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sábado, agosto 01, 2015

De mentira em mentira


• Pedro Silva Pereira, A confusão:
    «Vergonhosamente desmentido pelo próprio presidente da Comissão Europeia quanto à atitude de Portugal na crise da Grécia, Passos Coelho acusa Jean-Claude Juncker de fazer "confusão". Já vimos este filme: ele está sempre certo, os outros é que estão confusos.

    Convém lembrar que a história desta legislatura começou, justamente, com uma mentira de Passos Coelho. Como se recordarão, em Março de 2011, no auge da crise das dívidas soberanas, o Governo socialista tinha conseguido obter em Bruxelas o apoio dos parceiros europeus e do BCE para o chamado PEC IV, um programa de consolidação orçamental moderado mas necessário para poupar Portugal ao doloroso pedido de ajuda externa. Passos Coelho, porém, viu aí uma fantástica oportunidade de chegar ao poder e, indiferente às consequências, preferiu provocar uma crise política, provocando a demissão do Governo minoritário socialista. Para o sucesso eleitoral dessa operação, Passos precisava de um argumento forte, capaz de justificar a conivência silenciosa do Presidente da República e de suscitar a profunda indignação dos eleitores.

    Foi então que, com o maior dos descaramentos (lembram-se?), Passos resolveu inventar que só tinha sido informado das linhas gerais do PEV IV através de um simples "telefonema" do malvado primeiro-ministro socialista. Caiu o Carmo e a Trindade: um "escândalo!", uma "deslealdade institucional!", haveria de gritar a direita, numa campanha furiosa. Soube-se, depois, que era tudo mentira: afinal, antes da apresentação do PEC IV em Bruxelas, o próprio Passos Coelho, como líder da oposição, tinha sido convidado para ir ao Palácio de S. Bento e ali esteve, em pessoa, numa reunião de várias horas (!) com o primeiro-ministro, que lhe deu toda a informação disponível. De tão reveladora, esta história, absolutamente verdadeira, vale bastante mais do que mil palavras. E devia ter-nos preparado para o que viria a seguir.

    Não é por acaso que esta legislatura termina exactamente como começou, com Passos Coelho constantemente apanhado em explicações falsas ou trapalhonas e a ser vergonhosamente desmentido, em Portugal e no estrangeiro. Por cá, é o permanente "martelar" dos números do emprego, a despudorada negação da estratégia de empobrecimento e do apelo à emigração dos jovens (que tenta agora transformar num mero "mito urbano"), a narrativa aldrabada sobre as contas alegadamente "mal feitas" do memorando inicial (apesar de validadas pelo Eurostat...) para justificar a sua própria opção pela austeridade "além da troika" e as desculpas esfarrapadas para o falhanço colossal que é o enorme aumento da dívida pública nos últimos quatro anos (que disparou para os 129,6% do PIB).

    Mas, de entre todos, não haverá embaraço maior do que os sucessivos desmentidos que os principais responsáveis europeus têm vindo a fazer sobre as declarações de Passos Coelho quanto ao papel de Portugal na crise da Grécia. Na semana passada, foi o presidente do Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk - também andará confuso? - que se lembrou de vir explicar, com grande detalhe, que, por acaso, a ideia que esteve na base da solução para o último ponto do acordo com a Grécia foi originalmente sugerida pelo primeiro-ministro da Holanda, não por Pedro Passos Coelho. Esta semana, foi a vez do próprio presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, que veio arrasar a versão idílica de Passos Coelho sobre a pretensa "unanimidade" no Eurogrupo e sobre a alegada atitude "generosa e construtiva" de Portugal nas negociações, revelando que o próprio Passos Coelho se opôs, por mero calculismo eleitoral, a um compromisso calendarizado para resolver o problema estrutural da dívida grega. É caso para dizer que entre as eleições e a Grécia, Passos não teve dúvidas: que se lixe a Grécia!

    É certo, o Presidente da Repúbica, com aquele apurado sentido de isenção que se lhe reconhece, apressou-se a vir em defesa do Governo. E não fez a coisa por menos: a versão de Juncker "não corresponde à informação que me foi dada", garantiu ele. Dada por quem? Infelizmente, isso não disse. Mas como o Presidente da República, ao contrário de Juncker, não esteve lá, pode sempre acontecer que esteja a fazer alguma confusão

terça-feira, julho 07, 2015

Garotices irrevogáveis


    «O Presidente da Comissão Europeia parece que recuou no seu radicalismo, já não aceita que a Grécia saia do euro e quer negociações. O grupo dos socialistas europeus pede que respeitem resultado do referendo, recusa a saída do euro e também quer negociações. Os EUA e a China não querem a saída da Grécia e pedem um acordo. França, Itália, Chipre, Luxemburgo, idem.

    Parece que, afinal, o radical aqui não é António Costa, mas sim Paulo Portas, que insiste numa posição, essa sim, extremista e irresponsável.»

domingo, julho 05, 2015

«Não se deve apenas olhar para a Grécia
através do microscópio do FMI»

• Jacques Delors , Pascal Lamy e António Vitorino, UE e Grécia: mudar de óculos e continuar a odisseia:
    «(…) O drama grego não é nem será apenas nacional: tem e terá consequências no conjunto da Europa, da qual a Grécia faz parte integrante pela sua história, mas também pela sua geografia.

    Não se trata, pois, de perder tempo a medir as consequências económicas e financeiras mais ou menos limitadas de uma saída da Grécia da união monetária: trata-se de apreender a evolução da Grécia, numa perspectiva geopolítica, como um problema europeu que se manterá.

    Não se deve apenas olhar para a Grécia através do microscópio do FMI, é necessário olhar mas com "óculos onusianos", isto é, vermos que é um país que faz parte dos Balcãs cuja instabilidade não precisa de ser encorajada nestes tempos de guerra na Ucrânia e na Síria e, também, com o desafio terrorista — sem esquecer a crise migratória. Se continuarmos a insistir numa visão financeira, é indispensável sublinhar que a crise de liquidez actual da Grécia é consequência de uma crise de solvência, que por seu turno não é mais do que o sintoma de males bastante mais profundos: os que estão ligados às fraquezas de uma economia e de um Estado que é preciso reconstruir em todos os seus domínios, na base de reformas profundas, administrativas, judiciais, educativas, fiscais.

    Cabe à União Europeia assumir a sua parte nesta reconstrução, propondo à Grécia um plano global de três componentes. De um lado, uma ajuda financeira razoável para permitir à Grécia restaurar a solvabilidade no curto prazo. Do outro, uma mobilização de instrumentos da UE para reanimar a economia grega (fundos estruturais e de coesão, empréstimos do BEI, contribuições do Plano Juncker) e, portanto, o seu regresso ao crescimento, que reduzirá por si só o rácio dívida/PIB do país. Finalmente, colocando na ordem do dia, rapidamente, a avaliação do peso da dívida grega e das dívidas dos outros países “sob programa” num quadro europeu, desde que os compromissos com as reformas sejam mantidos. Só um tal plano global parece capaz de abrir perspectivas de esperança e de mobilização para o povo grego e para as suas autoridades, e, consequentemente, levá-los a um esforço de reconstrução de que o país precisa e do qual a União beneficiará. (…)»

quinta-feira, março 05, 2015

Também tu, Vítor Gaspar?


Vítor Gaspar desembarcou hoje em Lisboa para se distanciar das posições que os impedidos domésticos de Schäuble continuam defender:
    «A política monetária deve evitar inflação demasiado baixa ou deflação», pelo que «a política orçamental deve estar disponível para desempenhar um papel de suporte.» A esse respeito, o mais eficaz «é uma iniciativa a nível europeu, do qual o plano [de investimento] de [Jean-Claude] Juncker pode ser um embrião

quarta-feira, março 04, 2015

Os impedidos com rédea solta


O presidente da Comissão Europeia dá hoje uma entrevista ao diário El País. Eis uma passagem da entrevista, na qual Juncker mostra alguma surpresa perante o excesso de zelo dos impedidos às ordens de Merkel e Schäuble:
    El tradicional eje franco-alemán parece cosa del pasado. ¿Qué opinión le merece lo que Tony Judt denominaba “el inquietante poderío de Alemania”?

    Grecia es el ejemplo de que esa impresión acerca de que Alemania lidera Europa con mano de hierro no se corresponde con la realidad. Ha habido varios países más severos que Alemania: Holanda, Finlandia, Eslovaquia, los bálticos, Austria. En las últimas semanas, España y Portugal han sido muy exigentes en relación con Grecia.

quinta-feira, fevereiro 26, 2015

O regresso do homem protegido por um escudo invisível


A TSF anunciou de véspera que Barroso iria estrear-se na Universidade Católica. Esta rádio antecipou o evento: «A expectativa é elevada entre os alunos que falam de um protagonista europeu e não hesitam em dizer que durante a última década ele foi o homem do leme.» Hoje, a palestra foi gravada (pelo menos) pela SIC e noticiada de novo pela TSF.

Ninguém estaria certamente à espera que o anterior presidente da Comissão Europeia tomasse a iniciativa de aproveitar o momento para fazer uma declaração sobre as palavras de Juncker, que objectivamente põem em causa a sua acção em Bruxelas. No entanto, dado o impacto das palavras do actual presidente da Comissão Europeia, o que surpreende é a comunicação social, tendo ali à mão Durão Barroso, não o ter compelido a pronunciar-se.

Afinal, quando Juncker afirmou que «Pecámos contra a dignidade dos povos da Grécia, Portugal e Irlanda», a Comissão Europeia era dirigida por um… português. Um tal Barroso.

sábado, fevereiro 21, 2015

quinta-feira, fevereiro 19, 2015

Uma coligação a duas vozes

    PSD: «É uma declaração bastante infeliz».
    CDS: «Críticas de Juncker à 'troika' coincidem com alertas do CDS»

Vende-pátrias



Os atentados contra a dignidade de Portugal (e também da Grécia e da Irlanda) foram cometidos com o alegado primeiro-ministro a alinhar na festa. Mais: com Passos Coelho a impor uma política de «ir além da troika».

sexta-feira, janeiro 30, 2015

A batalha de Atenas


• Pedro Silva Pereira, A batalha de Atenas:
    «(…) Uma das mais consensuais lições da desastrosa resposta da Europa à crise das dívidas soberanas é esta: teria sido melhor cortar o mal pela raiz. De facto, a recusa inicial da solidariedade europeia, imortalizada pelo slogan "nós não somos a Grécia!", deixou as dívidas soberanas à mercê da especulação financeira e, ao invés de "acalmar os mercados", consentiu num efeito dominó de consequências devastadoras. É certo, a zona euro enfrentou essa crise com a fragilidade inerente às insuficiências da União Económica e Monetária, que só progressivamente foi conseguindo suprir por via de novos instrumentos de governação económica e intervenção financeira. Mas não é menos verdade que enfrentou esta crise fortemente condicionada também por uma cegueira ideológica austeritária, que muitas vezes se escondeu por trás de interpretações restritivas (hoje reconhecidamente falsas) dos Tratados, do próprio mandato do BCE e até das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Acontece que nada no Tratado de Lisboa obriga as instituições europeias a exercer as suas competências apenas quando o fracasso é evidente e a situação se torna desesperada. Quer isto dizer que a União Europeia, não obstante todas as limitações, podia e devia ter feito mais. E teria poupado muito dinheiro e muitos sacrifícios se tivesse agido de uma forma mais coesa e solidária logo desde o início, quando se declarou a crise grega.

    Agora que, cinco anos depois, um novo Governo grego procura na Europa um novo compromisso político no quadro do euro, veremos se os parceiros europeus tratam o senhor Tsipras com a mesma atitude com que trataram em 2010 o primeiro-ministro George Papandreou. Ficaremos a saber nessa altura se aprenderam alguma coisa.»

sexta-feira, janeiro 16, 2015

Melhor que nada

Passos Coelho, sempre fiel à "linha dura", a ver os dogmas
em que se fundou a política de austeridade a cair uns atrás dos outros

• Pedro Silva Pereira, Melhor que nada:
    «Depois de cinco anos de política de austeridade, a Comissão Europeia clarificou os termos em vai finalmente adoptar uma leitura mais flexível das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Não sendo suficiente, é alguma coisa. E é certamente mais do que Passos queria.

    Os dogmas em que se fundou a política de austeridade, que orientou a resposta errada da União Europeia à crise financeira, estão a cair uns atrás dos outros. Afinal, nem o mandato do BCE impedia uma resposta mais eficaz à especulação instalada nos mercados de dívida soberana, nem as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento são incompatíveis com uma política orçamental menos danosa para a economia e para o emprego .Sem alterar uma vírgula no Tratado de Lisboa ou nas regras do Pacto, o tom da resposta europeia à crise começa a mudar: primeiro, graças à política monetária expansionista do BCE (em breve reforçada com um programa de Quantitative Easing); depois, pela nova orientação da Comissão Juncker, com o seu plano de investimento (público e privado) e a sua abertura à flexibilidade orçamental.

    Duas razões explicam esta evolução. A primeira, é a própria evidência do fracasso da política de austeridade. A segunda, é a forte pressão política dos socialistas em todas as frentes da política europeia: no Parlamento Europeu (em que o seu voto é decisivo); no Conselho (graças à liderança de Matteo Renzi na presidência italiana) e no interior da Comissão (desde que o socialista francês Pierre Moscovici substituiu o liberal Olli Rhen nos assuntos económicos). Não será ainda a mudança de que a Europa precisa mas é bastante melhor do que tínhamos com a Comissão Barroso - que era nada.

    Finalmente, a "flexibilidade" orçamental deixou de ser um conceito vazio para ganhar sentido e substância, embora com latitude diferente para quem esteja ou não em défice excessivo. Doravante, a Comissão promete tomar em conta o contexto do ciclo económico e a realização de reformas estruturais na ponderação dos esforços orçamentais de cada país e mesmo na permissão de desvios em relação às metas do défice. Mas também promete uma política orçamental mais amiga do investimento, por duas vias: primeiro, não contabilizando no défice as contribuições dos Estados para o novo Fundo europeu de investimento; segundo, adoptando uma interpretação mais generosa da chamada "cláusula de investimento" de modo a permitir que os Estados que não estejam em défice excessivo se desviem temporariamente das metas do défice para aumentarem o investimento público. Esta evolução, embora ainda tímida e compromissória, é da maior importância também para Portugal. É certo que a nova formulação da "cláusula de investimento" não permite aos Estados em situação de défice excessivo, como é o nosso caso, isentar do défice a comparticipação nacional dos projectos financiados com fundos comunitários da mesma forma que se isentam as contribuições para o Fundo europeu de investimento - um manifesto absurdo, que importa corrigir.

    Mas, além das vantagens indirectas que sempre virão para as exportações portuguesas de políticas orçamentais menos restritivas dos nossos parceiros europeus com mais margem de manobra, Portugal beneficia directamente de três importantes implicações desta nova flexibilidade: primeiro, pode desde já aceder a um calendário de ajustamento mais alargado em contrapartida da realização de reformas estruturais; segundo, as suas metas passam a ser definidas e avaliadas ponderado o impacto orçamental das quebras da actividade económica que escapem ao controlo do Governo; terceiro, a despesa pública que Portugal fizer em contribuição para o Fundo europeu de investimento não será contabilizada para o défice. Tudo isto, é claro, Passos Coelho combateu, sempre fiel à "linha dura" da austeridade. Mas de tudo isto Portugal poderá beneficiar, apesar dele.»

sexta-feira, dezembro 12, 2014

Santa ignorância!


• Pedro Silva Pereira, Santa ignorância!:
    «Ao recusar a ideia de que as contribuições dos Estados para o plano de investimento europeu não devem contar para o cumprimento das metas do défice, Passos Coelho exibiu toda a sua ignorância e colocou Portugal, uma vez mais, do lado errado na Europa.

    Comecemos por sublinhar a importância do que está em causa. Confrontada com o cenário de uma estagnação prolongada e ameaçada por riscos persistentes de deflação e de uma nova recessão, a União Europeia percebeu que a recuperação da sua economia não pode continuar a depender apenas da política monetária expansionista do Banco Central Europeu (BCE), mesmo que reforçada por novos instrumentos não convencionais do tipo Quantitative Easing: precisa, urgentemente, de mobilizar também a sua política orçamental e de investimento a favor do crescimento e do emprego. Isso mesmo foi pedido pelo próprio Mario Draghi, presidente do BCE, no seu famoso discurso de Jackson Hole e tem sido insistentemente reivindicado pelo grupo parlamentar dos Socialistas e Democratas (S&D) no Parlamento Europeu. Correspondendo a esses apelos, o novo Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, apresentou uma proposta de Plano de Investimento que pretende viabilizar um investimento adicional de 315 mil milhões de euros nos próximos três anos, a partir de um novo Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos. Todavia, Juncker apenas conseguiu garantir para esse Fundo uma dotação de 21 mil milhões de euros, dos quais 16 são verbas desviadas de outras rubricas já previstas no orçamento comunitário e apenas 5 constituem esforço adicional do Banco Europeu de Investimento. Tudo o mais, que é bastante, assenta numa generosa expectativa de "alavancagem" por via da mobilização de um volume imenso de investimento privado, em que nem os mais optimistas acreditam. Assim sendo, já se vê que o sucesso do Plano depende, em larga medida, da capacidade de complementar a dotação do Fundo com contributos financeiros dos Estados-membros, o que só será possível ao abrigo de uma interpretação flexível das regras orçamentais relativas à redução do défice. Todos na Europa já perceberam isso, Passos Coelho ainda não.

    Para sustentar a sua recusa da ideia de que "certas despesas não deviam contar para o défice", Passos Coelho apresentou não propriamente um "raciocínio" mas dois argumentos básicos. O primeiro, expressou-o assim: "A gente pergunta: mas a despesa de investimento não é para pagar?". A resposta do próprio foi taxativa: "Se for para não pagar, não conta para o défice; mas se for para pagar, tem que contar!". Como é evidente, porém, uma coisa não tem nada que ver com a outra. É óbvio que todas as despesas têm que ser orçamentadas e pagas. E ninguém propôs que as contribuições dos Estados para o Fundo "não contassem" para o défice. Essas contribuições, uma vez registadas como despesas, devem ser devidamente contabilizadas pelo Eurostat no apuramento dos défices. O que está em causa é uma coisa muito diferente: não valorar (negativamente) essas despesas de investimento na avaliação do cumprimento das metas de redução do défice no contexto do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Será isto assim tão complicado?


    O segundo argumento de Passos Coelho não revelou nem mais elegância nem mais conhecimento do assunto. Disse ele: "Há políticos em Portugal que querem para o futuro da Europa aquilo que nos legaram em Portugal: desorçamentação, PPP, contas aldrabadas...". Como de costume, os espíritos sempre ansiosos por este discurso panfletário não desperdiçaram tempo a pensar. Helena Matos, por exemplo, correu a escrever no Observador: "... voltamos a ouvir o canto das sereias com propostas de desorçamentação como a formulada por António Costa para que a comparticipação dos Estados-membros para o plano europeu para o investimento estratégico não seja contabilizada para apuramento do défice" (7-12-14). Sucede que bastaria a um e a outro um bocadinho menos de ignorância para saberem que esta proposta não é de António Costa, nem de certos "políticos em Portugal", mas sim do próprio Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. Na verdade, logo no discurso de apresentação do Plano, diante do Parlamento Europeu, Juncker foi absolutamente claro: "se os Estados-membros trouxerem capital para o Fundo, nós não tomaremos em conta essas contribuições nas nossas avaliações ao abrigo do Pacto" (26-11-14). E o mesmo escreveu a Comissão na Comunicação em que propõe "Um Plano de Investimento para a Europa": "... na avaliação das finanças públicas no contexto do Pacto de Estabilidade e Crescimento, a Comissão terá uma posição favorável relativamente a esses contributos de capital para o Fundo" (COM (2014) 903 final, pág. 7). Acreditem ou não, é esta proposta que o Presidente da Comissão Europeia vai levar ao Conselho Europeu da próxima semana e, ou muito me engano, ou é exactamente esta proposta que Passos Coelho vai aprovar de cara alegre. Depois de engolir a conversa das contas aldrabadas e de alguém lhe explicar melhor a lição

sexta-feira, novembro 28, 2014

Juncker e o multiplicador


• Pedro Silva Pereira Juncker e o multiplicador:
    «O plano de investimento apresentado esta semana por Jean-Claude Juncker é pouco mais do que uma farsa e fica muito aquém dos mínimos indispensáveis para ser credível como alavanca decisiva da recuperação da economia europeia.

    Foi em nome de uma "mudança" na política económica, necessária para obter o apoio do Parlamento Europeu, que o novo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, anunciou um plano de investimento de pelo menos 300 mil milhões de euros de investimento adicional para os próximos três anos (2015-2017). Como ele próprio explicou antes ainda de tomar posse, seria "dinheiro novo", a somar ao já previsto, de modo a fazer a diferença no crescimento económico e na criação de emprego. O que foi apresentado, porém, foi muito diferente: a criação, no âmbito do Banco Europeu de Investimento (BEI), de um novo instrumento financeiro, o Fundo Europeu para os Investimentos Estratégicos (EFSI, na sigla inglesa), financiado por apenas 21 mil milhões de euros, dos quais 16 mil milhões, em forma de garantias, vêm do actual orçamento comunitário (e não são, por isso, dinheiro novo) e 5 mil milhões vêm de um esforço adicional do próprio BEI. O resto, necessário para perfazer o total de 315 mil milhões de euros de que agora se fala, é pura ficção científica e assenta numa estimativa totalmente absurda que calcula que por cada euro de dinheiro público surgirão, por artes mágicas, nada menos de 15 euros de investimento privado.

    Nunca se viu tal coisa e por boas razões, que todos os economistas conhecem: nunca aconteceu porque pura e simplesmente não é possível.

    Não há, pois, como ignorar a evidência: todo o plano de Juncker assenta num multiplicador absurdo, que foi "martelado" até dar o resultado que era preciso. E o resultado foi um inacreditável "factor 15", em que ninguém pode, com seriedade, acreditar. Aliás, poucos dias antes da divulgação do plano, o sóbrio Financial Times, comentando rumores que davam por certo que a Comissão se preparava para apresentar um plano assente numa alavancagem de factor 10, fazia notar a opinião de vários observadores que, à luz da experiência, consideravam esse cálculo como "muitíssimo optimista". Ora, se um factor 10 seria optimista, um factor 15 aproxima-se perigosamente de um insulto à nossa inteligência. Juncker vai ter que fazer melhor se quiser convencer alguém de que está aqui para combater a estagnação da economia europeia, que ameaça todo o projecto europeu.

    PS - Sobre a detenção do meu amigo e ex-primeiro-ministro José Sócrates, já fiz a declaração pública que entendo dever fazer nesta altura. Espero que o funcionamento da Justiça permita fazer luz sobre a verdade. E a Justiça, para merecer esse nome num Estado de Direito, tem regras: não se faz na praça pública, convocando um circo mediático e permitindo fugas de informação selectivas para os jornais; nem se faz com julgamentos precipitados, sem conhecer as provas, sem apurar todos os factos e sem ouvir sobre eles todas as partes. Quanto ao mais, saiba-se que acompanho a separação de águas definida pelo secretário-geral do PS. E o resto já foi dito pelo professor Vital Moreira, aqui no Diário Económico (26-11-2014) e no blog Causa Nossa, imperdível como sempre.»

sexta-feira, novembro 14, 2014

O teste de Juncker


• Pedro Silva Pereira, O teste de Juncker:
    «Jean-Claude Juncker esteve longe de ser convincente nas explicações que deu sobre as práticas fiscais do Luxemburgo e menos ainda sobre as iniciativas que vai tomar para combater a evasão fiscal na Europa. Mas o seu teste decisivo será outro e vem já a seguir: o plano de investimento que prometeu para relançar a economia europeia.

    Ao comparecer voluntariamente perante o Parlamento Europeu para responder sobre o escândalo dos contratos secretos que permitiram ao Governo do Luxemburgo, sob a liderança do próprio Juncker, proporcionar uma escapatória fiscal milionária a centenas de grandes empresas, o Presidente da Comissão Europeia reconheceu duas coisas: primeiro, o poder de fiscalização política do Parlamento Europeu e a sua crescente relevância no funcionamento democrático das instituições europeias; segundo, o enorme embaraço causado pelo caso "LuxLeaks" e pelas chocantes revelações sobre as práticas da chamada "tax avoidance" no Luxemburgo. Se o problema da conformidade destas práticas fiscais com o direito europeu foi remetido para uma "investigação aprofundada" a cargo da própria Comissão (com juras de não interferência por parte de Juncker), o programa de acção que o Presidente da Comissão Europeia esboçou para o futuro ficou muito aquém das expectativas, apesar das proclamadas intenções de mais transparência e do enigmático propósito de maior harmonização das regras fiscais "sem eliminar a competitividade fiscal". Uma coisa é clara: Juncker vai ter de fazer bastante mais e melhor. E é bom que perceba que os cidadãos europeus, a quem foram pedidos enormes sacrifícios ao longo destes anos, têm todo o direito a exercer "tolerância zero" perante estes esquemas obscuros que, no fim de contas, acabam por obrigar os mesmos de sempre a pagar os impostos que deviam ser pagos por quem mais pode. Sem prejuízo da centralidade deste tema da equidade fiscal, o teste político verdadeiramente decisivo para a nova Comissão Europeia é o que se prevê para as próximas semanas: a apresentação do plano de investimento de 300 mil milhões de euros que Juncker anunciou para antes do Natal. Na verdade, jogando-se aí a credibilidade do programa de Jean-Claude Juncker para a recuperação da economia europeia, é também aí que se joga o futuro da nova Comissão - e, em boa parte, do próprio projecto europeu.

    A experiência de recuperação de crises financeiras, bem documentada por abundante literatura económica, e as especificidades da situação que se vive na Europa, permitem concluir que há cinco condições essenciais que o plano de investimento de Juncker deve preencher para estar à altura da ambição de provocar o impulso de que a economia europeia precisa: primeiro, é preciso que seja suficientemente volumoso e que seja capaz de mobilizar, com eficácia, as diversas fontes de financiamento relevantes (não basta mudar o nome aos envelopes financeiros já existentes...); segundo, é preciso que inclua uma componente significativa de investimento público, devidamente articulada com a prometida "flexibilização inteligente" das regras orçamentais (única forma de não ficar prisioneiro da falta de confiança e de iniciativa do sector privado, bem como das limitações do crédito bancário); terceiro, é preciso que saiba definir as prioridades estratégicas certas, orientadas para a criação de emprego e para o futuro da competitividade da economia europeia (na linha da Estratégia 2020 e de um novo pacote ambicioso para o Clima e Energia); quarto, é preciso que assuma uma aposta clara na coesão social e territorial (contrariando o agravamento das divergências económicas e sociais na União Europeia e na zona euro, que estão a minar o projecto europeu); quinto, é preciso que promova uma célere implementação dos projectos de investimento (articulando-se, onde necessário, com a simplificação dos procedimentos burocráticos), de modo a permitir um suficiente sentido de urgência na resposta aos desafios do crescimento e do emprego.

    Em breve saberemos se o plano de investimento de Juncker está à altura do desafio. E nessa altura ficaremos a saber também se a nova Comissão Europeia tem futuro.»

terça-feira, outubro 28, 2014

Os dias do fim

• Mário Soares, O petróleo em queda:
    «(…) a grande maioria dos portugueses, de todas as profissões, ricos e pobres, e mesmo da classe média, que está a desaparecer, estão contra o governo. Ninguém de boa-fé o tolera. Há ministros que revelam ser incapazes - como são os caso do da Educação, da Justiça, da Defesa, da Saúde e de alguns mais. Não vale a pena continuar. Os dois primeiros citados são inaceitáveis. Ninguém os leva a sério. No entanto, mesmo no caso da Educação e da Justiça, que terão querido demitir-se, Passos Coelho quis que ficassem. Porquê? Ninguém o pode explicar. Talvez porque o primeiro-ministro saiba que não pode durar muito tempo, não chegará a uns meses e acha que não vale a pena. As vaias a que é submetido todos os dias, ouve-as como se não fosse nada com ele...

    Deve ser o mesmo juízo que fazem o Presidente da República e o inqualificável presidente do Banco de Portugal. É certo que todos têm culpas no cartório e vão acabar mal... Mas Portugal está infelizmente a ficar cada vez pior. (…)»

quarta-feira, outubro 22, 2014

Da série "Frases que impõem respeito" [881]


Àqueles que pensam que excessiva austeridade leva automaticamente à melhoria da economia e à criação de postos de trabalho, devo dizer-lhes que devem abandonar essas ideias. O desaparecimento do défice e da dívida não leva automaticamente ao crescimento, ou a Europa estaria a crescer imenso.

segunda-feira, setembro 15, 2014

Reformas estruturais -- basicamente partir a espinha
do "factor Trabalho", dos desempregados e dos envelhecidos

    «(…) # a austeridade faliu por completo nos seus propósitos e Draghi tem procurado preencher o buraco desde Nov de 2011 injectando dinheiro barato nos bancos, mas, mesmo assim, por esse "canal de transmissão", a coisa não chega à economia real; Draghi deu mais um passo em junho e agora em setembro e até prometeu comprar dívida privada a partir de outubro (a tal coisa dos ABS) e injetar mais massa a partir da próxima semana em novas linhas de refinanciamento para os bancos, na esperança de...

    # mas ele não quer ficar sozinho a lançar massa, os outros têm de começar a fazer a parte deles; e, então, resolveu chegar-se à frente, armar-se em político, e promover um compromisso: eu meto a massa nos bancos e no sistema, um bodo de mais 1 bilião de euros, o Jean-Claude Juncker dá massa a partir da Comissão (por vários canais), mas vocês metem as reformas estruturais em campo e depois a gente vê a forma de "flexibilizar" essa coisa da margem orçamental (de abrandar o cumprimento do tratado orçamental).

    # a matriz do pensamento dos banqueiros centrais como Draghi e do grupo que ainda domina o FMI, como a Madame Lagarde, bebe nessa coisa das reformas estruturais -- basicamente partir a espinha do "factor Trabalho", dos desempregados e dos envelhecidos, e obrigar a um processo acelerado de reorganização dos grandes grupos económicos e financeiros, redistribuindo as margens de rendas financeiras e os quintais de cada um; para esse grupo da elite que manda isso é mais importante do que a própria austeridade (sobretudo quando esta é um fiasco como logo Olivier Blanchard do FMI começou por mostrar com aquele coisa dos "multiplicadores", ou como politicamente se começou a ver que deu cabo da classe média e produziu um eleitorado estilhaçado em que correntes fora do 'centro' que fundou a CEE e a UE vão crescendo e ameaçam a tal de "estabilidade governativa"). (…)»