sexta-feira, dezembro 21, 2012

Estado Social e redistribuição de rendimentos

Pedro Marques (deputado do PS e ex-secretário de estado da Segurança Social) publica no Facebook um texto intitulado "Passos Coelho e o debate sério e informado sobre Injustiça Social na Redistribuição do Rendimento":
    'Disse Passos Coelho que uma medida da injustiça social na redistribuição de rendimento seria o facto de os 20% mais ricos receberem 33% dos rendimentos redistribuídos, enquanto que os 20% mais pobres só recebem 13% desses rendimentos. Dito deste modo, até pode parecer que há aqui uma injustiça, mas uma análise mais fina demonstra que se verifica exactamente o contrário. Vamos então ao debate "sério, sereno e profundo" a que apelou Passos Coelho.

    O PM esqueceu propositadamente a razão da existência de algumas transferências a favor dos rendimentos mais elevados. As principais transferências a favor de todos os escalões de rendimentos, inclusive os mais elevados, são as pensões do regime contributivo. Por isso, por em causa estas transferências, seria dizer que a partir de agora se defenderia um regime de pensões em que todos recebessem a mesma pensão em termos absolutos, quer descontassem sobre um salário elevado, médio ou baixo. Seria o fim do regime contributivo das pensões, uma espécie de sociedade sem classes na terceira idade. Repare-se que essa hipótese nem o PCP defende em Portugal.

    Portanto, se admitimos como hipótese que é adequado manter um regime de pensões contributivo em Portugal, temos então que verificar se o sistema de transferências aumenta, mantém ou diminui as desigualdades em Portugal. Essa é a única medida possível de avaliação da injustiça social na distriuição dos rendimentos.

    Ora, o indicador disponível de medição das desigualdades de rendimentos antes e depois das transferências, e o mais utilizado nas análises sociais, é o Índice de Gini, que mede a distância da distribuição de rendimentos em relação a uma distribuição totalmente uniforme dos rendimentos. Assim, um índice mais elevado significa mais desigualdade.

    O que podemos constatar, de acordo com os cálculos da OCDE no Relatório recente "Divided We Stand"?

    Que o Índice de Gini de Portugal é de 45,8 nos rendimentos primários, e de 34,7 nos rendimentos disponíveis, após transferências sociais.

    Ou seja, o sistema de transferências sociais, incluindo pensões, apesar de também fazer transferências para os que têm rendimentos mais elevados, pois eles descontaram para ter essas pensões, concentra em termos relativos muito mais as transferências nos que auferem rendimentos mais baixos, reduzindo assim as desigualdades. Aliás quanto à relação entre os rendimentos dos 20% mais ricos e os 20% mais pobres, citados pelo Primeiro-Ministro, podemos até recordar que Portugal foi de longe o país da Europa que desde 1995 mais reduziu essa diferença, de 7,4 para 5,8 vezes, aproximando-se muito da média europeia (5,3), que até aumentou no mesmo período.

    O Primeiro-Ministro vai avançando subrepticiamente com as atoardas contra o Estado Social, numa tática velha, de minar a credibilidade, para mais facilmente justificar os cortes que aí virão. Depois da falsa partida em matéria de propinas no ensino secundário, voltou-se agora para o sistema de transferências sociais, com particular foco no sistema de pensões. No que de mim depender, esta tática não passará sem denúncia, séria, serena e profunda, tanto quanto for capaz!

Sem comentários :