um excesso de liquidez nos mercados, que, por não haver oportunidades de investimento real, tem forçosamente de ser investido no que resta, que são os ativos financeiros. Se juntarmos a isto a saída de capitais dos mercados emergentes, as baixíssimas taxas de rentabilidade disponíveis, torna-se mais fácil entender por que razão há tanta procura pela dívida pública dos países da chamada periferia: é o que permite garantir alguma rentabilidade num mundo financeiro que não pode existir sem essa rentabilidade. Num certo sentido, e independentemente da sua sustentabilidade, o investimento na dívida de todos estes países é feito por necessidade, não por escolha.

    Esta situação é o resultado inevitável da estratégia que consistiu em mobilizar todos os recursos públicos para inflacionar o preço dos ativos financeiros sem cuidar de reabilitar a realidade económica que lhe subjaz. Inundar o sector financeiro de liquidez ao mesmo tempo que se destrói a economia e a procura com políticas de austeridade tinha de resultar na criação de dois mundos, um mundo financeiro cheio de dinheiro para aplicar, outro com uma economia onde não vale a pena investir. Perante isto, o setor financeiro vê-se forçado a investir em si próprio e nos ativos que estão disponíveis. A bolha é, pois, o resultado racional de uma estratégia que é, em si mesma, irracional e que, mais cedo ou mais tarde, vai rebentar. Podemos adiar o confronto com a realidade, mas ele, em algum momento, terá de chegar: países com mais dívida e menos capacidade de a pagar não podem garantir um final feliz para esta história

quarta-feira, abril 09, 2014

Ler nas entrelinhas o recado da madame Lagarde

No dia em que a petição que propõe a reestruturação da dívida, com mais de 34 mil assinaturas, foi entregue na Assembleia da República, o FMI põe em relevo, ainda que involuntariamente, a inevitabilidade da reestruturação da dívida.

As contas do FMI vêm confirmar aquilo que já se sabia: o esforço que Portugal terá de fazer para conseguir chegar a 2030 com uma dívida de 60% do PIB é praticamente impossível. O nível de desempenho orçamental necessário é algo que o Estado português nunca conseguiu desde o final da década de 70, ou seja, para chegar aos 60% do PIB é necessário que o saldo primário estrutural (corrigido do ciclo e sem juros da dívida) pule dos 1,6% do PIB previstos para 2014 para uns inimagináveis 5,7% em 2020 e, depois, se mantenha nesse nível durante mais dez anos.

Acresce que o FMI projecta que, na maioria dos países da zona euro, «o ritmo de ajustamento se modere em 2014, uma vez que a maior parte do ajustamento necessário para atingir os objectivos de médio prazo já foi alcançado e a prioridade está a mudar para apoiar a recuperação, em linha com os objectivos de médio prazo acordados a nível europeu».

Qual é o «patinho feio» — que, segundo Pires de Lima, vá-se lá saber porquê — virou em «cisne elegante»? Portugal, entre outros países, cujo «ajustamento [ou seja, a austeridade] continuará a ser significativo».

Neste quadro de terror, é preciso que a madame Lagarde seja mais explícita para se perceber que a reestruturação da dívida é inevitável?

sexta-feira, abril 04, 2014

Complexo de Napoleão

«A minha opinião é muito semelhante à de Alexander Hamilton», atirou vagarosamente Vítor Gaspar no Fórum das Políticas Públicas, para assim se demarcar dos subscritores do Manifesto dos 74, que sustentam a inevitabilidade da reestruturação da dívida. Hamilton viria a morrer num duelo com Aaron Burr, então vice-presidente dos EUA, anos depois de ter sido o primeiro secretário de Estado do Tesouro.

É muito questionável a transposição mecânica da situação norte-americana do século XVIII para a Europa dos nossos dias, como avisam Francisco Louçã e Pedro Adão e Silva. Não se atrapalhando com minudências, Vítor Gaspar continua, agora nos EUA, a sua cruzada em defesa dos credores, brandindo o legado do malogrado Hamilton.

O encantamento do antigo ministro das Finanças por Alexander Hamilton surgiu, disse ele, depois de ter fugido do Governo, em Julho do ano passado, momento em que entendeu que «seria mais seguro» dedicar-se ao estudo de uma personalidade da história norte-americana. E avisou ao que vinha: «quando alguém mantém uma posição durante um par de anos é teimoso, quando a mantém por 20 anos é persistente, por mais de 50 anos é sábio e eu estou a caminhar no sentido da sabedoria.»

No meio desta história admirável, só é surpreendente que o recrutamento de dirigentes do FMI não contemple sequer um simples teste psicológico.

quinta-feira, abril 03, 2014

E pur si muove!


Soube-se ontem que o BPI vendeu de metade da posição detida em dívida pública de médio e longo prazo de Portugal e Itália, no valor nominal de 850 milhões de euros e 487,5 milhões de euros, respectivamente. O presidente do BPI justificou a operação com a circunstância de uma eventual nova crise poder provocar a queda do valor dos títulos, obrigando a «um aumento de capital só por causa da flutuação dos preços, mesmo que a dívida fosse paga quando chegasse à maturidade, em 2019».

Perante a alienação dos títulos e o fecho dos swaps de cobertura de risco de variação das taxas de juro, operação que se traduziu numa menos-valia de 102 milhões de euros depois de impostos, é difícil não admitir que as instituições financeiras se estão a antecipar a uma reestruturação da dívida no contexto europeu. Depois da reestruturação da dívida grega, o BPI parece querer atenuar as perdas que então sofreu.

quarta-feira, abril 02, 2014

O corte unilateral nos rendimentos de centenas de milhares
não travou o crescimento da dívida,
apenas destruiu economia e empobreceu os portugueses

• Pedro Nuno Santos, Agora, os cidadãos:
    «(…) Cansado e descrente no programa de ajustamento que Passos, Portas e Rangel defendem, o povo português percebeu que só com a reestruturação de uma dívida impagável se conseguirá acabar com a desculpa que a direita usa para continuar a impor ao país a sua agenda liberal e austeritária, perceberam que só reduzindo a dívida e a austeridade se conseguirá desbloquear o crescimento da economia e iniciar a recuperação económica. Não é a honestidade do povo português que está em causa mas sim assumir a incapacidade objectiva de virmos a pagar a divida na sua totalidade, não porque não queremos mas porque não é possível. Não se trata de nos dividirmos entre os que querem pagar e os que não querem, trata-se sim de fazer uma escolha e o governo já a fez: para não falhar um único cêntimo com os credores internacionais decidiu "não pagar" parte dos salários e das pensões aos trabalhadores do sector público e aos pensionistas. O problema da estratégia do governo é que o corte unilateral nos rendimentos de centenas de milhares de portugueses não travou o crescimento da dívida apenas destruiu economia e empobreceu os portugueses.»

domingo, março 30, 2014

Petição em defesa da reestruturação da dívida


Declamava ontem o pinguim estridente: o Manifesto dos 74 não «teve a adesão dos portugueses», «já saiu da agenda» e «ninguém fala dele». Ontem mesmo, o Manifesto foi transformado em petição e, em menos de 24 horas, já tinha obtido mais de quatro mil assinaturas — número mínimo exigido por lei para poder ser discutida na Assembleia da República. Hoje, às 20 horas, já tinham assinado a petição 12.949 pessoas.

Os peticionários pedem à Assembleia da República:
    • A aprovação de uma resolução recomendando ao governo o desenvolvimento de um processo preparatório tendente à reestruturação da dívida, com os fundamentos constantes do manifesto “Preparar a Reestruturação da Divida para Crescer Sustentadamente”;
    • A realização de um processo parlamentar de audição pública de personalidades relevantes para o objectivo em causa.

A petição pode ser subscrita aqui.

quinta-feira, março 27, 2014

Uma dívida, dois países

      Apesar de toda a austeridade que em 2015 já verá ascender a 17% do PIB, ou por causa dela, o défice continua elevado e a dívida pública portuguesa está hoje 15 pontos percentuais acima do previsto pela Troika há três anos

• Fernando Medina, Uma dívida, dois países:
    «(…) uma coisa é certa: a atual trajetória não é sustentável. Não há sociedade democrática nem perspetiva económica que sobrevivam durante muito mais anos a um horizonte sem qualquer esperança.

    Contra a mais elementar aritmética e contra o mais básico bom senso político, a maioria propõe-nos uma espécie de pensamento mágico: "Não falemos do problema que ele se resolverá por si". Esta posição, em completa contradição com o apoio alargado que gerou o manifesto "Preparar a Restruturação da Dívida, para Crescer Sustentadamente", significa que atingimos o grau zero das possibilidades de entendimento político no atual quadro parlamentar. De um lado, temos aqueles que olham para o problema da dívida; do outro aqueles que preferem iludi-lo, iludir-se ou iludir-nos.

    Os próximos confrontos eleitorais deverão ser esclarecedores acerca do lado para o qual pende a vontade dos portugueses. Porque há muito precisamos de uma frente política interna coesa, capaz de desenvolver, em Portugal e na Europa, a agenda de políticas com a ambição de inverter o declínio do país.»