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quarta-feira, novembro 11, 2015

Salário mínimo: dignidade e bom senso


• Alexandre Abreu, Salário mínimo: dignidade e bom senso:
    «(…) Sucede que a literatura económica não apoia a conclusão que o salário mínimo provoca desemprego. Do ponto de vista teórico, o impacto de variações no salário mínimo sobre o emprego é indeterminado: se à escala de cada empresa um SMN maior tenderá a implicar, com tudo o resto igual, menor disponibilidade para empregar, o mesmo não sucede à escala da economia como um todo, uma vez que a alteração resultante na distribuição do rendimento tenderá a alterar a procura no mercado de bens, traduzindo-se num aumento da procura no mercado de trabalho. Já do ponto de vista empírico, como referiu entretanto Pedro Pita Barros aqui, os estudos existentes sobre a relação SMN-emprego são inconclusivos – acrescendo, digo eu, o facto da maior parte desses estudos (como é o caso do que referi no início deste artigo) não ter em conta o efeito expansivo da alteração na distribuição do rendimento, via procura no mercado de bens, na procura de mão-de-obra, pelo que são tendencialmente enviesados pela negativa. Em suma, o argumento em contrário – a destruição de emprego – é, além de cínico, desprovido de sustentação.

    Regressemos por isso ao essencial. O aumento do salário mínimo é uma questão de decência e dignidade básicas. Visa evitar que quem vive do seu trabalho viva na pobreza e visa evitar que quem contrata possa aproveitar o desemprego generalizado para explorar de forma inaceitável. Na distribuição funcional do rendimento, o aumento do SMN irá com certeza aumentar a componente salarial à custa do excedente de exploração – e ainda bem que o fará, pois estará a recuperar rendimentos para quem mais tem sido penalizado nos últimos anos, corrigindo um grave desequilíbrio introduzido pelo último governo. Contribuirá de forma efectiva para reduzir a desigualdade, que a direita lamenta nas palavras mas promove nos actos. E implicará certamente um aumento da procura no mercado de bens, a qual – perguntem aos empresários (aqui, página 10) – é há muito o principal factor limitador das intenções de investimento em Portugal.

    Quanto aos economistas que tão preocupados se mostram com o efeito do salário mínimo sobre o emprego, gostaria de tê-los visto igualmente empenhados na crítica às medidas recessivas adoptadas nos últimos anos, que – essas sim – lançaram no desemprego centenas de milhares de pessoas. Talvez estivessem então demasiado ocupados a louvar a austeridade expansionista e as virtudes da desvalorização interna...»

quarta-feira, novembro 04, 2015

Partidas simultâneas


• Alexandre Abreu, Partidas simultâneas:
    «(…) O segundo objectivo consiste em demonstrar a viabilidade política de um governo apoiado por uma maioria parlamentar que englobe o PS e os partidos à sua esquerda. Esta solução governativa constitui uma ameaça tanto maior para a direita e para as elites que esta representa quanto a geometria que consubstancia venha a consolidar-se no futuro. É por isso que a direita aposta tudo em que corra mal, através da dissidência de uma ou mais das bases de apoio desta solução política. E fará tudo – na comunicação social, na presidência da república e onde mais puder exercer pressão – para corroer a solidez desta aliança, deturpando palavras e intenções e promovendo a dissidência. É exactamente por esse motivo que a solidez desta aliança é crucial, e que a lealdade de todas as partes é fundamental. (…)»

quarta-feira, outubro 28, 2015

Pode a esquerda romper com a austeridade?


• Alexandre Abreu, Pode a esquerda romper com a austeridade?:
    «(…) Em diversos sentidos muito importantes, é possível romper de forma significativa com a austeridade mesmo dentro dos constrangimentos do euro, da dívida e das regras europeias. Os planos principais em que estes constrangimentos se fazem sentir são, por um lado, a pressão sobre o orçamento (directamente por via das regras e indirectamente por via do serviço da divida) e, por outro lado, o equilíbrio das contas externas (por causa da inexistência de autonomia cambial). E quer num plano quer no outro, é possível fazer diferente, e muito melhor, do que a direita.

    No plano orçamental, vale a pena recordar que é possível alcançar o mesmo saldo com diferentes combinações de receita e despesa – sendo também conhecido, inclusivamente por via de análises empíricas do próprio FMI, que em contextos de forte subutilização da capacidade produtiva o multiplicador da despesa é muito maior do que o multiplicador da receita. Isto significa que o mesmo resultado orçamental será menos recessivo se alcançado através de aumentos de impostos do que de cortes da despesa – e mais expansivo se obtido mediante aumentos da despesa do que de cortes de impostos.

    Sabendo-se entretanto que a carga fiscal é já extremamente elevada, sobretudo para a classe média, a forma socialmente mais justa e economicamente mais eficaz de fazê-lo será através do aumento da tributação sobre os mais ricos, não só em sede de IRS (que tributa o fluxo) como incidindo também sobre a riqueza (o stock). Para um mesmo saldo orçamental, conseguir-se-á assim não apenas mais justiça social, corrigindo a iníqua distribuição dos sacrifícios que tanto agravou a pobreza e a desigualdade nos últimos quatro anos, como um melhor desempenho macroeconómico, dado o mais elevado multiplicador orçamental da despesa e e a maior propensão para o consumo dos grupos de menor rendimento. As medidas de redistribuição não se limitam a promover a justiça social; são também expansivas do ponto de vista macroeconómico.

    Mas a esquerda pode também fazer melhor ao nível das contas externas, mesmo dentro dos constrangimentos conhecidos. Neste domínio, a estratégia da direita (a chamada desvalorização interna) consistiu em promover a desvalorização dos salários em toda a economia (tanto no sector exportador como não-exportador), de modo a alcançar ganhos de competitividade externa, a par da redução das importações por via da compressão do poder de compra. Esta estratégia revelou-se não só socialmente nefasta e injusta, prejudicando os trabalhadores, como também em larga medida contraproducente (pois acentua a recessão, na medida em que os salários são uma componente central da procura interna). Mesmo na ausência de instrumentos mais adequados (designadamente a moeda própria), a actuação da esquerda deve distinguir-se por ser muito mais direccionada para o sector exportador, através do apoio à inovação e à inserção internacional e através da redução dos custos não-laborais. Há muito que pode ser feito para promover o equilíbrio das contas externas sem por em causa os salários.

    Mas acima de tudo, a esquerda pode e deve romper com a austeridade mesmo sem por em causa os compromissos internacionais porque, em última instância, a austeridade não é uma questão meramente macroeconómica, mas uma questão de justiça e injustiça social. Mais do que um qualquer saldo orçamental, austeridade significa ataque ao estado social, redução dos apoios sociais e corte dos salários e pensões. É outro nome para o aprofundamento da desigualdade em benefício dos interesses particulares das elites. E se o euro, a dívida e as regras europeias limitam os ganhos que podem ser alcançados a esse nível, não impedem que se detenha e comece a inverter o rumo de degradação a que temos sido sujeitos.»

quarta-feira, setembro 30, 2015

O fim do pesadelo

• Alexandre Abreu, O fim do pesadelo:
    «Em 2011, a direita concretizou finalmente o seu velho sonho de dispor de um governo, uma maioria e um presidente do seu quadrante político. Fê-lo cavalgando uma série de promessas que nunca fez tenções de cumprir – e que, naturalmente, não cumpriu.

    Quatro anos depois, os desequilíbrios macroeconómicos estão muito pior do que há quatro anos. A dívida pública aumentou de 108% para 130% do PIB, a dívida externa líquida de 82% para 105%. A direita subiu ao poder prometendo ajustar os desequilíbrios macroeconómicos da economia portuguesa, mas conseguiu apenas empobrecer o país, deprimindo a produção e fazendo alastrar as falências e o desemprego.

    Nos últimos dias, o défice orçamental foi de -7,2% em 2014 e de -4,7% no primeiro semestre de 2015, que o défice externo regressou assim que o travão da austeridade foi temporariamente suspenso por motivos eleitoralistas e que a poupança das famílias caiu para o nível mais baixo de sempre. Défice externo, défice público, endividamento, emigração e desemprego generalizados: não houve qualquer ajustamento, apenas empobrecimento, agora momentaneamente interrompido por motivos eleitorais.

    Mas a parte mais nefasta da governação da direita não foi sequer o desastroso desempenho macroecónomico numa legislatura em que a emigração regressou aos níveis da década de 1960 e em que o investimento regrediu 30 anos. Pior – muito pior - do que isso foi a forma como este governo transformou Portugal num país muito mais desigual e muito menos decente para benefício de uns poucos.

    Como repercutiu sobre os mais pobres e a classe média a maior parte dos impactos da crise ao mesmo tempo que o número de milionários não cessava de aumentar.

    Como alterou o IRS, reduzindo o número de escalões, de modo a torná-lo deliberadamente menos progressivo e mais propenso ao aumento da desigualdade.

    Como colocou a generalidade dos trabalhadores a trabalhar mais horas por dia e mais dias por ano a troco de salários mais baixos, de modo a transferir rendimentos para os detentores de rendimentos de capital.

    Como cortou pensões e retirou apoios sociais aos mais pobres, aos desempregados, aos reformados e aos pensionistas.

    Como atacou e esvaziou a saúde e a educação públicas, comprometendo o presente e o futuro dos portugueses.

    Como aumentou a carga fiscal de forma inícua e injusta, agravando brutalmente o IRS e o IVA ao mesmo tempo que reduzia o IRC.

    Como privatizou quase tudo o que havia para privatizar – resta a Caixa Geral de Depósitos e pouco mais – por montantes irrisórios, fazendo com que os portugueses sejam adicionalmente penalizados enquanto consumidores em resultado dos aumentos dos preços de bens e serviços essenciais.

    Felizmente, existe hoje uma ampla maioria social – de dois terços, a fazer fé nas sondagens – que se opõe a que o país continue a ser devastado desta forma em benefício das elites. É fundamental que esta maioria social se mobilize no próximo Domingo, contribuindo para que o actual governo se transforme rapidamente numa lamentável recordação.

    O sonho da direita revelou-se o pesadelo da maioria dos portugueses. Quatro anos depois, está nas mãos desta mesma maioria pôr fim ao pesadelo.»

quarta-feira, setembro 23, 2015

quinta-feira, setembro 17, 2015

O governo chumba-se a si próprio

— É assim que se batem palmas, Prof. Gaspar?

Em vésperas das eleições de 2011, o Álvaro fez «uma avaliação do desempenho do anterior governo à luz de oito critérios – oito indicadores económicos, analisados em sucessão a fim de proporcionar uma perspectiva abrangente da situação da economia portuguesa.»

Quatro anos depois, Alexandre Abreu avalia «os resultados alcançados por este governo à luz dos indicadores que o seu próprio Ministro da Economia original considerou mais apropriados para aferir o desempenho governativo. Quais eram os desequilíbrios então identificados? E qual o desempenho do governo PSD-CDS à luz desses mesmos critérios? Quando actualizamos os gráficos de Santos Pereira, trazendo-os até ao presente, verificamos que os resultados são esclarecedores.»

O artigo, intitulado O governo chumba-se a si próprio, é de leitura obrigatória.

quarta-feira, setembro 02, 2015

quarta-feira, maio 13, 2015

Sobre a desigualdade global



• Alexandre Abreu, Sobre a desigualdade global:
    «(…) Caso estas tendências se prolonguem no longo prazo, pode perspectivar-se um mundo em que, como afirma Branko Milanovic, um dos mais conhecidos especialistas mundiais no estudo da desigualdade, a classe social de cada indivíduo voltará a ser, como o era no século XIX, um determinante mais importante da posição desse indivíduo na distribuição global do rendimento do que o país onde nasceu e reside. Esse será, claramente, um mundo mais conducente a que os trabalhadores dos diversos países se unam. Como também pergunta Milanovic, não se escuta aqui claramente o eco distante de Marx?»

sábado, fevereiro 21, 2015

quarta-feira, fevereiro 18, 2015

Leituras

• Alexandre Abreu, Há dívidas e dívidas:
    «(…) É que enquanto os juros pagos todos os anos para remunerar a dívida pública japonesa são transferidos para as mãos do próprio sector privado japonês, alimentando a procura agregada, no caso grego - e português - correspondem a uma sangria de recursos para o exterior, uma repetida punção procíclica substancial em contexto recessivo. Ora, é da incompatibilidade entre essa transferência permanente de recursos para o exterior e a recuperação de níveis de crescimento e/ou inflação que permitam reduzir o nível de endividamento que resulta a inevitável insustentabilidade da dívida pública grega e portuguesa. Não interessam apenas o stock da dívida ou o peso dos juros: interessa também a quem são pagos esses juros e o que é que isso implica para a economia. (…)»
• Paul Krugman, Weimar on the Aegean:
    «(…) Despite this catastrophe, Greece is making payments to its creditors, running a primary surplus — an excess of revenue over spending other than interest — of around 1.5 percent of G.D.P. And the new Greek government is willing to keep running that surplus. What it is not willing to do is meet creditor demands that it triple the surplus, and keep running huge surpluses for many years to come. (…)»

quarta-feira, janeiro 21, 2015

O estado da saúde e a saúde do Estado

• Alexandre Abreu, O estado da saúde e a saúde do Estado:
    «(…) É certo que, estatisticamente, pode sempre suceder que algumas pessoas morram enquanto esperam por serem atendidas - por mais curtos que sejam os tempos de espera. E é também certo que estamos a atravessar um surto de gripe que fez aumentar significativamente a afluência às urgências. Mas a interpretação do Ministro Paulo Macedo torna-se mais difícil de aceitar quando temos em conta o que têm sido as tendências do investimento público em saúde nos últimos anos. Quando o fazemos, observamos que está há vários anos em queda livre: segundo os cálculos de Eugénio Rosa, ter-se-á reduzido em 833 milhões de Euros entre 2011 e 2014 - cerca de -9% face ao início do período. Isto representa uma redução absoluta e relativa, pois como sabemos o PIB português reduziu-se no mesmo período, mas não tanto. Nesse sentido, é ainda mais claramente uma escolha política. O Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares afirmava em 2011 que "gerir um hospital é cada vez mais penoso" devido às restrições orçamentais - imaginemos o que dirá agora.

    Temos vindo a assistir a um desinvestimento público cumulativo e sistemático na saúde que, tal como tem sido indicado pela OCDE, tem sido parcialmente (mas não completamente) compensado pelo aumento dos gastos em saúde por parte das famílias. A despesa total com saúde tem vindo a diminuir, mas a despesa privada, das famílias, tem aumentado significativamente, com toda a iniquidade que está associada a esta alteração qualitativa: quem pode pagar, recorre cada vez mais ao privado; quem não pode, recorre a um Serviço Nacional de Saúde sujeito a um estrangulamento financeiro cada vez mais intenso.

    (…)

    As taxas moderadoras são, acima de tudo, um mecanismo de co-financiamento disfarçado sob uma capa de hipocrisia, pois nem sequer são assumidas enquanto tal. E se os montantes que estão em causa ainda não são, na maior parte dos casos, por si só impeditivos do acesso da maior parte dos utentes, não deixam de contribuir para a transformação da percepção das vantagens e desvantagens relativas do SNS e da oferta privada. Nas certeiras palavras de Sandra Monteiro no Le Monde Diplomatique, "avaria-se o Estado" através de cortes de financiamento e transferências de recursos, e contribui-se assim directamente para que a oferta privada floresça. E ela floresce mesmo, sem disfarçar a satisfação com os lucros alcançados nos interstícios cada vez maiores do que deveria ser um serviço universal de qualidade: as declarações da administradora do BES-Saúde aqui há uns anos, comparando a rendibilidade do negócio da saúde com a do negócio das armas, são especialmente despudoradas - mas são também verdadeiras e sintomáticas. (…)»

quarta-feira, dezembro 10, 2014

Fraude de Passos Coelho:
afinal, a vida do mexilhão só melhorou entre 2006 e 2010

Ou de como o ilusionismo político e o jornalismo apressado
podem conspirar contra a compreensão da realidade

• Alexandre Abreu, O mexilhão e as notícias apressadas:
    «No mesmo dia da semana passada, duas notícias relacionadas e consistentes entre si. Em Braga, num seminário sobre Economia Social, Passos Coelho elogiou a justiça social das medidas tomadas pelo seu Governo, afirmando que no contexto da actual crise, "ao contrário do que era o jargão popular de que quem se lixa é o mexilhão, de que são sempre os mesmos (...) desta vez todos contribuíram e contribuiu mais quem tinha mais, disso não há dúvida". Segundo o primeiro-ministro, "a crise não agravou as desigualdades, houve até uma tendência para corrigir algumas delas".

    Exactamente no mesmo dia, corroborando as palavras de Passos Coelho, a Lusa publicou uma notícia que dava conta da publicação de um relatório da Organização Internacional do Trabalho sobre a evolução dos salários e da desigualdade a nível global (o "Global Wage Report 2014/2015"). Nas versões adaptadas e republicadas tanto pelo Expresso como pelo Jornal de Negócios (que foram as que encontrei), lia-se aí que em Portugal, "nos últimos anos", a desigualdade entre as famílias de maior e menor rendimento ter-se-á reduzido em virtude das primeiras terem sofrido uma maior perda de rendimento. Ou seja, temos as belas palavras do primeiro-ministro, mas temos também, a apoiá-las, os dados sólidos e objectivos do estudo da OIT. Parece que todos teremos sofrido, mas os mais ricos até terão sofrido mais do que os mais pobres. O mexilhão não foi quem verdadeiramente se lixou.

    Claro que os mais desconfiados poderão achar difícil conciliar estes dados com tudo o que sabemos sobre as políticas de austeridade implementadas em Portugal nos últimos anos. Ou sobre a própria economia política da recessão e sobre a forma como o desemprego generalizado pressiona em baixa os salários, o que aliás tem constituído, admitidamente, uma parte central da estratégia do Governo - a funesta "desvalorização interna".

    No mínimo, parece estranho.

    E é mesmo. Se nos dermos ao trabalho de consultar o dito relatório da OIT (p.24), verificamos que a conclusão que aí se retira relativamente à evolução da desigualdade em Portugal é efectivamente a que indica a notícia da Lusa... só que "os últimos anos", afinal, correspondem ao período 2006-2010.

    Infelizmente, os dados sobre desigualdade são relativamente escassos e produzidos com algum desfasamento temporal, ao qual se soma ainda o desfasamento adicional associado ao tempo de elaboração de relatórios deste tipo. Daí que a OIT publique um relatório global "2014-2015" em que a análise da evolução da desigualdade de rendimento no contexto da crise se detenha... em 2010.

    Mas por acaso até sabemos um pouco mais sobre a evolução posterior da desigualdade em Portugal. Sabemos, por exemplo, que o coeficiente de Gini (tanto mais elevado quanto maior a desigualdade), depois de ter registado uma notável redução de 38,1 em 2005 para 33,7 em 2010, voltou a subir para 34,2 em 2011, 34,5 em 2012 e novamente 34,2 em 2013. E sabemos também, por exemplo, que a percentagem da população em risco de pobreza (que é também uma medida da desigualdade, uma vez que se trata de pobreza relativa) aumentou de 24,9% em 2009 para 27,4% em 2013. E isto para não falar das centenas de milhar de pessoas que se viram forçadas a emigrar, deixando de contar para estas estatísticas. Os dados não abundam, mas os que existem são consistentes com o que a maioria percebe claramente: tem mesmo sido o mexilhão a lixar-se.

    Que o primeiro-ministro tem, digamos, uma relação flexível com a verdade é algo já bastante conhecido. Mas dos jornalistas, enquanto baluarte de uma sociedade democrática, espera-se menos pressa e mais cuidado. Especialmente quando estão em causa questões desta importância.»